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João Ferreira do Amaral
Opinião de João Ferreira do Amaral
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A proposta da Comissão para a recuperação das economias

05 jun, 2020 • Opinião de João Ferreira do Amaral


Como sempre sucede, estes grandes anúncios da Comissão contêm uma boa dose de propaganda.

A proposta da Comissão Europeia relativa aos financiamentos para a recuperação das economias da União é, à partida uma boa ideia. A criação de um fundo de recuperação de 750 mil milhões de euros, dos quais 500 mil milhões a fundo perdido, poderá ser uma ajuda com algum significado, não tanto na recuperação mas na reformulação de algumas das economias europeias.

Mas como sempre sucede, estes grandes anúncios da Comissão contêm uma boa dose de propaganda. Convém por isso lembrar que existem muitas condicionantes que fazem com o que o programa “não vá ser bem assim” como a Comissão anuncia. Isto para que, como é hábito, depois não haja desilusões. Vou apontar apenas duas dessas condicionantes.

Assim, a primeira é que o programa é apresentado como uma arma para sairmos da crise tal como ela se desenvolve agora, mas não o é verdadeiramente, uma vez que os primeiros financiamentos a sério só virão no próximo ano e serão repartidos por vários anos. Isto é especialmente importante porque a curto prazo os países mais endividados (grupo em que nos contamos) vão ter que se endividar ainda mais para responder à crise.

E a questão põe-se: como vai ser aceite pelos países “mais frugais” (expressão deliciosa!), face aos objectivos a longo prazo de redução da dívida, tornados obrigatórios pelo Tratado Orçamental, que os países mais endividados vejam aumentar os seus financiamentos comunitários? O mais provável é que finalizadas as negociações com os estados, agora em curso, aqueles países consigam incluir uma condicionalidade apertada em termos de finanças públicas para permitir aos outros acederem aos financiamentos do fundo de recuperação. A acontecer, teremos aqui uma fonte de desilusões.

Uma segunda condicionante é aquela que a própria Comissão propõe, ou seja, que o acesso aos financiamentos se faça obrigatoriamente através de programas de reformas nacionais aprovados pela Comissão. Ou seja, a Comissão não esquece a sua matriz centralizadora e vai, mais uma vez, querer meter o bedelho em tudo. Como sucede com toda centralização injustificada de decisões políticas, a boa utilização dos fundos será prejudicada e será muito influenciada pelos interesses dos lobbies que gravitam à volta das instituições europeias.

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