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Eurodeputado português tem choque de realidade às portas da Síria. "O mundo assiste impávido e sereno"

11 fev, 2016 - 23:07 • Catarina Santos (Fotos Parlamento Europeu)

José Manuel Fernandes esteve esta semana a 80 quilómetros da fronteira síria, numa visita de duas delegações do Parlamento Europeu à Turquia, e regressou com "uma sensação de impotência". O que descreve, acabado de aterrar em Lisboa, é "uma emergência que se agudiza todos os dias".

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Terminaram esta quinta-feira quatro dias intensos para duas delegações do Parlamento Europeu, que foram à Turquia ver de perto como se faz o acolhimento aos refugiados.

Em conversa com a Renascença, acabado de regressar a Lisboa, o eurodeputado do PSD José Manuel Fernandes recorda a parte da agenda mais "perturbadora": a passagem pelo campo de refugiados de Osmaniye, na região de Gaziantep, que alberga 9.500 refugiados distribuídos por duas mil tendas. "Obriga-nos a pensar sobre os próprios objectivos que temos para a vida, a sorte que temos em estar na União Europeia e em Portugal, a paz, que nem sempre valorizamos", afirma.

Mas o que mais chocou o co-relator do orçamento da União Europeia (UE) para 2016 foram os ecos que lhe chegavam do outro lado da fronteira. A cidade síria de Alepo, que está debaixo de fogo de forças governamentais sírias e russas e na iminência de ficar cercada, fica a pouco mais de 200 quilómetros do campo de Osmaniye.

"Há sírios em Alepo que estão a ser bombardeados de todos os lados, há uma série deles que estão a querer entrar e estão junto às fronteiras turcas". São já mais de 50 mil que se acumulam do outro lado da fronteira, mas, apesar dos vários apelos da comunidade internacional, o Governo de Ancara tem mantido as portas fechadas.

Das reuniões que a comitiva manteve com membros do Governo turco, embaixadores e as principais organizações não-governamentais (ONG) na Turquia, José Manuel Fernandes regressou com a sensação de que "neste momento não há nenhum plano para abrir as fronteiras, [mas] há um plano para ajudar os 2,6 milhões de refugiados que estão na Turquia".

O eurodeputado recorda que "na Síria estão mais de 11 milhões de pessoas a viver em situações desumanas, na penúria, e vão tudo fazer para dali sair". Admite que "face aos bombardeamentos russos, a situação vai-se agravar."

Quatro dias longe do edifícios espelhados do Parlamento Europeu deram-lhe uma noção que nenhum relatório pode reproduzir. "A urgência que eu constatei e que não tinha interiorizado são aqueles milhões que ainda estão do lado da Síria, a viver em situações de penúria e em muito maior dificuldade do que aqueles que estão do lado da Turquia, e esses não me saíram do pensamento."

O eurodeputado social-democrata lamenta ver "a comunidade internacional a assistir a isto impávida e serena". Sustenta que "a UE procura minimizar as consequências, mas é urgente ir às causas e acabar com a guerra da Síria", admitindo, contudo, que o problema não é de solução fácil, dada a complexidade de forças e "interesses" em jogo.

Mais de 900 crianças nasceram no campo de refugiados de Osmaniye desde 2012
Mais de 900 crianças nasceram no campo de refugiados de Osmaniye desde 2012
Eurodeputado José Manuel Fernandes ouviu relatos de gente com esperança de regressar à Síria
Eurodeputado José Manuel Fernandes ouviu relatos de gente com esperança de regressar à Síria
Vivem 9.500 refugiados no campo de Osmaniye, distribuídos por 2 mil tendas
Vivem 9.500 refugiados no campo de Osmaniye, distribuídos por 2 mil tendas
Osmaniye fica a cerca de 80 km da fronteira com a Síria
Osmaniye fica a cerca de 80 km da fronteira com a Síria
Na Turquia estão, neste momento, mais de 2,5 milhões de refugiados
Na Turquia estão, neste momento, mais de 2,5 milhões de refugiados
Apenas 10% estão em campos de refugiados. Os restantes estão espalhados por comunidades e por vezes são em maior número que a população local
Apenas 10% estão em campos de refugiados. Os restantes estão espalhados por comunidades e por vezes são em maior número que a população local
Eurodeputado do PSD visita uma das 15 pequenas lojas do campo. Ao centro está o presidente do comité de orçamentos do Parlamento Europeu, Jean Arthuis
Eurodeputado do PSD visita uma das 15 pequenas lojas do campo. Ao centro está o presidente do comité de orçamentos do Parlamento Europeu, Jean Arthuis

O risco de "uma geração completamente perdida"

Integraram a visita de quatro dias duas delegações do Parlamento Europeu - a comissão de liberdades civis e a dos orçamentos, à qual José Manuel Fernandes pertence. Esta última queria verificar especificamente "como estão a ser aplicados os fundos [europeus] que têm sido dados em termos de ajuda humanitária" e perceber como se pode "melhorar a coordenação face ao número de entidades que estão no terreno".

O eurodeputado português, coordenador do Partido Popular Europeu (PPE) na comissão dos orçamentos, reconhece o esforço feito pelo país até ao momento. "A União Europeia disponibilizou-se para ajudar [a Turquia] com 3 mil milhões de euros para os refugiados. O montante parece exagerado, mas nós temos que perceber o esforço que a Turquia já tem feito. Já investiu mais de 7 mil milhões de euros " na recepção de sírios.

Na passagem pelo campo de Osmaniye, a delegação conheceu várias famílias que estão ali desde 2012. "Encontrei médicos, veterinários, professores universitários, que o que querem é regressar. Na Síria estavam bem e tinham tudo. É evidente que em cada uma daquelas pessoas vemos os nossos filhos, a nossa esposa, a nossa família…".

Desde 2012, já nasceram mais de 900 crianças e morreram mais de 140 pessoas naquele campo. Em toda a Turquia, onde estão neste momento mais de 2,5 milhões de refugiados, nasceram mais de 150 mil crianças desde o início do conflito. "É necessário construir escolas, porque se não apostarmos na educação daquelas crianças o desastre será ainda maior e teremos uma geração completamente perdida. Há 300 mil crianças sírias nas escolas com professores sírios, mas há 500 mil que não estão".

"Temos a obrigação de ajudar e é uma situação que convoca toda a humanidade", remata o eurodeputado.

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  • JP
    15 fev, 2016 Lisboa 13:54
    Só podia ser um deputado do PSD. Sobre este assunto era bom o sr deputado questionar o seu correligionário DURÃO.
  • TONI
    13 fev, 2016 Lx 10:11
    O ZEZE nunca reparou que os terroristas usam todos espingardas kalashnikov? Foram vendidas pelo Ocidente? Deixe-se de tretas e não culpe o dono da loja pelo terrorismo. Senão qualquer dia o Belmiro vai preso por vender as facas no supermercado que algum criminoso usou.
  • Luis
    12 fev, 2016 Lisboa 19:58
    Este Eurodeputado tarde e a más horas conheceu a realidade da Siria e viu-a com os seu próprios olhos. O Eurodeputado Nuno Melo do CDS TT (tt=tuc tuc) por falta de tempo ainda nem sequer conseguiu saber onde fica a Siria. Tudo porque apesar de ser um inutilzinho não deixa de ser um inultizinho muito ocupado.
  • Zé Zé
    12 fev, 2016 Sintra 03:38
    Não seria muito melhor desmascarar, condenar, castigar e impedir quem vende as armas que mantém este conflito anos a fio, ou seja quem arma os terroristas? Muitos países ocidentais são responsáveis e derramam lágrimas de crocodilo. Agora até já condenam quem combate o terrorismo.
  • marman...
    12 fev, 2016 ca 01:21
  • José Seco
    11 fev, 2016 Lisboa 23:47
    Saíram dos gabinetes?
  • 11 fev, 2016 23:41
    é triste viver assim. mas se actualizarem um pouco, irão ver
  • emaria
    11 fev, 2016 porto 23:36
    o papalvo não sabia? por onde andou? percebe-se o incómodo porque a rússia fez o serviço e vai cobrar. a renascença, sonsa, deu à estampa a ignorância. jornalismo de cruzeta

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