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Contestado pelos seus próprios bispos, patriarca melquita recusa resignar

26 out, 2016 - 08:26 • Filipe d'Avillez

O sínodo da Igreja melquita devia ter ocorrido em Junho, mas foi adiado por falta de quórum quando mais de metade dos bispos boicotou. “Estou ao serviço da Igreja, o futuro está nas mãos de Deus”, diz o patriarca.

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O patriarca da Igreja Greco-Católica Melquita não põe a hipótese de resignar, como estão a exigir alguns dos seus bispos.

Em declarações à Renascença, em Fátima, à margem de um encontro dos bispos católicos de rito oriental da Europa, organizado pelo Conselho das Conferências Episcopais da Europa, em que participou como convidado especial, Gregório III desdramatiza a situação e recorda que de acordo com o direito canónico ninguém pode exigir que abandone o seu cargo.

“Eu sou pelo direito canónico, que diz que a Sede Patriarcal fica vaga após a morte do patriarca, ou a sua resignação”, afirma.

A possibilidade de resignação não parece estar em cima da mesa: quando se lhe pergunta sobre o futuro, insiste que não está nas suas mãos. “Isso é com Deus. Não posso responder, porque não tenho esse poder. Digamos apenas que estou aqui ao serviço da Igreja e que o futuro está nas mãos de Deus."

Aos 12 bispos, de um total de 22, que em Junho passado subscreveram uma carta em que criticam a sua gestão da Igreja e pediram a sua resignação, o patriarca pede unidade. “Gosto de dizer aos meus bispos que os amo. Amemo-nos uns aos outros para podermos confessar, amar e servir a Igreja e torná-la um símbolo de testemunho do Senhor nesta situação trágica para todo o Médio Oriente cristão."

A rebelião de vários bispos de uma igreja oriental coloca um problema difícil de resolver. As igrejas orientais em comunhão com Roma funcionam num regime de autonomia. Os patriarcas e os bispos são eleitos pelos seus próprios sínodos e Roma já se recusou a intervir neste caso, recordando aos bispos queixosos que ninguém pode obrigar um Patriarca a resignar.

Mas a natureza sinodal das Igrejas orientais significa que se os sínodos – isto é, uma reunião de todos os bispos activos – não puderem reunir a Igreja fica sem capacidade de tomar decisões de nível global.

Uma questão de temperamento

São várias as críticas feitas pelos bispos rebeldes, incluindo de esbanjamento de fundos, mas fontes próximas da realidade cristã no Médio Oriente dizem à Renascença que o que está em causa é, acima de tudo, uma questão de temperamento.

O patriarca é um trabalhador incansável – aos 82 anos dispensou o almoço para poder atender quem queria falar com ele, incluindo a Renascença, dizendo apenas que havia demasiado para fazer – e de temperamento por vezes fogoso. Forte defensor da autonomia das igrejas orientais em relação a Roma, os seus bispos consideram que tem pouca sensibilidade para ouvir outras vozes internamente, contradizendo assim a noção tão importante da sinodalidade.

Mas a situação de Gregório III é também sinal da desunião dos cristãos no Médio Oriente. Divididos entre diversas igrejas, algumas católicas, outras ortodoxas, os cristãos raramente falam a uma só voz e há profundas divergências entre os bispos e patriarcas sobre o que fazer perante a instabilidade da região, com alguns a defender o direito dos cristãos se defenderem pelas armas e outros a negar qualquer recurso à violência.

Gregório III pertence a uma geração que defendia a identidade árabe dos cristãos do Médio Oriente e que contrasta com correntes de opinião actuais, e muito fortes sobretudo entre comunidades da diáspora, que realçam a identidade distinta dos cristãos. Na maioria, os cristãos do Médio Oriente são de uma etnia específica, conhecida como assíria, caldeia ou siríaca, conforme as diferentes igrejas a que pertencem, que antecede por vários séculos a chegada dos árabes e do islão.

A Igreja Greco-Católica Melquita tem cerca de 1,6 milhões de membros, concentrados sobretudo na Síria e no Líbano, com outras comunidades espalhadas pelo mundo. Foi eleito em 2000 depois de o seu antecessor ter resignado por motivos de saúde.

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