Austrália

Como se joga futebol em zona de incêndios? "Cada vez que há treino, temos de verificar a qualidade do ar"

07 jan, 2020 - 10:15 • Eduardo Soares da Silva

O luso-timorense Alfredo Esteves é treinador e coordenador da formação do Wollongong Wolves, clube de uma das zonas mais afetadas pelos incêndios na Austrália. Em entrevista à Renascença, o técnico conta que já foi forçado a cancelar treinos e que o clube vai organizar um jogo solidário para ajudar as vítimas.

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Alfredo Esteves é treinador dos sub-13 e coordenador da academia do Wollongong Wolves, clube da zona de Nova Gales do Sul, uma das mais afetadas pelos incêndios na Austrália. O luso-timorense revela, em entrevista à Renascença, que a qualidade do ar ameaça a realização de todos os treinos.

"Tem sido difícil treinar. Começámos os treinos em novembro e os fogos começaram logo em setembro ou outubro. As coisas tornaram-se piores desde que começou o verão. Houve dias em que tivemos de cancelar o treino porque a qualidade do ar não era favorável para treinar 'outdoors'. Neste momento, cada vez que há treino marcado, temos de verificar se a qualidade do ar é boa, até porque podemos por as crianças em perigo, alguns têm asma ou outros problemas respiratórios", começa por contar.

"Estamos constantemente a respirar fumo"

Alfredo Esteves foi internacional por Timor Leste. Ao longo da sua carreira como jogador representou Gafanha, Tocha, Oliveira do Bairro e Desportivo de Aves, em Portugal. No estrangeiro, passou pelos Estados Unidos e Itália antes de se mudar para o futebol australiano, em 2007, para o Wollongong. Terminou carreira em 2010, ficou no país e na estrutura do clube.

O ex-jogador fala de "semanas muito difíceis" numa zona próxima à que vive: "Tem sido impressionante, uma verdadeira catástrofe. Vivo a uma hora de distância da zona dos fogos na Costa Sul e é inacreditável como está a destruir grande parte do país, as pessoas que já perderam a vida e as casas que já foram queimadas. Tem sido muito difícil estarmos aqui tão perto. Têm sido dias e semanas difíceis, desde que se perdeu o controlo dos fogos".

"Estamos a norte da zona mais afetada. Nestas últimas duas semanas temos tido cinzas a entrar pela janela. Estamos constantemente a respirar fumo, os carros estão cheios de cinzas. Sente-se bastante. Nos últimos dois dias choveu um pouco e acalmou", conta.

Amigável para angariar fundos

O antigo jogador acumula ainda a função de responsável de ligação à comunidade e revela a forma como o clube está a tentar ajudar o país a ultrapassar a tragédia.

"O clube está a tentar coordenar da melhor forma. O campeonato só começa em março e tentamos marcar os treinos e jogos para não afetar ninguém. Há também um apoio muito grande na Austrália e de outras partes do mundo para ajudar a reconstruir o país com doações monetárias. O clube marcou um jogo de caridade para o dia 18 de janeiro para angariar fundos para distribuir para as pessoas mais afetadas e as instituições, que precisam dos fundos para melhorar a situação", diz.

Alfredo diz que os australianos querem "voltar a uma situação normal", mas recorda que as "temperaturas devem aumentar no fim de semana", assim como o alerta para novos incêndios.

Apesar das dificuldades reveladas por Alfredo para realizar treinos, o técnico conta que nenhum jogo da A-League - primeira divisão - foi cancelado, mas várias provas desportivas têm sido condicionadas devido aos fogos.

"No campeonato principal nenhum jogo teve de ser adiado. Os estádios estão situados em zonas de cidade e com alguma sorte nenhum está perto de zonas florestais. Mas alguns treinos e provas mais pequenas sim. Tenho um amigo que ia participar numa maratona de barco no rio, uma prova que dura sete dias, e foram obrigados a cancelar no segundo dia por causa da qualidade do ar", termina.

Nuvem de fumo que já chega à América do Sul

O estado da Nova Gales do Sul, o mais populoso da Austrália, continua a ser o mais afetado pelos incêndios. O número de vítimas mortais confirmadas subiu para 20.

O fumo já chegou à América do Sul e atingiu o Chile e a Argentina, após ter percorrido mais de 12 mil quilómetros sobre o Pacífico, anunciaram os serviços meteorológicos dos dois países.

Os incêndios, considerados dos piores do século na Austrália, levaram países como os Estados Unidos, o Canadá, a Nova Zelândia, Singapura ou França a enviar bombeiros, helicópteros e militares para ajudar no combate aos fogos.

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