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Ciclone Idai e as barragens em Moçambique. "Não há que ter preocupações", garante LNEC

22 mar, 2019 - 18:44 • Tiago Palma

Diretor do Departamento de Barragens do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) garante que a situação das barragens de Cahora-Bassa e Nampula não acarreta qualquer risco para a população.

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O diretor do Departamento de Barragens do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), António Lopes Batista, garantiu esta sexta-feira à Renascença que a situação das barragens em Moçambique (nomeadamente na de Cahora Bassa e na de Nampula) não representa qualquer ameça para a população quanto à abertura das comportas.

“O que nós sabemos é que, nas barragens em questão, a albufeira estava relativamente baixa, porque estes últimos tempos em Moçambique têm sido de seca. E subiram, tiveram agora um incremento do nível de água na albufeira, tiveram afluências grandes, mas ainda não estão perto do pleno armazenamento."

Em permanente contacto com os técnicos da Hidroeléctrica de Cahora Bassa, empresa estatal rersponsável pela manutenção da barragem, António Lopes Batista explica que "as barragens têm um nível de pleno armazenamento, que é o nível ideal que devem ter, e depois têm uma reserva até ao nível de máxima cheia, que pode ser de mais dois, três, quatro metros de altura durante cheias intensas".

Ora, no caso destas duas barragens, garante, "as mesmas tinham níveis bastante abaixo do pleno armazenamento" antes da passagem do ciclone Idai. "E agora, com estas afluências de águas, aproximaram-se do pleno armazenamento – mas ainda não estão. Portanto, quando se fala que Cahora Bassa está a 98%, ainda tem mais 2% até ao nível de pleno armazenamento, e depois, a partir daí, ainda há uma reserva muito grande até ao nível de máxima cheia”, explica.

No começo da semana, circulou, em Moçambique, através da Direção Nacional de Recursos Hídricos, a informação de que as barragens de Cahora Bassa e Nampula estariam perto de atingir o nível máximo de retenção de águas nas respetivas albufeiras, podendo a abertura das comportas – e consequentes descargas – levar a grandes cheias.

Pouco depois, circulava também, via WhatsApp, entre a comunidade portuguesa residente em Moçambique, a informação de que, no Zimbabué, a abertura das comportas na barragem de Kariba poderia causar uma catástrofe. A informação era atribuída a fonte da embaixada portuguesa em Maputo e acompanhada do apelo à população para se precaver e abrigar.

A verdade é que, desde então, não houve descargas de grandes dimensões em nenhuma das barragens.

Moçambique. Multiplicam-se esforços de resgate e entrega de ajuda
Multiplicam-se esforços de resgate e entrega de ajuda. Vídeo: Marília Freitas/RR

Quanto ao Zimbabué, o diretor do Departamento de Barragens do LNEC explica que “existe uma comunicação permanente entre os Estados”, pois em Kariba está “represado um volume de água imensa”, razão pela qual, se houver necessidade de abrir comportas para jusante, “tudo isso será coordenado” entre Moçambique e o Zimbabué.

Segundo António Lopes Batista, uma descarga não é expectável, mas poderá vir ainda a acontecer.

“Estamos em permanente contacto com Moçambique, nós sabemos o que é que se passa nas barragens, eles têm equipas técnicas com bastante autonomia, e têm uma interação connosco no sentido de nós os podermos complementar em assuntos que sejam já de um domínio um pouco mais elevado, de conhecimentos mais específicos", explica à Renascença.

Desde segunda-feira, adianta, o pessoal das barragens moçambicanas tem pedido opiniões ao LNEC e a sua equipa tem respondido prontamente, até porque "poderão vir a ter que fazer uma gestão adequada relacionada com este aumento súbito de afluências de água às albufeiras".

Contudo, e para já, explica, "ainda não falámos de abertura de comportas, só do que é que eles têm de fazer em termos de observação, a que sinais é que têm de dar mais atenção – e o que sabemos até agora é que está tudo bem, não há que ter preocupações".

Construída em 1969, a barragem de Cahora Bassa é uma das maiores de África e a sua albufeira tem 66 mil hectómetros cúbicos (a maior barragem de Portugal, Alqueva, tem quatro mil). Durante anos, Cahora Bassa foi gerida pelo Estado português (que agora detém 15% de participação), sendo desde 2007 detida pelo Estado moçambicano.

António Lopes Batista lembra que não há qualquer risco de colapso, pois esta é vistoriada (inclusive por técnicos no LNEC) e recebe pequenas intervenções com regularidade.

“As barragens são projetadas para terem um tempo útil de vida de 100 anos. Todas estas barragens têm, ao longo da sua vida, pequenos sintomas, mas o seu comportamento é acompanhado e, atempadamente, logo que há sintomas ou algum comportamento não esperado, poder haver intervenções no sentido de mitigar isso. Nós fazemos relatórios – estudos, intervenções ou ensaios – sobre as barragens moçambicanas ao abrigo de contratos com o Governo local. Os procedimentos [de segurança] que são adotados nestas duas barragens são muito semelhantes aos nossos.”

Nos próximos dias é expectável que a precipitação em Moçambique prossiga, caíndo com maior intensidade no sábado, o que vai fazer subir o nível das águas nas albufeiras.

“Não sei se vai continuar a chover muito ou não, provavelmente agora as afluências às albufeiras serão menores, e portanto a situação tenderá a estabilizar", acredita o engenheiro português. "Mas se continuar a chover, há-de haver uma determinada altura em que vão ter de abrir as comportas para poder libertar alguns caudais para jusante."

Isso, aponta, é assim "agora ou em qualquer situação em que as afluências sejam muitos grandes e as albufeiras já não comportem mais água".

No caso de Cahora Bassa, "no passado já fizeram descargas, já abriram as comportas em situações de cheia", sempre de forma "sincronizada", por forma a minimizar os impactos no vale a jusante, "principalmente no que diz respeito às vidas humanas".

Quando tal acontece, ressalta António Lopes Batista, "são feitos avisos à população, tudo é coordenado entre as entidades que gerem as barragens e os serviços de proteção civil”.

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