03 abr, 2019 - 12:35 • Redação
Tinha sete anos quando foi retirada da família. A mãe tinha morrido há três anos, deixando sete filhos a cargo do pai. Filipa era, “infelizmente”, a mais nova. “Lembro-me que o meu pai chegava bêbedo a casa e batia nos meus irmãos. Depois os meus irmãos batiam-me”, descreve ao programa da Renascença As Três da Manhã. Era esta a sua rotina.
“Na escola viam que eu era uma criança diferente das outras”, diz Filipa, acrescentando que muitas vezes ia para as aulas sem comer. Foi a escola que fez queixa da situação e acabou por ser retirada da família. Foi para uma instituição, assim como uma das irmãs, a única pessoa com quem falou durante os primeiros meses que esteve naquele que era o seu novo lar.
Passado algum tempo, a instituição onde estava fechou e Filipa foi transferida para outra, onde recomeçou um cenário de violência. “Uma funcionária batia-me por não querer ir à casa de banho fazer xixi. Ainda hoje tenho marcas no corpo.”
Filipa é uma das muitas crianças que sofrem vários tipos de violência em contexto familiar. Filipa é de Lisboa, mas no Porto, estudos indicam que uma em cada 10 crianças é vítima de violência grave.
Por três vezes, Filipa esteve à beira de ser adotada, o que acabou por nunca acontecer. Atualmente, já não está institucionalizada e pouco se relaciona com a sua família biológica. “Relaciono-me com todos se falarem comigo, senão não toco neles.”
Questionada sobre se sente alguma forma de amor pela família biológica, é perentória: “Não, a família sou eu que escolho. Felizmente tenho uma família minha, aquela que me acolheu aos 16 anos. Foi um milagre.”
Sobre o futuro, Filipa deseja ter três filhos, um deles adotado. Vai voltar a estudar em setembro, porque “sem estudos não sou ninguém na vida” e depois quer trabalhar, “ir à luta”.
Sobre o seu passado negro, diz que fala “com orgulho”, mas reconhece que “dói”, ainda hoje. Apesar de recordar com tristeza a sua infância, admite ter também “muitas memórias boas” e ter aprendido que “nem todas as tempestades são para ficar”.
“Ainda tenho esperança no sol”, acrescenta.
Aos que passam por situações semelhantes, Filipa aconselha a que peçam ajuda e deixa uma mensagem de esperança: “Tudo passa.”