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Mochilas pesadas. “Há todo um trabalho” que o Ministério da Educação está a fazer

15 fev, 2017 - 12:29

O estudo sobre o que deve saber um aluno à saída da escolaridade obrigatória, apresentado no sábado, é um dos pontos de partida para as alterações que o Ministério quer fazer nas escolas.

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João Costa, secretário de Estado da Educação, sobre o perfil do aluno à saída do 12º ano, no Carla Rocha - Manhã da RR (15/02/2017)

O secretário de Estado da Educação, João Costa, garante que o Ministério quer acabar com mochilas pesadas e vê “com bons olhos” a petição pública que já reuniu quase 50 mil assinaturas e que chega ao Parlamento na próxima sexta-feira.

“Vejo com bons olhos e com preocupação. Passa por muita coisa – passa também por saber planear quais os materiais que são necessários trazer todos os dias ou não. Há muitas partes que é preciso equilibrar”, começa por dizer na Renascença.

Quanto a legislar sobre o assunto, o secretário de Estado concorda, mas ressalva que é um assunto que de “tem ser visto de uma forma integrada: que recursos precisamos, como é que os convocamos, que cacifos temos nas escolas, quais as equipadas com cacifos”, por exemplo.

“Toca em muitos pontos e não vale a pena fazer uma intervenção cirúrgica que depois na prática não funciona”, defende.

João Costa sublinha que há um trabalho em curso que, em última análise, deverá levar ao aligeirar do peso das mochilas. Esse trabalho passa pela “flexibilidade na gestão do currículo, o que significa que, identificadas algumas aprendizagens essenciais, há depois múltiplas formas de explorar o currículo e essas formas são incompatíveis com o manual único”.

“Estamos a abrir a porta a trazer para dentro da sala outros recursos, explorar mais recursos digitais, explorar mais materiais múltiplos que até podem estar na sala”, o que lança também “as bases para que as mochilas estejam mais leves”, explica.

Uma escola para o séc. XXI

O Ministério da Educação tem em curso um debate sobre o Currículo do Século XXI. Foi nesse âmbito que surgiu o estudo, liderado por Guilherme d’Oliveira Martins e apresentado no sábado, sobre quais as competências que um aluno deve ter à saída da escolaridade obrigatória.

“Alargámos a escolaridade obrigatória aos 12 anos, mas para quê? O que é que se espera que o aluno atinja e seja capaz de fazer ao fim destes 12 anos?”, questiona o secretário de Estado.

O resultado do estudo foca 10 áreas. “São áreas transversais, áreas chave para formar cidadãos aptos a agir nos desafios que este século coloca e motivados para continuar a investir na sua educação ao longo da vida”, afirma João Costa.

Mas “quando ouvimos os alunos no secundário, disseram-nos que a pergunta que mais fazem na escola é ‘sai para o teste?’. É uma pergunta muito triste”, considera o secretário de Estado da Educação, para quem “o papel da escola, em primeiro lugar, é despertar curiosidade intelectual”.

Há, por isso, que fazer mudanças. “Temos um ensino ainda muito centrado em conteúdos – que são importantes, mas temos muitos alunos com uma relação com o conhecimento cada vez mais descartável: sei, memorizo hoje, despejo no dia do teste e no dia seguinte já não sei”.

João Costa quer “alternar metodologias e instrumentos de avaliação”, desviando o foco da avaliação dos testes – “os testes fazem falta, são importantes, mas não se esgotam, porque posso ter um trabalho de projecto em que aprofundo e desenvolvo competências que um teste não permite”.

“Há vários instrumentos que é preciso diversificar e, sobretudo, promover trabalho de projecto interdisciplinar”, o que obriga “a um trabalho que está a ser feito em paralelo, que é – agora em função deste perfil [do aluno do 12º ano] – disciplina a disciplina, identificar as aprendizagens que são essenciais como contributos para atingir este perfil”, defende.

Tudo isto impõe “um desafio muito maior” quer às escolas quer aos alunos.

“No ano passado, publicámos um despacho normativo que recentra a avaliação na sua dimensão formativa e convida as escolas a fazer este trabalho: diversificar instrumentos de avaliação. É muito mais exigente para os alunos, porque dominar diferentes instrumentos é muito mais exigente, é mais exigente para a escola, mas também dá muito mais autonomia aos professores no seu trabalho, e parece-me que isto é fundamental”, afirma o convidado do programa Carla Rocha – Manhã da Renascença.

Educação dos afectos

O Ministério da Educação vai mesmo avançar com o Referencial de Educação para a Saúde, um documento orientador destinado à educação pré-escolar e aos ensinos básico e secundário, com vista à promoção da literacia em saúde, a adopção de estilos de vida saudáveis e o desenvolvimento de competências sociais e emocionais.

Gerou alguma polémica porque propõe temas como a interrupção voluntária da gravidez a alunos do 5º ano. Na entrevista à Renascença, o secretário de Estado da Educação explica que “um dos objectivos do perfil do aluno é também permitir que a escola aprofunde a dimensão da educação para a cidadania”, estando previsto que “estes referenciais possam ser utilizados”.

Na área específica do aborto e da educação sexual, “como vimos ontem até pelos números muito preocupantes de aumento na violência no namoro, é muito claro que a educação sexual passa por muita coisa – por uma educação dos afectos, do respeito pelo outro, da igualdade de género, que são áreas contempladas no Referencial de Educação para a Saúde”.

“O perfil dos alunos à saída da escolaridade obrigatória” está em discussão pública até ao dia 13 de Março.


João Costa, 44 anos

Estudou no MIT, em Boston e leccionou em várias universidades estrangeiras, passando pelo Brasil, por Macau, Espanha e Holanda.

É professor catedrático de Linguística na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e acredita que inclusão, mobilidade social, educação humanista e formação artística e desporto são parte essencial da missão da educação.

O antigo escuteiro e dirigente do Corpo Nacional de Escutas disse um dia sobre a educação em Portugal: “Ainda há muitos alunos que chumbam e geralmente esses alunos vêm de famílias mais pobres. O meu desejo seria que todos os alunos tivessem a oportunidade de aprender”.

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  • RC Victor
    15 fev, 2017 Lx 15:56
    Com os 'tablets' disponíveis no mercado a preços muito acessíveis as mochilas cheias de livros são uma aberração, só 'justificada' pelo negócio e lobo dos livros (o mesmo que quer o malfadado AO). Num tablet cabem todos os livros de ensino, de exercícios com correcção, de literatura, etc. e ainda permite complementos e consultas à WEB, tomar notas escritas e faladas e imprimi-las/ouvi-las na escola ou em casa se necessário. Seria muito mais ecológico e um tablet pesa 200g ou 300g e pode ser carregado por pequenos carregadores solares!

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