31 out, 2019
O populismo nacionalista chegou a Portugal. E começa da mesma maneira: o Chega, à semelhança dos restantes partidos de extrema-direita da Europa, é um necrófago que se alimenta do cadáver da velha extrema esquerda. O Chega está a crescer nos terrenos que deviam ser do PCP. Este mal, que pode crescer, é para levar a sério. Neste sentido, importa deixar já um aviso aos católicos portugueses. O próximo passo deste partido será lançar um certo canto de sereia sobre o eleitorado católico através de posições fortes sobre aborto e eutanásia.
É um passo conhecido. Por esse mundo fora, da Polónia e Hungria, passando pelo Brasil e EUA, partes do mundo cristão têm apoiado líderes autoritários e abertamente xenófobos em troca de leis ou posições anti-aborto. Lamento, mas um mal não se corrige com outro mal. Há que ter cuidado. Ir atrás desse canto da sereia tem um preço que um católico não pode pagar: apoiar um partido abertamente racista, um partido que transforma o (alegado) amor por Portugal numa desculpa para derramar ódio sobre minorias, um partido que é portanto a negação do evangelho. O catolicismo é uma antídoto contra o nacionalismo. O catolicismo não é uma tribo entre tribos, é a ponte entre tribos; “nacionalista católico” é uma contradição nos termos como “comunista capitalista”. Se escolher votar no Chega, um católico está a deixar de ser católico.
Como todos os partidos de extrema-direita, o Chega olha para problemas reais que mais ninguém quer ver, mas as respostas que dá são inaceitáveis e abjectas. Nenhum católico pode aceitar a estigmatização de um grupo inteiro de pessoas. Um católico não vê grupos, não vê classes, não vê raças ou etnias, vê seres humanos. É verdade que o arco suburbano em redor de Lisboa está cravado de problemas de integração e de choques (quase) invisíveis entre diferentes comunidades. Mas a solução para estes problemas é deixarmos de ver as pessoas como propriedade de uma “comunidade”, a solução é vermos as pessoas como pessoas, como indivíduos, como cidadãos da república. O católico deve lutar por este chão comum republicano onde todos são iguais em direitos e deveres. O cristão não pode jamais apoiar um nacionalismo racista, porque “católico racista” é outra contradição nos termos. É a grande contradição nos termos: nas Escrituras, Jesus Cristo é bastante claro no seu amor pelos mestiços. O bom samaritano, por exemplo, era o mulato do seu tempo.