Ansioso pela retoma do futebol na Grécia, André Simões tem bancada preparada em Gaia para o regresso da Primeira Liga

28 mai, 2020 - 12:45 • Luís Aresta

Aqui se fala do futebol sem adeptos nos estádios, e da reabertura do ‘sports bar’ que o jogador André Simões abriu em Vila Nova de Gaia, poucas semanas antes da Covid-19 ter paralisado a economia.

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São dez da noite em Atenas, mais duas horas do que em Lisboa, quando André Simões aceita falar à Renascença. Para trás ficou mais um dia de treinos no AEK, da Grécia, com o médio português, de 30 anos, focado no regresso à competição, depois da súbita interrupção da época imposta pela pandemia de Covid-19.

O retomar da liga grega de futebol está agendado para 6 de junho, mas três dias antes já André Simões estará em campo, não como jogador, mas como empresário.

“É uma data importante para o meu negócio, como empresário no ramo da restauração”, diz à Renascença André Simões, manifestando o desejo de que “as pessoas comecem a retomar a sua vida normal e possam estar com os amigos nos bares e restaurantes, onde regras rigorosas de higiene garantem a minimização dos riscos de contágio pelo novo coronavírus.

Está agora a fazer um ano que o futebolista meteu na cabeça que era chegada a hora de investir em Portugal uma fatia do bolo ganho ao longo da carreira.

“Ele não falava doutra coisa, quando nos reencontrámos em Matosinhos e no avião em que viajamos para Tenerife, onde fomos passar uns dias de férias”, recorda Albano Pereira, amigo de infância do jogador. O "plano tático" foi desenhado rapidamente e entre o regresso das Canárias e a abertura do "Tribuna Sports Bar", em Vila Nova de Gaia, não passaram mais de seis meses.

O projeto junta André Simões, Tiago Assis (cunhado do jogador) e o amigo de sempre Albano Pereira, formado em gestão hoteleira. A inauguração, reservada a um círculo restrito de amigos e familiares, coincidiu com o Sporting-Porto, da jornada 15 da Liga portuguesa.

Até parece que já não foi esta época, mas foi; a 5 de janeiro, um domingo. O Porto venceu em Alvalade com golos de Marega e Tiquinho Soares. Pelo Sporting marcou Acuña.

Planos furados. Pelo novo coronavírus, pois claro…

A abertura do "sports bar" de André Simões, na Rua do Jardim, em Vila Nova de Gaia, seria um sucesso, mesmo com o maior investidor ausente na Grécia - nesse dia foi titular na vitória do AEK sobre o Panetolikos (3-1) para a jornada 17 do campeonato grego, enquanto em Gaia adeptos portistas celebravam a vitória alcançada diante do Sporting.

“Acabámos por ter de permitir a entrada a algumas pessoas que tentavam ver o clássico através das janelas”, diz Albano Pereira. A partir daí foi sempre ao ataque, com os dias de jogo (campeonatos, Liga dos Campeões e Liga Europa) a justificar reserva prévia de mesa.

Nos restantes dias da semana, os clientes eram atraídos por eventos como jantares cervejeiros e outros; isto só durou poucas semanas, até ao momento em que os bares, cafés e restaurantes foram obrigados a fechar as portas ao público devido à Covid-19.

Assim caía por terra o sonho de um primeiro ano de atividade em que não faltaria desporto para devorar, à mesa ou ao balcão. Se a coisa tivesse corrido como esperado, para além do futebol interno, os 16 ecrãs disponíveis no "Tribuna" haveriam de servir em generosa quantidade e qualidade as grandes finais europeias, o Euro-2020 (com Portugal a defender o título de campeão europeu), os Jogos Olímpicos de Tóquio, etc.

Assim não foi. As atenções voltam-se agora para 3 de junho, o dia em que o futebol regressa aos estádios portugueses.

Prognósticos "só no fim"

A expressão atribuída a João Pinto, antigo internacional português e capitão do FC Porto, aplica-se que nem uma luva ao momento que o futebol atravessa, e não apenas no plano estritamente desportivo.

Sem o sinal aberto, que levaria o desporto-rei a todas as casas, será em espaços como o "sports bar" de André Simões - entre ecrãs, pósteres, camisolas e chuteiras - que a partir de 3 de junho os adeptos se reunirão para torcer, e sofrer, pelo emblema do coração.

Enquanto as autoridades tentam evitar a concentração excessiva de pessoas em torno dos ecrãs de TV, nos bares e restaurantes, a preocupação prende-se, sobretudo, com a incerteza do momento.

É verdade que o "Tribuna" – que se manteve em atividade para os serviços de "take-away" e entregas - permite a entrada de clientes desde o passado dia 18, mas a resposta tem sido “tímida, sobretudo, na ocupação de mesas”. Daí que o verdadeiro teste seja no próximo dia 3, com o regresso do campeonato e logo com um Famalicão-Porto, às 21H15 (antes, joga-se o Portimonense – Gil Vicente, às 19H00).

“Temos a esperança de que apareça muita gente, pelo facto de o Porto jogar e de o jogo ser em horário noturno”, diz Albano Pereira, que se mantém expectante quanto à retoma da atividade.

Vai ser dia após dia, como tem sido até agora”, confessa o sócio e amigo pessoal de André Simões, apreensivo pelo facto de este espaço não possuir esplanada, mas confiante de que o conforto interior do "sports bar" será uma boa alternativa.

No "Tribuna" está tudo a postos para este segundo pontapé de saída. Para além de todas as medidas de higiene recomendadas pelas autoridades sanitárias, estão disponíveis 70 lugares sentados (habitualmente são mais de 100), sendo permitido um máximo de seis pessoas por mesa.

O objetivo passa por ter clientela, mas com respeito pelas regras de distanciamento recomedadas pela Direção-Geral da Saúde e evitar uma grande concentração de pessoas, que, de alguma forma, represente maior risco de contágio de Covid-19.

Em último caso, serão utilizados os bancos individuais junto aos dois balcões. Futebol não vai faltar. Assim como uma carta disponível nos telemóveis por código ‘QR’, desenhada a pensar na partilha de vários pratos entre clientes, sendo possível festejar os golos enquanto se viaja entre a cozinha tradicional portuguesa e a cozinha mexicana. Sendo assim, a bola pode rolar. Apetite não falta.

Não há favorito em Portugal, diz André Simões

Falemos agora de futebol. Um ponto entre Porto e Benfica é uma diferença demasiado curta e André Simões, jogador formado no FC Porto, não dá como decidida a questão do título na Primeira Liga portuguesa.

“Não creio que haja um favorito claro até porque a distância que separa Porto e Benfica é de um ponto”, reforça o médio, até porque estamos perante circunstâncias únicas, como por exemplo os estádios vazios, um fator que pode fazer toda a diferença.

"Isso conta muito num jogo de futebol. Já tive essa experiência aqui na Grécia, várias vezes a jogar sem público e é completamente diferente”. O outro fator que pode desequilibrar as contas na Liga portuguesa e em todas as outras onde ainda se irá jogar é a questão física.

O corpo dos jogadores “está mal habituado neste momento e alguns já começaram a ter lesões”, assinala, explicando que o treino de um jogador se faz com “mudanças de velocidade, de direção, contactos ombro a ombro” que nada têm a ver com pequenos exercícios feitos em casa ou mesmo a corrida em plena rua.

Por isso, André Simões admite que “vai haver muitas lesões”, na medida em que, “nem nas férias os atletas estão parados tanto tempo”, o que se traduz num ritmo inferior, com “alguns jogadores que mais parece estarem a treinar, como já se tem visto na Bundesliga”, observa.

Apesar de todos estes contratempos, André Simões entende que “é uma obrigação terminar os campeonatos para os clubes não perderem mais dinheiro”.

Em qualquer circunstância, o título deve ser atribuído

Em Portugal, como na Grécia, André Simões entende que mesmo que, devido ao novo coronavírus, as ligas não cheguem ao fim, deve haver um vencedor. "Só assim se justificaria todos os jogos feitos”, diz.

Como tal, o médio do AEK entende que “quem for em primeiro deve sagrar-se campeão, independentemente da diferença de pontos, que no caso de Portugal agora é mínima”.

"Por isso é que temos uma classificação e há sempre a soma de pontos para definir quem segue em primeiro”, considera. Em conclusão, “se o campeonato não se puder jogar, que seja atribuído o título à equipa que está no primeiro lugar”.

Vencer a Taça da Grécia e ser segundo, no campeonato

O AEK estreia-se no "play-off" da Superliga grega, no dia 6 de junho, frente ao Panathinaikos. Tal como em Portugal serão cumpridas dez jornadas, mas no caso da Grécia os seis primeiros jogam entre si para apurar o campeão e definir quem vai à Europa.

O Olympiacos, treinado por Pedro Martins, parte em clara vantagem nesta derradeira etapa da luta pelo primeiro lugar do pódio, com 14 pontos de avanço sobre o PAOK e 15 sobre o AEK, onde para além de André Simões alinham os portugueses Hélder Lopes, Paulinho e Nelson Oliveira.

“Faltam dez jogos, são quase todos dérbis e jogos importantes”, sublinha André Simões, antes de lembrar que estão em disputa 30 pontos com “muita coisa por resolver”.

O médio ex-Moreirense sublinha que a sua equipa está apenas a um ponto do segundo lugar, que dá acesso às pré-eliminatórias da Liga dos Campeões e é ocupado pelo PAOK. “Para os jogadores e para o clube, por tudo o que vivemos nesta crise, seria muito importante, porque a 'Champions League’ paga prémios muito acima da Liga Europa”.

Por outro lado, o AEK está na luta pela Taça da Grécia. A 2.ª mão da meia-final com o Aris está por disputar, depois de na 1.ª mão o emblema de Atenas ter ganho por 2-1, num jogo de má memória para o árbitro Artur Soares Dias, nomeado para a partida, e que chegou a estar retido nos balneários.

André Simões faz ver a importância de “definir bem os objetivos”, que passam por chegar ao segundo lugar no campeonato e conquistar a Taça da Grécia.

Regressar a Portugal, só para um dos grandes

André Simões deixou o Moreirense para rumar a Atenas no verão de 2015 e é na capital grega que reside, juntamente com a esposa e uma filha. O jogador classifica como “espetacular e feliz” a vida que os três conseguem fazer na Grécia.

“Voltar a Portugal seria difícil”, confessa. O contrato com o AEK prevê mais dois anos de ligação - “um dos maiores da Grécia”, sublinha - para expressar que a opção de voltar a Portugal só se colocaria na condição de ingressar “num dos grandes”.

André Simões reconhece, porém, que tal cenário não será fácil de se concretizar, pelo facto de nunca ter representado os maiores clubes da liga portuguesa e por estar a caminho dos 31 anos de idade. Como tal, admite acionar a época de opção, que tem para além do fim do contrato com o AEK, ficando mais três anos na Grécia.

Outra possibilidade são os petrodólares dos Emirados. “No ano passado tive a possibilidade de jogar no Dubai. Gostava de jogar e de viver lá, também pelos valores”, reconhece.

“Aos 30 anos, seria uma boa oportunidade de dar mais um passo, não no plano futebolístico, mas em termos financeiros, muito importantes para nós, jogadores de futebol”, conclui.

Natural de Matosinhos, André Simões completa 31 anos em dezembro. Com formação dividida entre FC Porto, Leixões e Padroense, foi no clube da Senhora da Hora que iniciou a carreira sénior, na extinta III Divisão, numa época de sucesso em que o Padroense subiu à II Divisão B.

Na terceira época, o clube venceu a Série Centro, mas não conseguiu subir à Segunda Liga. André Simões, no entanto, alcançou a promoção, ao transferir-se para o Santa Clara. Estreou-se nos campeonatos profissionais aos 22 anos, em 2011/12.

Após duas épocas nos Açores mudou-se para o Moreirense, onde foi campeão da Segunda Liga, em 2014. Na época seguinte estreou-se na Primeira Liga, pelo clube de Guimarães e as boas prestações valeram-lhe a transferência para o AEK, onde cumpre a quinta temporada.

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