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Natal nos Cardaes. "Ser solidário é o valor acrescentado dos nossos produtos"

19 nov, 2019 - 06:36 • Ângela Roque

Responsável pelo Convento dos Cardaes deixa o convite para mais um "Natal Solidário". Até 15 de dezembro, há chá e brunch aos fins de semana e muitas iguarias para comprar. As receitas revertem para a instituição onde vivem 35 utentes com necessidades especiais.

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Natal Solidário no Convento dos Cardaes - Espaço Religião da jornalista Ângela Roque
Clique na imagem para ouvir a reportagem. Foto: DR

O "Natal Solidário" do Convento dos Cardaes já arrancou no segundo fim de semana de novembro, mas a azáfama começou muito antes, com a preparação dos doces, compotas, chutneys e biscoitos que têm sempre à venda todo o ano, mas que nesta altura têm mais procura. Tudo feito no convento.

“A confeção começa logo em janeiro. Como só trabalhamos com fruta da época, vai-se aproveitando os diversos frutos ao longo do ano e faz-se a produção suficiente para termos uma quantidade vendável nesta altura”, explica à Renascença Graça Sá Fernandes, uma das voluntárias da instituição.

“Eu já cá estou há mais de 30 anos. A Isabel há quatro ou cinco anos, a Carla há dois. A Luísa é recente, mas já está apanhada, porque isto é fácil ficar apanhada!”, conta com boa disposição, ao mesmo tempo que coloca num dos frascos mais uma etiqueta do convento e o prazo de validade. “Tentamos sempre que ao nível da apresentação tudo seja feito com bom gosto. E estas etiquetas têm a imagem de alguns dos quadros que podem ser vistos aqui, nas visitas ao Museu”.

Na venda de Natal há “mais de sete mil frascos” com “mais de 20 variedades de doces, compotas, conservas”. Mas, a marmelada é um dos produtos mais procurados. A deste ano “foi feita com marmelos que apareceram aqui em setembro, princípio de outubro, é pura e fantástica”, garante Graça Sá Fernandes. Têm, ainda, seis ou sete variedades de biscoitos, e “na parte dos salgados, temos variadíssimos chutneys, doces de cebola, um vinagre que é fantástico e um piripiri fabuloso. Coisas que agora já começam a aparecer noutros lados, mas que nós há mais de 30 anos que fazemos aqui”.

Nesta altura está tudo exposto na venda, mas há produtos que “podem ser adquiridos ao longo do ano, na loja do museu”. E para o Natal aceitam encomendas. “Podem pedir por email. Também temos recebido pedidos para cabazes, de algumas empresas, que querem os nossos produtos para oferecer”.

“Quem vem fica a conhecer o convento e esta obra social”

Vera Falcão Trigoso começou por ser voluntária, mas atualmente trabalha mesmo no convento. É a responsável pelo Chá e pelo Brunch, que agora já é mais almoço, tal a variedade que oferece. O trabalho concentra-se mais nesta altura do ano, mas também exige uma preparação prévia. “Começa com alguns meses de antecedência, porque temos de angariar bens em forma de espécie”.

Apostam sempre na qualidade e numa oferta cada vez mais profissional e diversificada. “Todos os anos temos vindo a aumentar a ementa. Começámos com umas carnes frias, um croissants e um pão, mas depois achámos que fazia falta uma sopa, e agora temos sempre uma mesa de quentes, uma mesa de sobremesas, uma mesa de queijos e outra de verdes. Há sempre um prato vegetariano e coisas diferentes, como um escabeche de perdiz. Tentamos sempre ser diferentes”, diz.

O que servem é preparado no convento, mas “exceto a sopa, que é feita no próprio dia de manhã”, o resto é tudo feito ao longo da semana. “Porque às vezes são 300 pessoas por fim-de-semana!”, o que exige muitas mãos a ajudar. “Envolve muitos, muitos voluntários, e fazem-nos sempre muita falta, porque é muita gente que entra aqui, há uma grande circulação de pessoas, é preciso levantar mesas, por mesas, empratar, cortar, montar. É preciso ter muita gente”.

Quem vai normalmente volta. “Muitas pessoas até repetem os fins de semana, vêm várias vezes. E quem vem fica a conhecer o convento e esta obra social”.

“O Estado ajuda, mas temos de nos virar para arranjar o resto”

Ana Maria de Sousa Vieira, das irmãs dominicanas de Santa Catarina de Sena, é a responsável pelo convento. Explica que as receitas do ‘Natal Solidário’ revertem para a Associação de Nossa Senhora Consoladora dos Aflitos, que ali funciona desde 1877, e que acolhe pessoas com necessidades especiais em regime de lar.

“O mundo mudou, e o que dantes era uma instituição só para pessoas cegas, hoje já não é. Temos invisuais, mas também outras pessoas com necessidades muito especiais. É uma casa que pretende ser a casa de família , e elas próprias dizem ‘esta é a nossa casa e nos somos felizes’. Isso é bonito”, conta esta responsável, que fala das utentes como “as meninas”.

“São as meninas porque são intemporais, não têm idade. São capazes de ter 30 anos e passearem-se com uma bonequinha no braço, ou dormirem com o boneco ao lado. Só quando se vê o cabelo branco é que a gente se dá conta que são um bocadinho mais velhas”, conta a sorrir.

Na instituição vivem 35 utentes, dos 18 aos 84 anos, mas a maioria andará pelos 60. “A mais velha veio para cá com apenas seis anos. Esta é verdadeiramente a casa dela, não teve outra”. E nunca foi para um lar. “Não vão, mesmo quando são idosas. Aqui se criaram, aqui passaram a juventude, aqui permanecem”.

Muitas das que chegam com 18 anos são enviadas pelo Estado. “Ainda recentemente recebemos duas nessas condições. Não podiam continuar nas instituições onde estavam, porque já tinham atingido o limite de idade, mas não tinham para onde ir”.

A irmã Ana Maria explica que iniciativas como o ‘Natal Solidário’ são indispensáveis para manter a instituição. “O Estado ajuda, e se não fosse isso seria muito mais complicado, mas não chega. Temos de nos virar para arranjar o resto”.

“Uma instituição não pode viver apenas dos donativos das pessoas, tem de mostrar trabalho, e já tivemos um doador que nos disse ‘aqui trabalha-se’. Temos de ser proativas e encontrar formas e meios de fazer viver esta casa e estas meninas. Esta iniciativa, e outras que fazemos ao longo do ano, têm essa função. Dão-nos muito trabalho, mas também uma enorme alegria, porque são por uma boa causa”, refere.

As receitas vão reverter para as obras que têm em mãos. “Temos uma obra grande que está a meio, que é o CAO, o Centro de Atividades Ocupacionais. E temos de arranjar os quartos delas, que são antigos. Precisamos de fundos para essas obras e para o mobiliário”. E acrescenta, em jeito de brincadeira: “não é que o ‘vintage’ não seja bonito, mas muitas das camas já são pequenas e elas não cabem lá”.

Assim, quem fôr ao Brunch e ao Chá de Natal, ou comprar as compotas e os chutneys para consumo próprio, ou para oferecer, está a contribuir para uma causa social. “É uma maneira de ajudar o convento e de fazer o seu Natal mais solidário. Adquirir aqui os produtos do convento tem um valor acrescentado – a felicidade, a alegria de ser solidário no Natal. Por isso, venham muitos!

O ‘Natal Solidário’ no Convento dos Cardaes decorre até dia 15 de dezembro. O Brunch/almoço (25 euros por pessoa) funciona das 12h às 15h, o Chá (10 euros) das 16h às 19h, e convém fazer reserva. A venda de Natal está aberta das 12h às 19h.
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