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Desemprego em mínimos é uma boa notícia? É, mas esconde "problemas" que só vão piorar

07 ago, 2019 - 16:22 • Pedro Mesquita , Cristina Nascimento

Apesar da queda da taxa de desemprego noticiada esta quarta-feira, os economistas e empregadores estão preocupados. A Renascença foi tentar perceber porquê.

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Há 17 anos que a taxa de desemprego não era tão baixa em Portugal, de acordo com números revelados esta quarta-feira pelo Instituto Nacional de Estatística (INE).

O facto de, no segundo trimestre, o número de desempregados ter contraído para 6,3% da população trabalhadora, é uma boa notícia para as famílias, que assim recuperam algum rendimento. Também é uma boa notícia para as contas públicas e para a Segurança Social, que fica menos pressionada.

Contudo, os economistas e empregadores estão preocupados. Desde logo porque é cada vez mais difícil encontrar mão-de-obra qualificada no país. Veja-se o caso de Manuel Marques, mestre de uma traineira da Póvoa de Varzim. Precisa de pescadores para o seu barco. Mas pescadores nem vê-los.

"No fundo de desemprego não deve haver nenhum", conta à Renascença. "Ainda hoje vim de lá e não há pescadores preparados para trabalhar na nossa costa. Os poucos que há vão todos trabalhar para fora, têm melhores condições salariais.”

A preocupação é partilhada por Silva Peneda, ex-ministro do Emprego e antigo presidente do Conselho Económico e Social.

"É mais preocupação do que boa notícia", defende. "Em primeiro lugar, esconde-se o problema da produtividade e aí há o que fazer. Mas há uma coisa de que ninguém fala. Com essa taxa de desemprego, as empresas vão ter dificuldade em arranjar mão-de-obra. O que está a acontecer é que a Alemanha está a passar pelo mesmo problema e está a ir buscar mão-de-obra, por exemplo, a Portugal. A Alemanha abre a porta a toda a gente e portanto vai haver escassez de mão-de-obra e de mão-de-obra qualificada que seria aquela que interessaria às nossas empresas para aumentar a produtividade", refere à Renascença.

A tendência, acrescenta o ex-governante, é preocupante sobretudo por ser difícil de contrariar.

“Cada ano que passa vai ser mais complicado, porque neste momento a taxa de natalidade é baixa, a população ativa vai descer, enquanto os reformados estão a subir cada vez mais e são aqueles países que têm maior produtividade e mais [trabalhadores] competitivos que vão competir por melhores recursos. Os recursos humanos vão ser escassos e, portanto, quem melhor pagar é quem os vai ter.”

Mão-de-obra qualificada está a ser atraída para fora

É o caso da Alemanha ou de Inglaterra. Um caso gritante neste contexto é o dos enfermeiros, que demonstra que uma aproximação ao pleno emprego é uma moeda com duas faces.

"Quatro por cento já é considerado pleno emprego, neste momento já estamos praticamente em pleno emprego", refere Silva Peneda. "É uma boa notícia para quem tem emprego com salários relativamente baixos, porque eles tendem a aumentar com uma procura maior e, como há falta de recursos, é uma boa noticia. E é uma boa notícia para aqueles que são muito qualificados, porque vão ter ofertas tanto em Portugal, como no estrangeiro e há países que vão pagar mais.”

Em suma, a notícia é boa para as famílias, mas menos boa para as empresas portuguesas, que terão dificuldades acrescidas em segurar trabalhadores qualificados.

A juntar a isso, há uma outra equação a ter em conta: a taxa de crescimento do PIB é igual à taxa de crescimento do emprego mais a taxa de crescimento da produtividade. E a verdade é que o emprego está a crescer em Portugal, mas a essa variável não está associado um crescimento assinalável da economia nem um aumento da produtividade. Porquê?

“A questão da produtividade é fundamental", refere à Renascença o economista João Duque. "As pessoas são empregadas para trabalhos de pouco valor acrescentado. Aquilo a que estamos a assistir é: o emprego cresce a uma taxa superior à do crescimento da economia.”

E os salários? E o endividamento?

João Duque sublinha, ainda assim, que o crescimento do emprego é uma boa noticia... para os trabalhadores. E a escassez de mão-de-obra fará crescer os salários, sobretudo para os trabalhadores mais qualificados?

“Sim, em princípio sim. Aliás, essa é a melhor defesa, que é não haver bolsas de trabalhadores desempregados com as suas características, porque assim quando aumenta a procura isso terá realmente consequências nos salários das qualificadas.”

O que nos leva um último ângulo. Se há mais pessoas com trabalho em Portugal, porque é que o endividamento das famílias continua a aumentar? A pergunta foi dirigida pela Renascença a João Calado, do Gabinete de Orientação dos Consumidores do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG).

“O facto de as famílias terem melhores condições de vida, estarem empregados, etc., até os leva muitas vezes a adotar projetos que implicam financiamento. Portanto, continuam a endividar-se. O facto de terem melhor situação financeira não é necessariamente um indicador de que vão reduzir o seu nível de endividamento. Pode acontecer exatamente o contrário e é isso que está a acontecer normalmente.”

[Editado por: Joana Azevedo Viana]

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  • J M
    08 ago, 2019 Jorge 17:51
    Não há mão de obra especializada porque as empresas não querem dar formação aos jovens, ou, para darem formação querem subsídios do estado, para depois os contratarem com ordenados de 600 euros/mês. Investiguem e façam uma estatística, 30% dos jovens que estão a trabalhar nas grandes superfícies, nas caixas ou na reposição, são licenciados contratados a prazo a trabalhar 4 horas por dia.
  • www.pakmegaplace.com
    08 ago, 2019 Pak Mega Place 08:00
    bom post

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