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PGR suspende diretiva polémica sobre relações hierárquicas

11 fev, 2020 - 10:35 • Marina Pimentel

O presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público acusa a PGR de agir “com falta de ponderação”.

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A Procuradora-Geral da República (PGR) suspende a publicação da polémica diretiva sobre os poderes das chefias sobre os magistrados.

Em nota enviada à redação, Lucília Gago anuncia que decidiu solicitar um parecer complementar ao Conselho Consultivo, versando o regime de acesso ao registo escrito de decisões proferidas no interior da relação de subordinação hierárquica.

Também decidiu suspender a publicação em “Diário da República” da diretiva da polémica diretiva, até que o Conselho Consultivo emita o seu parecer.

Um parecer do Conselho Consultivo da PGR, cuja doutrina a procuradora-geral, Lucília Gago, determinou que seja "seguida e sustentada pelo Ministério Público (MP)", prevê que a hierarquia do MP pode intervir nos processos-crime, "modificando ou revogando decisões anteriores".

Segundo o documento, nos processos-crime a intervenção da hierarquia e o exercício dos poderes de direção do MP não se circunscrevem ao que está previsto no Código de Processo Penal, "compreendendo ainda o poder de direção através da emissão de diretivas, ordens e instruções, gerais ou concretas". Essas ordens não têm de constar do processo, porque são atos administrativos prévios, diz o parecer, entretanto, transposto para uma diretiva da PGR.

PGR “com falta de ponderação"

O presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público acusa a PGR de agir “com falta de ponderação” numa questão de importância estrutural para o MP.

Para António Ventinhas, a PGR “devia simplesmente revogar a diretiva e não suspender com o objetivo de esclarecer apenas um dos aspetos questionados pelos procuradores”, que está relacionado com a possibilidade de a ordem dada pelo superior hierárquico não poder constar do processo, como é defendido no parecer pedido por Lucília gago ao Conselho Consultivo do órgão que dirige.

“Com este segundo parecer que pede ao Conselho Consultivo, Lucília Gago vem demonstrar que ela própria tem dúvidas sobre a diretiva que emitiu”, diz.

Questionado pela Renascença admite que não é por acaso o anúncio do pedido deste segundo parecer no dia para o qual está marcada uma reunião do Conselho Superior do Ministério Público. “É evidente que é para baixar a tensão da reunião do CSMP e também para tentar atenuar o impacto desta diretiva junto da opinião pública.”

António Ventinhas defende que “a continuar assim, Lucília Gago dificilmente terá condições de continuar no cargo. O que se espera de uma PGR é que seja uma pessoa ponderada, mas o que verificamos é que tudo isto acaba por ser uma trapalhada”.

Esta diretiva causou uma enorme polémica, tendo do diretor do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público decidido recorrer judicialmente e convocar a assembleia de delegados sindicais para apreciação, discussão e tomada de posição relativamente a esta matéria e solicitar ao presidente da mesa da assembleia do sindicato a realização de uma assembleia-geral "com vista à adoção de formas de luta adequadas à gravidade da situação".

O parecer do Conselho Consultivo da PGR surge numa altura de controvérsia no seio do MP sobre o conflito latente entre autonomia dos procuradores e poderes da hierarquia do MP, tendo um dos casos concretos conhecidos resultado da investigação ao furto e achamento das armas de Tancos quando os procuradores titulares do processo quiseram inquirir o primeiro-ministro, António Costa, e o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, o que foi inviabilizada pelo diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), Albano Pinto.

O sindicato considera que "o processo é, desde o início, questionável, porquanto o novo Estatuto do MP clarificou os limites da intervenção hierárquica", mas que, "ainda assim, a PGR decidiu solicitar ao Conselho Consultivo a emissão de parecer sobre a matéria que, de imediato, transformou em diretiva".

Esta quarta-feira há uma reunião do conselho superior do Ministério Pública e esta nota pode vir a diminuir a tensão que esta questão pode provocar no órgão disciplinar e de gestão dos magistrados do MP.

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  • João Lopes
    11 fev, 2020 11:47
    Agostinho de Hipona (354-430): «Um Estado que não se regesse segundo a justiça, reduzir-se-ia a um grande bando de ladrões».

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