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Reportagem Bola Branca

Taça, a quanto obrigas para que o sonho não acabe

21 nov, 2018 - 12:45 • José Pedro Pinto

Uma viagem pelas emoções, dificuldades e ambições da sensação que quer continuar a fazer furor na prova-rainha. Diretamente dos distritais do futebol açoriano, o Vale Formoso vai a Tondela com vontade de ser "tomba-gigantes" e de manter o Jamor no horizonte.

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De Vale em Vale, vale mesmo tudo a pena. Até uma busca incessante de várias semanas por apoios financeiros para saldar a fatura de seis mil euros que chegou ao Campo de Jogos de Sant'Ana, nas Furnas.

Governo regional dos Açores e Federação Portuguesa de Futebol (FPF) contribuíram com parte da verba e outros patrocinadores compõem o orçamento que permitirá levar o modesto mas orgulhoso Vale Formoso até Tondela, para os 16 avos-de-final da Taça de Portugal. Pelo meio, houve até rifas para sortear um lugar no avião a quem tivesse a felicidade de ser premiado.

A ocasião é tamanha - presença na quarta eliminatória da Taça de Portugal, na segunda participação da história do clube na prova-rainha - que Sandro Ferreira, presidente do emblema de São Miguel, não abdicou de levar todo o plantel rumo ao continente. Oportunidades destas não estão ao virar da esquina.

"É um esforço enorme", enfatiza o líder do Vale Formoso, em entrevista a Bola Branca.

"Temos tentado encontrar patrocinadores e até fizemos umas rifas para sortear um lugar no nosso avião para esta eliminatória. Temos tentado minimizar os custos, que são grandes. Queremos levar o plantel todo a Tondela. A Direção achou que seria um prémio enorme para todos se conseguíssemos levar todos os jogadores a uma equipa e a um estádio de Primeira Liga", salienta Sandro Ferreira, que já viu o clube da Segunda Divisão distrital açoriana realizar um percurso no mínimo caricato na Taça.

O Vale Formoso começou por ser eliminado, foi repescado, bateu o Pinhalnovense e perdeu com a União de Leiria. Mas, na secretaria, foram os leirienses os eliminados por utilização irregular de um jogador castigado. Seguiu-se o Coimbrões, batido após prolongamento e com muita polémica à mistura. E agora, o duelo com o Tondela, da I Liga.

A Taça em todo o seu esplendor. Mas o sonho do Jamor tem muito que se lhe diga

Há sonhos caros, ainda mais para um clube com um orçamento anual na ordem dos 25 mil euros. Mas só o "cheirinho" a Jamor já paga grande parte do sacrifício.

"Há sempre esse sonho. Qualquer clube em Portugal sonha em chegar ao Jamor. Seria um feito histórico, enorme. Mas já sonhar com o Jamor é um feito muito grande para nós", sustenta Sandro Ferreira, por entre um sorriso recheado de esperança, mas igualmente ambição.

E há igualmente sonhos que, de tão imponentes e improváveis, provocam gargalhadas. Hélio Oliveira, treinador do clube das Furnas - "nome de guerra": Helinho - quer alimentar a piada de um trajeto peculiar na prova rainha.

"As pessoas riem-se, mas já vamos para a quarta eliminatória e tudo é possível. Se não acreditarmos, mais ninguém acredita", remata o jovem técnico de 36 anos, cuja inspiração vem da Premier League. E não é José Mourinho.

Antes, uma questão de "chip". Envolvido no contexto regional, com o título da Taça de Honra da AF Ponta Delgada como objetivo antes do Campeonato de São Miguel, o atrativo da Taça e o mediatismo da segunda prova mais importante do futebol nacional levam a uma gestão com pinças.

"A parte mais difícil é a emocional. A passagem aos 16 avos-de-final da Taça de Portugal levou-nos a uma realidade e a um mediatismo a que não estávamos acostumados. Gerir isso é difícil. Ainda para mais, estamos envolvidos numa competição regional que queremos ganhar. É complicado desligarmo-nos do sonho, desligar a ficha e voltar para o futebol regional", aponta Helinho, que lidera uma equipa técnica coadjuvada por uma "mental coach" em permanência.

"Estar a lidar constantemente com a Taça de Portugal não é fácil. Tivemos de nos aconselhar com a nossa 'mental coach' para nos explicar como lidar com os jogadores e com as pessoas que trabalham no clube", adianta Sandro Ferreira.

Por Guardiola. "Não vamos levar autocarro a Tondela"

Helinho não é de rodeios. "Já tivemos sorte nesta Taça", reconhece, admitindo igualmente a "probabilidade reduzida" de ser "tomba-gigantes" no Estádio João Cardoso, domingo, a partir das 15h00.

Mas os "pontos fortes e fracos" do Tondela estão já devidamente sinalizados e será uma equipa com raça açoriana a entrar em cena. Mais: o único "autocarro" no interior do país será o que transportará a equipa até ao estádio auriverde, gentilmente cedido pelo primodivisionário.

"Garantidamente que não vamos levar um autocarro a Tondela. Vamos querer jogar à bola e vamos aproveitar essa oportunidade para demonstrar que os jogadores açorianos têm qualidade. Foi-nos dada essa oportunidade e vamos demonstrar isso mesmo", frisa.

O mesmo é dizer que os princípios de jogo do "guru" futebolístico de Helinho poderão surgir em Tondela.

"Tentamos jogar como as equipas do Pep Guardiola, mas depende dos adversários, dos campos e das próprias bolas com que jogamos, que não são as melhores. A relva também é um pormenor que faz a diferença e o próprio acompanhamento dos jogadores também. São pormenores que só os tendo é que se consegue chegar ao patamar do Guardiola", assinala.

Se a inspiração é mesmo o catalão, então há um imperativo bem evidente.

"A principal missão é ganhar o jogo, mas vou dizer aos meus jogadores para se divertirem. Se não nos conseguirmos divertir num campo de futebol, nunca vamos ganhar. Gosto que as minhas equipas se divirtam dentro de campo e sintam prazer em jogar futebol. A vitória, depois, vem por acréscimo", declara Helinho.

Uma equipa de médicos e pescadores

No plantel do Vale Formoso, há de tudo. De médicos a pescadores, com e sem formação superior, perante todos se coloca um prémio bem saboroso. O capitão Maciel dá o mote.

"Temos o princípio de dignificar o símbolo que carregamos ao peito. Jogar em Tondela, por onde passam os maiores clubes portugueses, é motivo de orgulho. A motivação vem do próprio jogo", assegura.

"Estamos num clube que tem uma identidade muito própria. A nossa presença na Taça de Portugal e o prémio de poder defrontar um clube de I Liga é mais do que justo para a história e vida deste clube", conclui.

De Vale (Formoso) em Vale (do Jamor), vale mesmo tudo a pena.

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