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Padre João Seabra, retrato de vida de uma personagem “fulgurante”, em livro

05 jul, 2019 - 08:43 • Maria João Costa

“Padre João Seabra à Sua maneira” é o nome do livro que retrata a vida de um sacerdote que foi durante 10 anos capelão da Universidade Católica, durante 13 pároco de Santos-o-Velho e outros 13 pároco na Igreja da Encarnação, marcando sucessivas gerações.

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“A verdadeira liberdade é a liberdade de descobrir o próprio destino”, afirmou João Seabra em entrevista à jornalista da Renascença Aura Miguel em 2017. O destino foi algo que este padre sempre tomou em mãos. No âmbito dos 40 anos de sacerdócio, foi lançado esta quinta-feira em Lisboa, o livro “Padre João Seabra à Sua maneira”.

Antigo capelão da Universidade Católica, pároco em Santos-o-Velho e na igreja de Nossa Senhora da Encarnação, no Chiado, João Seabra nunca foi um homem de consensos. A prová-lo surge agora esta obra, da autoria de José Luis Ramos Pinheiro e Raquel Abecasis, que não tem a pretensão de ser uma biografia, mas antes um retrato do cónego que marcou várias gerações.

Em declarações á Renascença, a antiga jornalista Raquel Abecasis, que recorda o momento em que conheceu João Seabra como um instante “tempestuoso”, explica que o livro agora editado pela Dom Quixote vai do “início da vida do padre João Seabra, o que foram as suas origens, como é que esta vocação se pode ter definida”.

A autora ressalva que “nunca houve a intenção de fazer uma biografia”, razão explicada pelo facto de os autores considerarem que “era pouco interessante e porque o que estava no espírito, desde o início, era deixar uma marca escrita das marcas que este padre deixou em muitas gerações”.

Também José Luis Ramos Pinheiro, atual administrador do Grupo R/com, recorda as marcas que João Seabra semeou na sua vida, desde logo, porque foi o pároco que o casou. “Nunca tive um padre que me falasse de Cristo como o padre João Seabra me falou, nunca ninguém me levou para a igreja como ele me levou”, lembra Ramos Pinheiro acrescentando que “foi ele que me desafiou a ser jornalista”.

Neste livro em que através do testemunho do próprio Padre João Seabra e de muitos dos que ao longo do caminho se cruzaram, conviveram com ele e o acompanharam na sua fé, encontramos momentos decisivos da História de Portugal e os traços de uma personalidade nem sempre foi consensual.

“Há vários adjetivos que poderíamos utilizar. É uma personagem fulgurante, é intenso, tocante. Vê-lo à distância, no entanto, é ficarmo-nos pelas ideias feitas, pelos preconceitos, é muito curto. É preciso percebê-lo mais de perto, para se conseguir atingir esta personalidade. E ele de facto, tem as suas características, as suas enormes qualidades e defeitos que ele não esconde e colocou tudo isso ao serviço de Deus”, afirma José Luis Ramos Pinheiro.

Sobre a fé, o Padre João Seabra diz, na entrevista de 2017 á Renascença, que "é um dom de graça, é uma coisa que Deus nos dá e concede a quem entende. De vez em quando, concede a uma pessoa que vai pela estrada fora a pensar noutra coisa e Deus dá-lhe a fé. Deus concede a fé a quem busca sinceramente o significado das coisas”.

Em setembro próximo, este sacerdote que não pensava em jovem abraçar a igreja, completa 70 anos.

No seu percurso de 40 anos de sacerdócio, Seabra deixou marcas em muita gente. Homem dedicado à educação, fundou o Colégio de São Tomás e sonhou sempre em formar gerações. Como indica Ramos Pinheiro:, "o padre João Seabra sempre se deixou fascinar pela inteligência dos outros e também pela sabedoria de entender que há muitas formas, ritmos e maneiras de ir dar, neste caso, não a Roma, mas a Deus. Ele nunca se calou. Sempre que entendeu que devia manifestar a sua opinião, quer no diálogo individual quer numa intervenção mais pública e notória na sociedade portuguesa e na vida da igreja, mas adequando essa intervenção aos fóruns, às pessoas e à dimensão e gravidade das situações”.

No livro agora editado, Raquel Abecasis recorda um episódio contado pelo socialista João Soares, que mostra que João Seabra já pregava, mesmo antes de ser padre. “Conta que o padre João Seabra, na altura João Seabra, estudante de Direito, era dos poucos que ia àquelas reuniões de esquerda e se queria fazer ouvir. O João Soares conta que ainda hoje o cita muitas vezes a dizer 'se não me dão a palavra, eu tomo-a', que era uma forma como o João Seabra, na altura, se fazia ouvir, naqueles tempos politicamente conturbados e, depois, na sua vida de padre foi assim também”.

A prová-lo está o seu pensamento sobre a liberdade, palavra fundamental no percurso de João Seabra, que, em 2017, á jornalista Aura Miguel afirmava: “Hoje, a liberdade é considerada como a ausência de vínculos. Uma pessoa livre é uma pessoa que não está presa a ninguém. Não está presa ao amor que jurou a uma mulher, aos filhos que nasceram do seu amor, que não está presa a um emprego, a um trabalho, a um patrão, não está presa a um país, uma cultura, não está presa a nada. Pode partir, largar tudo e ir para a Polinésia descobrir a liberdade do vento que bate na cara. Mas essa não é a verdadeira liberdade. A verdadeira liberdade é a liberdade de descobrir o próprio destino”.

Pensamento de um padre para quem “Deus é verdade, mesmo!” e que aos seus seguidores propunha que “a intuição de verdade que os faz perguntar 'o que há aqui?'” deve ser respondida com um simples 'é preciso seguir essa intuição com lealdade'”.

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