09 set, 2020 - 17:40 • Joana Gonçalves
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A menos de uma semana do início do novo ano lectivo, Portugal registou esta quarta-feira o maior aumento de casos de Covid-19 dos últimos quatro meses. O início de setembro marca o fim do período de férias para centenas de portugueses e a explicação para este novo pico poderá estar aí.
“Aquilo a que nós assistimos, neste momento, resulta de uma alteração de comportamento dos portugueses durante o mês de agosto. Não há dúvida que ao longo do último mês deve ter havido um aumento de contactos. Houve um desconfinamento e as pessoas relaxaram”, explica à Renascença Manuel Carmo Gomes, professor de epidemiologia da Faculdade Ciências da Universidade de Lisboa.
Para o especialista, este aumento é inesperado e pode ter uma de duas explicações: por um lado os portugueses podem ter aumentado o número de contactos, por outro podem tê-lo mantido, mas reduziram os cuidados durante esses encontros.
“Não esperava um aumento desta ordem antes do final de setembro”, conta. “É uma consequência de aumento de contactos entre os portugueses e ou mais contactos sem proteção, porque uma coisa é contacto outra coisa é contágio. Ou os contactos aumentaram ou os contactos não aumentaram mas aumentou a falta de cuidado e, assim, o contágio”, acrescenta.
A poucos dias do regresso às aulas, “era preferível que estivessemos, eu diria, com menos duas centenas de casos”, defende o epidemiologista.
Do triunfo da ciência à exposição de problemas est(...)
Segundo Manuel Carmo Gomes, o aumento contínuo de casos, “que se tem verificado nos últimos dez dias”, pode também ser explicado pelo facto de se terem “formado grupos, nomeadamente entre as camadas mais jovens, que se reagruparam e conviveram, como é natural que assim seja”.
É na faixa etária dos 20-29 que se regista, esta quarta-feira, o maior aumento de novos infetados, com uma variação de 125 casos. A concentração de incidência entre os mais jovens, grupos em que “a hospitalização não é muito alta”, pode justificar a estabilização das hospitalizações.
“Nós não temos visto um correspondente aumento nos hospitais e espero que assim continue, mas agora não há dúvida que é pena que comecemos as aulas a 14 de setembro nesta situação”, adianta Carmo Gomes.
O especialista lembra ainda que a coabitação familiar representou, no mesmo mês, a maior causa de transmissibilidade em Portugal (49%). “Uma parte destes casos temos vistos que se devem à introdução do vírus em residências de idosos. Isso acontece porque temos cuidadores que entram e saem, tem a sua vida familiar e eventualmente, eu penso que os cuidadores se infetam no âmbito do seu agregado familiar”, esclarece.
Face a este cenário Carmo Gomes, um dos especialistas ouvidos regularmente nos encontros entre Governo e comunidade científica, deixa um alerta. “A minha recomendação é que reforcem já as equipas de saúde pública”.
Casos de Covid-19 em Portugal por faixa etária
Durante a habitual conferência de imprensa da direção-Geral da Saúde, Graça Freitas o facto de apenas 12% dos infetados dizerem respeito a pessoas com mais de 70 anos indica maior mobilidade social.
"Estamos num ciclo especial de reentrada do período de férias. Mobilizamo-nos mais agora e esta mobilidade gera mais contactos e mais contactos gera mais casos e um aumento do número de casos que é previsível", disse, alertando para a necessidade de haver cuidados com os movimentos populacionais que vão surgir referindo-se à abertura do ano letivo.
Nas últimas 24 horas, Portugal registou mais três mortes por Covid-19 e 646 novos casos de infeção, num total de 61.541 infetados desde o início da pandemia.
Evolução de novos casos de Covid-19 em Portugal