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Évora. Voluntários colhem dois mil quilos de laranjas

07 fev, 2020 - 17:56 • Rosário Silva

Desde 2012 que vários grupos de voluntariado se reúnem para, num gesto simples de colher laranjas, transformar o que seria desperdício em comida de qualidade para quem mais precisa.

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O convite foi feito, uma vez mais, pela Fundação Eugénio de Almeida (FEA). O dia estava apetecível para atividades ao ar livre e, para largas dezenas de alunos, esta foi uma sexta-feira diferente.

A iniciativa, de cariz solidário, juntou cerca de 150 crianças e jovens das Escolas Manuel Ferreira Patrício e André de Resende, assim como do Oratório de São José (Salesianos), todos os estabelecimentos de Évora.

Desde 2012 que vários grupos de voluntariado se reúnem para, num gesto simples de colher laranjas, transformar o que seria desperdício em comida de qualidade para quem mais precisa.

De manhã ou à tarde, os alunos repartiram-se, entusiasmados, entre a Quinta de Valbom e o Páteo de São Miguel, espaços da FEA para participarem na 10.ª Colheita Solidária de Laranjas, cujo produto final vai, depois, beneficiar uma dezena de instituições sociais da cidade.

Aos estudantes juntaram-se os cerca de 50 voluntários dos projetos da Fundação Eugénio de Almeida e várias pessoas da comunidade, algumas das quais para uma primeira experiência do género, que com um gesto simples, quiseram dar o seu tempo, energia e ajuda, na colheita de laranjas.

Foi o caso de Soraya Conturbia, de nacionalidade brasileira, e que está em Évora há quatro meses, onde estuda na universidade. Aos 31 anos, está a fazer o Doutoramento em Filosofia, missão que pretende complementar com outras atividades. Foi ainda no país natal que começou a pesquisar sobre trabalho voluntário, tendo chegado ao contato com a FEA.

“Já fiz algumas formações com a Fundação, mas esta é a primeira vez que estou a apanhar laranjas e estou a gostar bastante, é muito divertido”, contou à reportagem da Renascença.

“Poder estar ajudando o outro, sempre, e estar aprendendo com eles, é o fundamental, e mais ainda com os miúdos o que torna a tarefa mais interessante e proveitosa”, acrescentou, ao mesmo tempo que carregava uma caixa de laranjas, já apanhadas, com a colega voluntária.

A Joaquina Amado começou há poucos meses nestas lides, recebeu formação e já faz voluntariado cultural e de proximidade. “Estou em suspensão de contrato numa empresa e como estava sem fazer nada, resolvi fazer voluntariado”, disse-nos. Foi, também, a primeira vez que realizou este trabalho e não escondeu a imensa satisfação, nas suas palavras, “em fazer coisas em prol dos outros”.

Quanto aos alunos, foram mobilizados através dos seus professores, que habitualmente sensibilizam as crianças e jovens para a participação em atividades de voluntariado, facilitando a sua integração e ligação à comunidade local, e sensibilizando-os para o conhecimento das causas sociais, através do voluntariado.

“O meu objetivo e o das minhas colegas é, sobretudo, fazer com que eles saibam partilhar e, dessa forma, ajudar as instituições que precisam”, observa a professora do 1º ciclo, no colégio dos Salesianos, Janet Cunha.

A também coordenadora da Flexibilização Curricular, naquele estabelecimento, sublinha a importância de a atividade proporcionar, por outro lado, “a diversão, o aprenderem a colher as laranjas ou subirem a uma árvore”, para além da “entreajuda e o ser voluntário, sem receber nada em troca, ainda que acabem por receber muito.”

Para esta iniciativa o colégio eborense levou cerca de 110 alunos, dos 1º,2º e 4º anos, do primeiro ciclo. “Estavam desejosos e muitos deles nem dormiram de noite a pensarem só na atividade que vinham fazer hoje”, destaca a docente.

Atento a tudo, Francisco da Luz aguarda, pacientemente, em cima de uma carrinha, que os pequenos cheguem com as caixas para poder despejá-las.

“Já temos aqui à volta de 800 quilos”, indicou-nos este voluntário do Banco Alimentar Contra a Fome (BACF) que recebe as laranjas para, posteriormente, as distribuir pelas instituições já sinalizadas.

Há quatro anos que está no BACF de Évora, onde faz o que é necessário, pelo menos três vezes por semana. “Faço recolha de papel, recolha de plástico, hoje são as laranjas, tudo o que é necessário para ajudar os outros”, alude.

“Estas iniciativas pretendem fazer inoculação do “vírus” do voluntariado”

Henrique Sim-Sim é o Coordenador da Área Social e de Desenvolvimento da Fundação Eugénio de Almeida (FEA). À Renascença fala da importância deste modelo intergeracional, enquadrado numa estratégia de formação das novas gerações.

Que importância podemos atribuir a esta iniciativa que reúne várias gerações?

Olhe, esta ação enquadra-se numa estratégia da FEA, com o objetivo de promover uma cultura de voluntariado e, para isso, é necessário começar pelos mais pequenos. Estamos na 10ª edição desta colheita de laranjas, portanto já realizámos um conjunto de edições de voluntariado pontual, é assim que designamos. Convidamos os miúdos das escolas e a nossa comunidade para virem praticar voluntariado, de uma forma pontual para, como nós dizemos, deixar ali o “bichinho” do voluntariado. É um género de atividade que serve para os mais novos perceberem que com um pequeno esforço, com as competências deles, é possível ajudar outras pessoas, no fundo, ajudar a construir a comunidade.

Aliás, há outras iniciativas com essa mesma finalidade…

Sim, temos muitas outras iniciativas que resultam neste contacto com os miúdos. Neste momento estamos a desenvolver um programa que se chama “Voluntariado nas Escolas”. É composto por um conjunto de dez sessões, onde os nossos técnicos e também com voluntários vão às escolas e ajudam a desenvolver os seus próprios projetos de voluntariado, formando e incentivando. Estas iniciativas pretendem fazer esta inoculação do “vírus” do voluntariado. Esperamos que fique lá e daqui a uns anos, estes pequenos voluntários possam tornar-se voluntários comprometidos com diversas causas.

E para além de incutir esse “bichinho”, como falava, há também esta vertente importante que é o poder ajudar algumas instituições?

Sim, claro. Todas estas ações têm, obviamente, como fim, o bem comum. Neste caso concreto, estamos a recolher cerca de dois mil quilos, dos espaços da FEA. Trata-se de um produto que não seria consumido e que assim é entregue a instituições da cidade que, depois, farão a entrega às famílias ou às organizações que precisam deste bem alimentar. Vai para o Banco Alimentar Contra a Fome, ou para a Associação Pão e Paz, só para dar alguns exemplos. Outras iniciativas que temos feito com o voluntariado pontual, têm sempre esta componente prática, de forma a contribuir para uma causa concreta, quer seja com animais, que já temos feito, ou em defesa do ambiente, com a plantação de árvores. Portanto, há sempre um fim, o bem comum.

E como são recebidas estas atividades pelos mais novos?

Olhe, são recebidas com muito entusiasmo e é muito interessante ver como esse entusiasmo é colocado na tarefa e na partilha que têm, nomeadamente, com os seus pares. Por outro lado, há também a partilha que fazem com a comunidade e até nas suas próprias casas, com as suas famílias. Estão sempre muito entusiasmados, muito felizes, o que para nós é muito gratificante. Realço que esta iniciativa também envolve voluntários adultos, portanto há sempre esta dimensão de intergeracionalidade e de entreajuda. Para os adultos é igualmente muito gratificante ver esta dinâmica, esta energia e a boa vontade dos mais pequenos.

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