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1946-2020

​Vieira Monteiro, o homem que não gostava de “amadorismos” e fez do Santander um dos grandes da banca nacional

18 mar, 2020 - 13:30 • João Carlos Malta

Apesar de um longo currículo na banca, foi em 2012 que António Vieira Monteiro se tornou mais conhecido dos portugueses, quando entrou para o lugar de Nuno Amado na liderança do então Santader Totta. Quando saiu da gestão deixou o banco na liderança de alguns segmentos de mercado e indiscutivelmente maior. Sempre se gabou de ter passado pelos anos da troika sem recorrer à ajuda do Estado.

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António Vieira Monteiro completaria 74 anos no dia 21 de março. Morreu esta quarta-feira vítima de Covid-19, no Hospital Curry Cabral, em Lisboa, Ele que se tornou mais conhecido pelos portugueses quando há oito anos, em 2012, sucedeu a Nuno Amado na liderança do banco Santander Totta.

Vieira Monteiro liderou aquele banco com sede em Espanha durante o período de presença da troika no país, uma época bastante complicada para o setor em Portugal.

Em entrevista, em 2013, à revista da Associação Portuguesa de Bancos (APB) revelava que na sua opinião “o maior ativo de um banco é a confiança. Sem confiança um banco não vive”.

Tinha fama de ter mau feitio, e ao "Expresso", na última entrevista que concedeu, em 2018, assumiu que era “pouco condescendente com uma certa falta de análise dos problemas”. “Sou pouco condescendente com o amadorismo. Faz-me uma certa confusão que pessoas que atingem determinadas posições sejam más na análise. Na análise de crédito e essas coisas”, criticou.

Este homem que fez uma longa carreira na banca, era licenciado em Direito. O setor bancário sempre foi um desígnio de vida. “Estava determinado: o meu caminho era a banca”, revelou numa entrevista António Vieira Monteiro.

O percurso de uma carreira cheia começou num estágio na agência de Almada do Banco Português do Atlântico onde aprendeu contabilidade. “Era fundamental, mas custava a quem vinha da Faculdade de Direito”, reconheceu mais tarde.

A subida deu-se passo a passo, e esteve no topo durante muitos anos. Chegou à liderança do Banco Português do Atlântico, a que se seguiu o Crédito Predial Português e passaria ainda pelo então Banco Espírito Santo e Comercial de Lisboa (mais tarde BES). Liderou ainda o BNU, a Caixagest, o Banco Luso-Español e o Banco da Extremadura.

Teve também uma passagem relevante pela Caixa Geral de Depósitos entre 1993 e 2000, onde foi vice-presidente, ingressando depois no Santander Totta.

Pela mão de Horta Hosório

Antes de assumir a liderança do banco, onde entrou pela mão de António Horta Osório, há 20 anos, António Vieira Monteiro era administrador com os pelouros do risco e das universidades.

Em 2018, deixou o cargo de CEO do Santander Totta, sete anos após ter entrado em funções. Nessa altura, assumiu as funções de chairman.

Em jeito de balanço, disse à época aos jornalistas: "Acho que o banco que temos hoje é totalmente diferente daquilo que tínhamos e que o banco fica preparado para continuar a enfrentar o futuro e eu cá estarei para o acompanhar".

Na mesma ocasião, valorizou o facto de o banco estar “cada vez mais próximos das empresas”. “Somos cada vez mais um banco de empresas, de retalho no seu sentido amplo da palavra (...), estamos presentes em todos os segmentos de mercado, o que faz com que nós tenhamos hoje uma posição extremamente forte no mercado e pensamos continuar a ter, e continuar a crescer", analisou.

O legado

Na hora da saída da gestão executiva, valorizou ainda o facto de o Santander sair da crise financeira de 2011 sem recorrer ao acionista ou ao Estado português. Para isso, argumentou, muito contribuiu a sua posição conservadora de seguir padrões de alta qualidade na análise de risco de crédito.

“Foi uma política forte de controlo do risco de crédito, dos custos e da liquidez que fez que ficássemos imunes ao que aconteceu na banca”, resumiu, há dois anos, numa iniciativa organizada pelo "Dinheiro Vivo".

À frente dos destinos daquele banco, Vieira Monteiro deixou ainda currículo na compra de dois bancos: primeiro o Banif por 150 milhões de euros, em dezembro de 2015 e, mais tarde o Popular por um euro.

Através destas duas aquisições, o Santander Totta tornou-se num dos maiores bancos a operar no mercado português, fazendo concorrência ao BCP, em termos de dimensão.

As polémicas

O caso dos swaps abusivos às empresas públicas de transportes e a compra do Banif, depois da injecção de 2,4 mil milhões de euros naquele banco pelos portugueses, foram dois casos em que o banco se viu alvo de críticas.

Outro das marcas de Vieira Monteiro foi a queda do nome Totta ao fim de 125 anos de existência. Deixa também concluída a integração operacional e tecnológica do Banco Popular, comprado em 2017.

Mas, apesar de algumas polémicas, o Santander está mais forte após a liderança de Vieira Monteiro. O banco teve sempre lucros, mesmo durante a crise financeira do país, ao contrário dos concorrentes, e chegou à liderança do setor, em termos de ativos e de crédito.

As reacções

As reacções à morte não se fizeram esperar com António Ramalho, presidente do Novo Banco, a escrever no twitter: “Um colega e que geriu tantas crises com sucesso, sucumbiu no início de outra. Lembra-nos as palavras do F Froes: esta crise vai exigir muito sangue e suor mas também algumas lágrimas. Adeus Vieira Monteiro”.

Já Faria de Oliveira afirmou, em declarações à rádio Observador, que Vieira Monteiro teve uma carreira "brilhante". Era "um gestor bancário com muitos anos de trabalho no setor, que teve uma carreira que considero brilhante, passando por várias instituições, deixando uma marca e culminando com o trabalho que fez no banco Santander", disse.

O Banco Santander Portugal já manifestou o seu “sentido pesar pelo falecimento do seu presidente do conselho de administração”. Durante a liderança de Vieira Monteiro, entre 2012 e 2018, “o banco consolidou e expandiu a sua atividade em Portugal, mantendo em permanência o rigor e a determinação que sempre o caracterizaram”, refere o Santander, em comunicado.

“Durante a liderança de António Vieira Monteiro, da qual tive o privilégio de fazer parte, pude sempre constatar a sua perseverança para tornar o Santander em Portugal numa instituição de referência. Vieira Monteiro era um profundo conhecedor do setor bancário, no qual trabalhou ao longo de várias décadas, tendo contribuído de forma muito relevante para aquilo que o Santander em Portugal é hoje: um banco líder, forte e com enorme capacidade para contribuir para o desenvolvimento do país”, refere Pedro Castro e Almeida, presidente da comissão executiva do Santander Portugal.

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