Tempo
|
Henrique Raposo
Opinião de Henrique Raposo
A+ / A-

NEM ATEU, NEM FARISEU

Não, as religiões não são todas iguais

06 jan, 2017 • Opinião de Henrique Raposo


As religiões não são diferentes apenas nos seus momentos históricos. São diferentes nas suas bases morais e intelectuais. Por exemplo, o cristianismo valoriza o livre arbítrio, o islão (mesmo o islão tradicional ou moderado) valoriza a submissão.

Após um atentado islamista, o espaço público é de imediato controlado pelo lero-lero ateu que se julga muito científico: “todas as religiões são iguais”, “religião é uma fábrica de fanatismo”, etc.

Perante um ataque concreto de fanáticos islamitas que emergiram de um caldo religioso concreto (comunidades muçulmanas a viver na Europa), a ladainha ateia remete o assunto para um termo vago, “religião”, que pouco ou nada quer dizer. Lamento, mas as religiões não são todas iguais, nem na teoria, nem nas suas manifestações históricas. Por exemplo, no nosso momento histórico, não há cruzados, só há jihadistas.

Em 2016, não existe uma única corrente cristã a legitimar actos terroristas, mas existem diversas correntes islamitas que legitimam o terror de forma directa ou indirecta. Quando confrontado com esta evidência, a ladainha ateia sobe uma oitava e atinge o seu verdadeiro propósito: criticar o cristianismo. Quando dizem “a religião é sempre uma fábrica de fanáticos” ou “todas as religiões são iguais”, os ateus não estão a fazer um esforço sério para compreender o islamismo; estão, na verdade, a usar o islamismo para ressuscitar a velha guerra civil da modernidade ocidental, a guerra entre ateus e cristãos. Naquelas cabeças, o muçulmano é uma criança inimputável, uma peça acessória, a roda sobresselente.

Através desta inversão da lógica, qualquer ataque muçulmano acaba assim num debate sobre a alegada intolerância cristã. Um facto (violência muçulmana) é escondido atrás de uma alegação dúbia (a tal intolerância cristã). Esta desonestidade ficou evidente após o massacre de Orlando. Um fanático islamita acabara de matar dezenas de gays americanos, mas os pivôs da CNN recusaram colocar a questão dentro do ângulo islâmico, recusaram ceder àquilo que apelidam de “islamofobia” e insistiram num slogan que tem tanto de informativo como um anúncio da ILGA: era preciso ver aquele massacre pelo prisma da “homofobia”, porque há fanáticos homofóbicos em todas as religiões, a começar no cristianismo americano. Isto é desconversar à escala de Cecil B. DeMille.

Estamos a falar da mesma CNN que tem dado uma atenção escassa, para usar um eufemismo, ao grande massacre do nosso tempo: o genocídio de cristãos em todo o Médio Oriente às mãos de fanáticos islamitas. A época histórica que regista um genocídio em massa de cristãos, que tiveram de sair das suas comunidades pela primeira vez em 2000 anos, também é a época que recusa ver o cristão como uma vítima. Esse papel está reservado para a criança inimputável, o “outro”, o negro, o muçulmano, o oriental.

As religiões não são diferentes apenas nos seus momentos históricos. São diferentes nas suas bases morais e intelectuais. Por exemplo, o cristianismo valoriza o livre arbítrio, o islão (mesmo o islão tradicional ou moderado) valoriza a submissão. Esta diferença moral tem por base uma clivagem histórica: no islão não existe tensão ou dialéctica entre a jurisprudência e teologia. Ao contrário da tradição narrativa e literária dos livros da Bíblia, o Al-Corão é um código de leis concretas que alegadamente representa a palavra de Deus ipsis verbis. É um código civil lavrado nos céus. É total e prescritivo, isto é, prescreve todos os aspectos privados e públicos, deixando pouco espaço à interpretação teológica do homem. A Bíblia deixou princípios, o Al-Corão deixou alíneas jurídicas.

O islão é político e jurídico desde a fundação, não contemplando a separação entre consciência privada e presença pública do crente, não aceitando a diferença entre direito positivo da política e direito natural de Deus. Por outras palavras, a jurisprudência islâmica é quase uma utopia política que exige uma réplica aqui no mundo terreno; a teologia cristã cria uma medida justa que serve de modelo moral para os diferentes regimes políticos que se vão sucedendo na história.

Há dois ou três oceanos entre uma tradição e a outra. O islão quer fundir Atenas e Jerusalém numa única peça. O cristianismo aceita e promove a tensão criadora entre Jerusalém e Atenas, entre o poder político do direito civil e o poder espiritual do direito natural (ideia universal de justiça). No espaço criado por esta tensão, nasceram pormenores como o jusnaturalismo dos direitos inalienáveis, o constitucionalismo e o estado de direito, uma ciência inigualável, uma arte inigualável e até o ateísmo. Sim, o ateísmo só poderia ter surgido no contexto da civilização cristã. E, nesse sentido, é uma das provas maiores da grandeza do cristianismo.

Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

  • AFS
    10 fev, 2017 Vila de Conde 22:10
    Sr. Henrique Raposo, fico feliz por ter lido seus artigos. Revelam sabedoria e erudição e cultura bem fundamentadas em princípios que dão sustentáculo aos valores consequentes. Estamos num tempo em que, com habilidades sofistas, estão deitando fora, de forma imbecil e leviana, todo um património sólido de uma Civilização, porque fundamentado em bases científicas, de suporte filosófico e racional. Basta ver quem está legislando sobre a vida humana, etc.? Impõem ideologias da última hora como verdades absolutas...Basta ver como tratam a família, a vida humana, etc...Quando lhes convém apelam para a Constituição, mas quando esta , de acordo com a Declaração dos Direitos do Homem, diz que toda a Vida Humana é inviolável, ou quando se apela para o "juramento de Hipócrates no cumprimento do acto médico, passam adiante ou querem alterar a Lei para as suas esquisitas conveniências...Para quando suster toda esta desorientação? Para quando uma geração capaz de alterar este (des)ordenamento jurídico que afecta todo um Povo?...Parabéns pelo seus artigos.
  • José Reinaldo Martin
    14 jan, 2017 São Luís - MA - Brasil 16:06
    O livre arbítrio ñ é uma unaminidade entre os cristãos; há os que acreditam na predestinação etc. Agora, se o Deus de Cristo ñ permitir o livre arbítrio, o cristianismo perde o sentido, pois o Deus de Cristo estaria 'alimentando robôs'. ------- Hoje, há três testemunhos cristãos. 1. Dos cerca de 100 milhões de cristãos que estão sendo perseguidos, principalmente em países islâmicos. Testemunho mais difícil. 2. Dos cristãos que respeitam os direitos dos demais: gays, descasados, adúlteros, mas optaram, dentro do livre arbítrio, pela posição definida na Blibia. Testemunho difícil, pois são cristãos q podem, por exemplo, adulterar, mas ñ fazem por Cristo. 3. Os cristão que querem a 'mulera' do estado para impor sua crença nas escolas públicas,obrigar o Estado a ñ reconhecer o direito das mulheres, gays, descasados, políganos etc. Testemunho inquisitor vigente até hoje em países como o Brasil. O mais fácil, lois as leis de Estado e o crosrianismo estão juntos. ------ Agora, o artigo é excelente. O terrorismo islâmico é uma realidade que precisa ser vista de forma mais séria. Outra situação estranha é a mídia internacional silênciar frente a perseguição a cristãos em países islâmicos, como se fosse uma atitude normal. Pq?
  • António Costa
    14 jan, 2017 Cacém 01:40
    Quando não concordo com os seus artigos digo-o. Neste caso concordo consigo e com a análise que fez. Mário Soares era um politico pragmático, mas os valores que criaram o "Ocidente" vieram de dar a César o que é de César e a Deus o que é de Deus, um dos princípios da Religião Cristã. Evidentemente que as fogueiras dos Celtas, Cartagineses e Romanos tentaram ser REPETIDAS pela "Santa Inquisição". Mas pela 1ª vez em 10 000 anos a Religião estava em contradição com a prática ANCESTRAL de queimar vivos os opositores políticos! A Inquisição caiu como um "baralho de cartas" e a Hierarquia Católica teve que "pedir Perdão" pelos hediondos crimes cometidos!
  • Ines Raimundo
    11 jan, 2017 Lisboa 15:34
    Parabéns e obrigada pelo texto que escreveu. Muito claro e de grande coragem para os tempos que correm! E está tudo correcto!
  • António Costa
    09 jan, 2017 Cacém 16:22
    Li com atenção o seu artigo. Aos comentários, fiz o mesmo. Dois ou três comentários apressaram-se a acusar o Henrique Raposo de xenófobo e ignorante sob o Islão. "O Islão é a nossa Constituição disse um alto dignatário saudita". A Constituição é um conjunto de Leis. Não discuto a Teoria da Relatividade com o Einstein. Não discuto o "Islão" com os dirigentes sauditas. Concordo na Totalidade com o seu artigo. A 100%. É claro, que como o "Joaquim - Odemira", o "Marco Visan - Porto" estou extremamente surpreendido pela sua publicação, mas pelas razões opostas.. Agradeço à Renascença a Enorme Coragem que mostrou pela sua publicação.
  • manuel costa
    07 jan, 2017 barreiro 18:40
    A minha opinião, se é que interessa ao assunto/tema do debate, é este: por mim, ninguém devia visitar países que dão cobertura a estes criminosos que, em nome das diversas religiões, praticam estes bárbaros ataques a cidades, pessoas e bens. Embaixadores não eram nomeados para tais países. Negócios, era só o que faltava! Mas meus caros, os interesses, a ganância, a corrupção falam (gritam) mais alto e portanto quem se vai lixando é sempre o mesmo: o inocente, o incauto, o crente. Tenham um bom dia, sem atentados.
  • 07 jan, 2017 15:23
    Excelente artigo. Subscrevo completamente.
  • Marco Visan
    07 jan, 2017 Porto 14:45
    Já tivemos aqui um comentador do partido PNR, a dar os parabéns ao texto de Henrique Raposo. O próprio comentador (ao que suponho, Rogério Santos), chama ao autor do texto por «camarada». Ou seja, amigos da xenofobia. Como o Joaquim, não percebo a razão da Rádio Renascença dar espaço de publicação aos adeptos da xenofobia.
  • Joaquim
    07 jan, 2017 Odemira 11:42
    Mais uma vez o raposo mostra a sua ignorância e claro como quer opinar sobre uma coisa que nao sabe, mostra assim muita falta de inteligência.Só não percebo como uma instituição da igreja católica, a RR ligada ao ecumenismo que deveria praticar publica coisas desta estirpe...
  • D. BOSCO
    07 jan, 2017 Torino 10:46
    S. João Bosco, nos explica toda a verdade sobre o Islão. Quem foi Maomé e sua religião. “Nasceu em Meca, de família pobre, de pai gentio e mãe judia. Errando em busca de fortuna, encontrou-se com uma viúva, que o nomeou seu procurador e casou-se com ele. A religião que pregava era uma mistura de paganismo, judaísmo e cristianismo. Ainda que admita um só Deus, não reconhece a Jesus Cristo como filho de Deus, mas como seu profeta. Como dissesse com alarde que era superior ao divino Salvador, instavam com ele para que fizesse milagres como Jesus; porém ele respondia que não tinha sido suscitado por Deus para fazer milagres, mas para estabelecer a verdadeira religião mediante a força. Ditou suas crenças e com elas compilou um livro que chamou Alcorão, isto é, livro por excelência; narrou nele o seguinte milagre, ridículo em sumo grau. Diz no Alcorão: “Sim, aqueles que dizem Deus é o Messias, filho de Maria, são ímpios” (V, 72). (referindo-se a Jesus) Sendo conhecido por homem perturbador, seus concidadãos trataram de dar-lhe morte; retirou-se para Medina com muitos aventureiros que o ajudaram a apoderar-se da cidade. Esta fuga de Maomé se chamou Egira, e desde então começou a era muçulmana, correspondente ao ano 622 de nossa era. O Alcorão está cheio de contradições, repetições e absurdos. Não sabendo Maomé escrever, ajudaram-no em sua obra um judeu e um monge apóstata da Pérsia chamado Sérgio. Como o Islão favorece a libertinagem, teve largo o apoio de um bando de insurrectos