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Francisco Sarsfield Cabral
Opinião de Francisco Sarsfield Cabral
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​Elogio de um reformista

02 jan, 2020 • Opinião de Francisco Sarsfield Cabral


Macron está longe de ser infalível. Mas tem qualidades que escasseiam na generalidade da classe política: uma enorme força de carácter, uma inabalável convicção de que está a lutar pelo futuro do seu país e, por isso, uma invulgar resistência às contrariedades.

A França tem um regime presidencial. Macron, Presidente da República, chefia o governo, embora exista um primeiro-ministro, Édouard Pilippe. Por isso aguardava-se com expectativa a alocução presidencial no último dia de 2019, numa altura de forte e prolongada contestação social em França.

Muitos esperavam que Macron anunciasse recuos e concessões no seu projeto de reformar as pensões. Um projeto que já levou a um mês de greves nos transportes e noutros sectores em França. Antes, Macron fora alvo de mais de um ano de protestos semanais, por vezes violentos, dos chamados “coletes amarelos”.

Macron não fez concessões importantes aos “coletes amarelos” e, agora, não anunciou recuos na reforma das pensões. Embora vão decorrer negociações do seu primeiro-ministro com os sindicatos, Macron declarou que levaria a cabo a reforma.

Esta corajosa determinação reformista não agradou à classe política francesa. Não é habitual... Por exemplo, há 25 anos o então Presidente Chirac, face à contestação popular, capitulou, afirmando não ser possível reformar a França contra a vontade dos franceses.

Mas Macron parece ser feito de uma outra massa, rara entre os políticos – e não apenas em França. Na sua mensagem de 18 minutos, o Presidente francês foi claro: está a cerca de metade do seu mandato, altura em que os políticos deixam geralmente de tentar concretizar qualquer medida que suscite contestação. Pois ele, pelo contrário, afirmou que iria intensificar a sua vontade reformista, sem querer saber se será com isso penalizado em futuras eleições a vários níveis. Macron sente ser esse o seu dever e não hesita.

Macron está longe de ser infalível. Cometeu erros de fundo e de forma, alguns dos quais aqui critiquei. E não é certo que vença esta “guerra” das pensões. Mas tem qualidades que tanto escasseiam na generalidade da classe política: uma enorme força de carácter, uma inabalável convicção de que está a lutar pelo futuro do seu país e, por isso, uma invulgar resistência às contrariedades. Daí o elogio que Macron merece.

Este conteúdo é feito no âmbito da parceria Renascença/Euranet Plus – Rede Europeia de Rádios. Veja todos os conteúdos Renascença/Euranet Plus

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  • Cidadao
    02 jan, 2020 Lisboa 11:12
    É uma questão de ponto de vista. Ele pode não ser um político com uma enorme força de carácter, uma inabalável convicção de que está a lutar pelo futuro do seu país e, por isso, uma invulgar resistência às contrariedades e ser apenas um iludido teimoso. Depende de quem analisa a questão. Duas coisas são certas: ninguém consegue implementar completamente "reformas" quando tem contra si a generalidade das pessoas, e mais uma vez se verifica que as "reformas estruturais" tão na boca de certos políticos mais não são que cortes de direitos e reduções, que penalizam as pessoas. Daí a contestação.