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Porque é o Estreito de Ormuz um foco de tensões entre o Ocidente e o Irão

04 ago, 2019 - 15:59 • Joana Azevedo Viana

A mais importante artéria do comércio mundial de petróleo voltou a ser palco de confrontos entre Teerão e o eixo anglo-americano. Perceba o que está em causa.

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As tensões entre o Ocidente e o Irão voltaram a atingir um pico histórico nas últimas semanas no Estreito de Ormuz, com os dois lados a ameaçarem guerra ao outro e Teerão a ficar cada vez mais isolado.

Entre o abate de um drone iraniano pelo porta-aviões norte-americano USS Boxer (uma alegação que Teerão desmente) à captura de dois petroleiros britânicos pelas autoridades iranianas, que acabariam por abater um drone dos EUA dias depois, as tensões na região estão novamente ao rubro.

Mas o que é o Estreito de Ormuz e qual a sua importância geoestratégica?

O que é o Estreito de Ormuz?

É uma faixa de água que separa o Irão de Omã e que faz a ligação entre o Golfo Pérsico, o Golfo de Omã e o Mar Arábico.

No seu ponto mais estreito, tem 33 quilómetros de largura. Contudo, a rota de transporte petrolífero só mede três quilómetros de largura.

Porque é que é importante?

No fundo, e porque grande parte dos países exportadores de petróleo se concentram naquela região, o Estreito de Ormuz é a mais importante rota mundial para o comércio de crude.

Que quantidade de petróleo é comercializada através do Estreito?

De acordo com o Gabinete de Informação Energética dos EUA, em 2016 passaram pelo Estreito 18,5 milhões de barris de petróleo transoceânico por dia, o equivalente a cerca de 30% do total de crude, petróleo e outros combustíveis líquidos comercializados por via marítima nesse ano.

Em 2017, cerca de 17,2 milhões de barris de crude e condensados terão sido transportados pelo Estreito a cada dia. Já na primeira metade do ano passado, de acordo com dados da empresa de análise petrolífera Vortexa, foram transportados, por dia, 17,4 milhões de barris.

Contas feitas, e considerando que o consumo global de crude ronda os 100 milhões de barris por dia, isso significa que quase um quinto do petróleo consumido em todo o mundo passou pelo Estreito de Ormuz.

Quem usa a rota?

A maior parte do crude exportado pela Arábia Saudita, o Irão, os Emirados Árabes Unidos (EAU) e o Iraque — todos eles membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) — é transportada via Estreito de Ormuz.

A rota é igualmente usada para transportar quase todo o gás natural liquefeito produzido pelo Qatar, o maior exportador mundial deste tipo de combustível fóssil.

Durante a Guerra do Irão (1980-1988), o Estreito de Ormuz ganhou protagonismo de tal forma que esse conflito ficaria conhecido como a Guerra dos Petroleiros, com os dois lados a tentarem perturbar as exportações de crude do outro.

Atualmente, do lado do Ocidente, é a 5.ª Frota dos EUA, com sede no Bahrain, que tem a tarefa de proteger os navios comerciais que atravessam o Estreito.

Porque é que as tensões voltaram a atingir um novo pico em Ormuz?

Em abril deste ano, antes das mais recentes hostilidades, analistas do banco RBC já tinham avisado, num comunicado citado pela Reuters: "Apesar da presença da 5.ª Frota para garantir que este importante canal continua aberto, antecipam-se manobras provocadoras da parte das forças armadas iranianas no imediato dada a atual situação nuclear".

Em 2015, sob um histórico acordo nuclear que assinou com o chamado P5+1 (os cinco países com assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, mais a Alemanha), Teerão aceitou vigilância ao seu programa de enriquecimento de urânio em troca de um alívio das sanções internacionais de que era alvo.

Graças a esse acordo, foi alcançado um período de relativa acalmia no Estreito de Ormuz até 2018, quando Trump decidiu abandonar esse pacto nuclear.

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"Todas estas tramas geopolíticas podem traduzir-se num cenário de verão cruel para o Presidente Trump, num momento em que está a tentar manter os preços do petróleo controlados", referiam os mesmos analistas há quatro meses.

Existem alternativas para o transporte de petróleo na região?

Os EAU e a Arábia Saudita continuam a tentar criar novas rotas para evitarem o Estreito de Ormuz, incluindo através da construção de mais oleodutos.

Que outros incidentes já houve no Estreito antes destes mais recentes?

Em julho de 1988, o navio de guerra norte-americano Vincennes abateu um voo comercia liraniano que transportava 290 pessoas a bordo. Todas morreram, no que Washington considerou ser um acidente, sob o argumento de que o avião foi confundido com um caça de guerra.

Teerão acusou os EUA de um "ataque deliberado". Os EUA responderam que o Vincennes estava na área para proteger navios neutros contra ataques perpetrados pelo Irão.

No início de 2008, os EUA apontaram o dedo ao Irão pelo que disseram ser uma provocação, quando navios de guerra iranianos fizeram uma aproximação a três navios dos EUA no Estreito.

Meses depois, em junho desse ano, o então comandante da Guarda Revolucionária do Irão, Mohammad Ali Jafari, anunciou que ia impor controlos aos navios que atravessam o Estreito de Ormuz em caso de ataque.

Em julho de 2010, um petroleiro japonês, o M Star, foi atacado no Estreito. O ataque foi reivindicado por um grupo de militantes autointitulado Brigadas Abdullah Azzam, ligadas à Al-Qaeda.

Em janeiro de 2012, o Irão voltou a ameaçar um bloqueio no Estreito de Ormuz em retaliação às sanções impostas pelos EUA e a União Europeia sobre as receitas petrolíferas do país, uma tentativa de travar o programa iraniano de enriquecimento de urânio.

Em maio de 2015, navios iranianos dispararam contra um petroleiro com bandeira de Singapura, após terem acusado os seus tripulantes de danificarem uma plataforma petrolífera. Nessa altura, Teerão também confiscou um navio porta-contentores que atravessou o Estreito.

Em julho de 2018, o Presidente iraniano, Hassan Rouhani, deu a entender que poderia cortar o fluxo de petróleo em Ormuz em resposta ao pedido então feito pelos EUA aos seus parceiros para que reduzissem as exportações de crude iraniano a zero. Um comandante da Guarda Revolucionária iraniana também veio a público anunciar que Teerão ia bloquear todas as exportações que atravessam o Estreito caso as exportações iranianas fossem castigadas.

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  • Cidadao
    05 ago, 2019 Lisboa 11:21
    Construam oleodutos e/ou apostem fortemente em energias alternativas que releguem as necessidades de petróleo para 2.º plano, ou desloquem para lá, uma Esquadra multinacional com apoio aéreo poderoso e batalhões de fuzileiros, a ver se o Irão não mete a viola no saco ...

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