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Ao ataque contra António Costa

Assis diz que foi “silenciado” por criticar “geringonça” e vê no Governo o "eco da voz do chefe”

19 out, 2019 - 09:00 • Redação

“Não fui convidado para uma única iniciativa promovida pelo PS nos últimos quatro anos", lamenta o antigo eurodeputado socialista num artigo de opinião violento publicado este sábado. Francisco Assis garante ter sido alvo de “tentativas de silenciamento que foram longe demais” porque se opôs a uma solução de Governo, na anterior legislatura, que serviu apenas para levar António Costa ao poder e que, do seu ponto de vista, foi negativa, “com um preço a ser pago mais cedo ou mais tarde”.

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Francisco Assis não foi de meias palavras. Este sábado no jornal “Público” assina um artigo de opinião em que, do aparente fim da “geringonça” à constituição do novo Governo, solta críticas duríssimas ao Partido Socialista, que Assis vê hoje como um “rebanho em todo o seu esplendor”, e particularmente ao primeiro-ministro António Costa, que acusa de ter formado um Executivo com “personalidades desprovidas de autonomia”, sendo o Conselho de Ministros, portanto, “uma câmara de eco da voz do chefe [Costa]”.

No entanto, o início do seu artigo de opinião, precisamente sobre a “geringonça”, não é meramente para reiterar que Assis sempre foi contra a solução governativa passada – “destinada, tão somente, a permitir ao PS a formação de Governo após uma relativamente inesperada derrota eleitoral” –, mas serviu-lhe para relembrar o tempo porque passou ao tornar publicamente essa posição contrária. Um tempo em que Assis diz ter sido alvo de “uma operação de execração pública”, declarando-se “ostracizado” no PS.

“Não fui convidado para uma única iniciativa promovida pelo PS nos últimos quatro anos, mau grado desempenhar funções de deputado no Parlamento Europeu. Aquilo que constituía uma divergência legítima, afirmada com frontalidade e franqueza, foi tratada como uma verdadeira dissidência política e ideológica”, lembra.

O antigo eurodeputado socialista diz ainda que, entre “tentativas de silenciamento que foram longe demais”, se confrontou, então, “com tudo o que há de pior na vida partidária”. E enumera: “O dogmatismo dos alarves, o sectarismo dos fanáticos, o cinismo dos oportunistas. Compreendi bem cedo que não havia lugar para quem questionasse a famigerada ‘geringonça’”.

Embora reconheça que a “geringonça” se revelou “bastante mais consistente e razoável” do que aquilo que tinha previsto”, Francisco Assis acredita que tal se deveu, em primeira instância, “à prevalência de um contexto económico-financeiro europeu favorável”, mas igualmente à “firmeza” exibida por Costa na condução da política orçamental e ao que descreve como um “muito apreciável sentido de responsabilidade política manifestado pelo Bloco de Esquerda e pelo PCP”.

Mas o socialista vai ainda mais longe, dizendo que Portugal ficou aquém do desejado na última legislatura, denunciando o “carácter anestesiante e paralisante” da anterior solução de Governo. “Nestes quatro anos o país viveu num estado de relativa suspensão da realidade. Ora isso tem um preço, destinado a ser pago mais cedo ou mais tarde”, conclui.

A “geringonça”, reforça Assis, apenas serviu, enquanto “solução limitada”, como “expediente para afastar o centro-direita do poder” e garantir a constituição de um Governo do PS liderado por António Costa.

Posto isto, a sua não continuidade é, segundo Assis, positiva, sugerindo ao partido “uma outra solução política baseada na disponibilidade para negociar apoios parlamentares à sua esquerda e à sua direita”.

Mas ao seu partido deixa igualmente uma crítica, “encantado” que aparenta estar pelo exercício, “quantas vezes ilusório”, do poder.

“Como já seria de esperar nada disto gera o devido debate no seio do Partido Socialista. Os mesmos que endeusavam a ‘geringonça’ invetivam agora o Bloco de Esquerda e enaltecem a nova opção tomada. O espírito de rebanho em todo o seu esplendor. Infelizmente, o PS está, em grande parte, adormecido e encantado pelo exercício, quantas vezes ilusório, do poder. Dizer isto vai valer-me mais uma leva de insultos da horda habitual, mas paciência”, termina.

Novo Governo. Siza Vieira é “indigitação altamente reprovável”

Francisco Assis analisa, no “Público”, de forma breve, mas crítica, o Governo. Contudo, até é por um elogio que começa. Um elogio ao novo ministro do Mar, Ricardo Serrão Santos. “Trata-se de um cientista de reputação mundial que exerceu com excepcional brilho as funções de deputado europeu nos últimos cinco anos. Era impossível fazer melhor escolha”, refere.

Segue-se aquela que considera uma “indigitação altamente reprovável”, a de Pedro Siza Vieira, ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital que passou a novo número dois do Executivo.

Francisco Assis questiona a ausência de “orientação doutrinária política” de Siza Vieira, uma ausência que agradará, diz, a quem é “dependentes dos favores do Estado”.

“Não questiono nem a inteligência, nem a integridade moral do novo número dois do Executivo. O que contesto é o sinal de despolitização que essa escolha representa. Siza Vieira é um bem sucedido advogado de negócios a quem não se conhece qualquer linha de orientação doutrinária ou política. É claro que num país ainda dominado por uma bolorenta cultura anti-política haverá quem saúde tal tipo de escolha, a começar pelos empresários de sempre, eternamente dependentes dos favores do Estado”, explica.

Por fim, no restante executivo, Assis vê “mais do mesmo”, uma solução “pensada para durar mais ou menos dois anos” em que Pedro Nuno Santos, ministro das Infraestruturas e da Habitação, “reforça os seus poderes” e Augusto Santos Silva, ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, é, antes como agora, “o político mais denso de todo o Executivo”.

“Este Governo é mais de António Costa do que do PS. Por isso mesmo, é maioritariamente constituído por personalidades desprovidas de autonomia política e pouco propensas a qualquer gesto ou pensamento indiciadores de uma vontade própria. O Conselho de Ministros não parece ser muito mais do que uma câmara de eco da voz do chefe”, atira Assis, a terminar.

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