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Francisco Sarsfield Cabral
Opinião de Francisco Sarsfield Cabral
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Na política o bem é possível

14 out, 2019 • Opinião de Francisco Sarsfield Cabral


Perante a atual onda de ódio, de intolerância, de sectarismo, de exaltação da violência e até da tortura, de indiferença face ao sofrimento alheio, de corrupção, de ataques à democracia liberal - o Nobel da Paz 2019 evidencia que um político pode fazer o bem.

Em junho do ano passado, um acordo de paz pôs fim ao conflito armado entre a Etiópia e a Eritreia (a Eritreia tinha-se separado da Etiópia em 1993). Mas agora só o primeiro-ministro da Etiópia, Abiy Ahmed, recebeu o prémio Nobel da Paz 2019; o presidente da Eritreia ficou de fora, pois o seu regime é um dos mais opressivos de África.

Aquele acordo terminou uma guerra que durava desde 1998, tendo feito mais de 80 mil mortos. É certo que depois do acordo persistiram conflitos étnicos esporádicos entre os dois países e até dentro da Etiópia. E que, como reconheceu o comité Nobel, ainda há muito trabalho a fazer naquele país.

Também é verdade que, por vezes, o prémio Nobel da Paz não garante que o galardoado tenha, depois, um percurso exemplar. Recorde-se o caso de Aung Suu Kyi, uma ativista pelos direitos humanos em Myanmar (Birmânia) que recebeu o Nobel da Paz em 1991, mas que, tendo chegado ao poder nos últimos anos, não travou o genocídio da etnia “rohiynga”, desiludindo os seus admiradores.

Esperemos que algo de semelhante não se venha a passar com o atual primeiro-ministro da Etiópia. Como salientou o comité do Nobel, Abiy Ahmed iniciou reformas importantes, que dão esperança de uma vida e de um futuro melhores a muitos cidadãos. “Nos seus primeiros 100 dias como primeiro-ministro, levantou o estado de emergência do país, concedeu amnistia a milhares de presos políticos, descontinuou a censura à comunicação social, legalizou grupos da oposição que eram vistos como ilegais, demitiu líderes militares e civis suspeitos de corrupção e aumentou significativamente a influência das mulheres na vida política e comunitária da Etiópia”. E ainda se pode referir que Abiy Ahmed se envolveu como mediador noutros conflitos regionais, no Sudão nomeadamente.

Perante a presente onda de ódio (vejam-se as afirmações de Trump), de intolerância (incluindo o regresso do anti-semitismo), de sectarismo, de exaltação da violência e até da tortura (Bolsonaro), de indiferença face ao sofrimento alheio, de corrupção, de ataque à democracia liberal – este Nobel da Paz 2019 evidencia que um político pode fazer o bem. E que nem todos se esqueceram de alguns horrores do séc. XX, como o holocausto nazi, o “gulag” soviético ou a mortífera revolução cultural de Mao (um déspota, na altura grande referência de uma certa intelectualidade europeia.) Sim, na política fazer o bem é possível.

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