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​“Se Trump ganhar o futuro é uma incógnita”

08 nov, 2016 - 15:56 • Maria João Costa

Há uma América “bully”, que vota Trump, e uma América preocupada com as questões sociais, que escolhe Hillary. Entrevista a Onésimo Teotónio Almeida, professor de Cultura Portuguesa nos EUA.

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Onésimo Teotónio Almeida nasceu nos Açores em 1946. Tinha 25 anos quando atravessou o Atlântico para os Estados Unidos onde hoje é professor do departamento de Estudos Portugueses e Brasileiros da Universidade de Brown em Providence. Lecciona, entre outras cadeiras, Cultura Portuguesa. Visita com regularidade Portugal onde tem uma vasta obra literária publicada.

Nesta entrevista, Onésimo Teotónio Almeida fala da América “bully” de Donald Trump e da América preocupada com questões sociais de Hillary Clinton. Diz que se Trump ganhar nem as “bruxas” podem prever o que vai acontecer.

Em que é que estas eleições são diferentes de outras campanhas anteriores?

São diferentes porque nunca me lembro de um candidato tão populista e fanático como Donald Trump chegar às finais. George W. Bush era populista e simplista, mas nada que se pareça com Trump. O problema já nem reside no facto de ele ter chegado às finais, mas no de ter sérias hipóteses de ganhar.

Os dois candidatos representam “Américas” diferentes?

Nos EUA, como por esse mundo fora, a internet tem permitido a expressão a grupos da sociedade que antes não se manifestavam porque não tinham acesso aos média. Hoje esse público tem. Muito dele é mal informado e reage algo instintivamente na defesa de valores que para si são básicos. Defende-os com unhas e dentes e não está disposto a entrar no tradicional diálogo que termina com um entendimento (em inglês, “compromisse”) em que cada parte cede um pouco. Assim, os campos extremam-se e são dois universos irreconciliáveis que têm depois nos seus porta-vozes (no caso, Donald Trump and Hillary Clinton) a expressão do seu sentir e pensar. Mas ambos os flancos apenas repetem sucessivamente os seus pontos de vista e desferem os mesmos ataques.

São, portanto, duas Américas, cada qual a puxar para o seu lado. Quem seguiu a campanha eleitoral sabe bem que a América de Trump é uma América “bully”, isto é, de instintos viscerais, de regresso a valores do capitalismo mais selvático, que é o que Trump tem praticado na sua vida profissional.

Clinton pertence obviamente a uma América mais preocupada com as questões sociais, mas integra-se também numa grande tradição de diálogo e cooperação política, como o seu marido, Bill Clinton, deixou bem claro nos seus oito anos de Presidente, e como Hillary tem feito nos seus 30 anos de serviço público.

Como é que o meio académico em que trabalha acompanhou esta campanha? Tem gerado debate no meio académico?

O meio académico tende a ser liberal, pelo menos o da maioria das melhores universidades. Os jovens apaixonaram-se por Bernie Sanders, como os de há oito anos se haviam apaixonado por Obama. Custou-lhes dar a volta quando perderam a nomeação do Partido Democrata, mas acabaram por apoiar Hillary Clinton, depois de tanto a terem atacado – por isso o fazem sem grande entusiasmo. As sondagens aqui na Brown anunciadas há dias davam uma percentagem muito diminuta a Trump (Hillary 85% e Trump 1,8%). Claro que as universidades (e sobretudo as universidades privadas da Costa Leste) estão longe de ser representativas da população do país.

Qual é o candidato que a comunidade portuguesa mais quer ver como futuro Presidente?

Antigamente falava habitualmente da comunidade portuguesa como tradicionalmente democrata. Hoje não disponho de números, mas algo tem mudado muito nos últimos anos. Não direi que a comunidade vota Trump pois, como disse, não disponho de dados que me permitam afirmar isso. Todavia, tenho muitos sinais de uma significativa deserção do campo democrata que explico por razões morais: o aborto, o casamento homossexual e mesmo a política emigratória. Gostava sinceramente de obter dados sobre este fenómeno social que considero significativo e merecedor de análise e ponderação. A comunidade não se exterioriza muito em matéria de política, ao contrário do que acontece em matéria de religião. Só amanhã [terça-feira] é que veremos a sua capacidade de mobilização, quando soubermos quantos fizeram questão de ir votar.

No quadro do cenário pós-eleitoral, o que será a América com Trump e o que será a América com Hillary?

Só posso vaticinar no caso da vitória de Hillary Clinton. Os Clinton têm uma excelente e antiga relação com Portugal. Se Trump ganhar (em inglês diz-se “God forbid!!!”), o futuro é uma incógnita. E quem disser o contrário deve estar a sonhar.

Qual o futuro Presidente que melhor serve para o futuro das relações com Portugal e porquê?

Não posso comparar porque ninguém faz ideia de como se comportará Donald Trump se ganhar. Um homem que, de repente, acorda a alta madrugada e, sem ninguém à volta a refreá-lo, age segundo os seus instintos, que são como se viu nos debates na TV, não é pessoa previsível para ninguém, nem sequer para as bruxas.

Comentários
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  • Vasco Botelho de Sou
    08 nov, 2016 Constância 23:31
    E se Hillary ganhar? Belicista como é, a querer romper com os Russos, vai ser o quê? Uma certeza? Pobreza de espírito........
  • Jorge
    08 nov, 2016 Porto 21:42
    Se nao ganhar continua tudo igual, continua a corrupção
  • Otário cá da quinta
    08 nov, 2016 Coimbra 19:16
    Em todo o lado é a mesma estória ! QUANDO ALGUÉM VÊ QUE LHE ESTÁ A FUGIR ... A ABUNDANCIA DA PAPA, claro que tem de inventar tudo o que seja possível para cortar as asas ao adversário !

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