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Rui Tavares: Sem Estado de Direito UE deve ficar em pausa para Hungria e Polónia

14 jan, 2016 - 02:35 • José Pedro Frazão

Em entrevista à Renascença, o eurodeputado português afirma que a Europa tem de agir para travar deriva autoritária naqueles Estados-membros.

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A Europa tem o “direito e até o dever” de exigir que a Polónia e a Hungria respeitam o Estado de Direito e os direitos fundamentais dos cidadãos, defende o eurodeputado português Rui Tavares, em entrevista à Renascença.

O relator de um documento do Parlamento Europeu sobre as polémicas alterações à Constituição húngara, introduzidas em 2012, considera que os dois países de Leste em deriva autoritária devem ser chamados à razão pelos parceiros europeus.

Rui Tavares defende, por exemplo, que todos os assuntos que Hungria e Polónia “desejam tratar” com as instituições europeias fiquem em suspenso e congelados, até que aqueles Estados-membros garantam que vão respeitar as regras do Estado de Direito.

Para já, a Comissão Europeia decidiu avançar com uma avaliação preliminar para apurar se o governo polaco estará ou não a violar as regras da União Europeia sobre o Estado de direito.

Como vê esta decisão Bruxelas vai no caminho certo?

A União Europeia deve ser fundada em democracias e em Estados de Direito ou não poderá ter nenhum tipo de subsistência. O funcionamento do quotidiano da União Europeia depende do Estado de Direito. Se há estados que tiveram que o respeitar antes de entrar na União e se depois de entrar mudaram as constituições como no caso da Hungria ou da Polónia - onde se enche o Tribunal Constitucional de juízes favoráveis ao Governo, temos o risco desses países que dentro da União regressem à forma em que estavam antes, como estados autoritários.

É importante que a União Europeia tenha instrumentos para lidar com estes casos. Neste momento ainda não os tem. Este mecanismo agora desencadeado tinha sido proposto por um relatório de que fui autor sobre as violações de direitos fundamentais na Hungria, onde reconhecia que neste momento seria preciso desenvolver uma constitucionalização dos direitos fundamentais da União Europeia para a qual não temos um Tribunal Constitucional da União Europeia.

Este procedimento não poderá ficar apenas no plano simbólico? Na parte mais grave, este mecanismo carece de unanimidade.

Sim. Há duas hipóteses previstas nos tratados para tratar da degradação dos direitos fundamentais do estado – membro. Ou não se faz nada - e isso não é uma opção válida – ou segue-se o artigo 7 do Tratado da União Europeia que retira direitos de voto em caso de reiterada violação dos direitos humanos, que necessita de um voto unânime de todos os países menos o que é alvo do processo.

Já temos dois estados a deslizarem para um regime mais autoritário, de autoritarismo da maioria. A Hungria já disse que vetaria qualquer decisão de uso do artigo 7 contra a Polónia e a Polónia diz que fará o mesmo. Há duas opções que a União Europeia tem nos tratados: não fazer nada ou usar o artigo 7. Não fazer nada não dá em nada e usar o artigo 7 não é possível porque nunca teremos unanimidade enquanto a Polónia e a Hungria vetarem a utilização do artigo 7 uma para a outra.

O que pode então ser feito?

O que podemos fazer é criar legislação europeia que permita dizer aos Estados-membros que incorrem neste tipo de violação de direitos fundamentais que a prioridade nas relações entre o Estado-membro e a União Europeia é resolver os problemas de Estado de Direito e de direitos fundamentais.

Existe o direito e até o dever das instituições europeias, se interpretarem bem os tratados e esta necessidade de democracia na União Europeia, de dizerem neste momento à Hungria e à Polónia que tudo aquilo que desejam tratar no quotidiano com as instituições europeias tem que esperar até que se resolva uma coisa muito mais importante: a garantia de que o Estado de Direito e direitos fundamentais são respeitados naqueles países porque isso é proteger os cidadãos europeus, que são também polacos, húngaros como são portugueses ou espanhóis. A União Europeia pode agir.

Accionar este mecanismo é investigar o que se está a passar na Polónia, recolher opiniões de Supremos Tribunais de outros países europeus e construir um caso juridicamente muito válido. Temos que ter atenção a um princípio básico: quando defendemos o Estado de Direito, temos também que respeitá-lo. Ou seja, a União Europeia não pode agir perante a Hungria e a Polónia de uma forma arbitrária – apesar da opinião que tenho formada sobre o que se passa nesses países.

Porquê a Polónia e não também a Hungria a ser alvo deste procedimento?

Infelizmente a leitura disso não é bonita. O Governo húngaro pertence ao Partido Popular Europeu, que tem mais governos na União Europeia, como o anterior Governo PSD/CDS que, aliás, defenderam o senhor Viktor Orban várias vezes e até o convidaram a vir a Portugal.

O Governo polaco faz parte de um grupo político conservador com menos governos na União Europeia, portanto teve menos hipóteses de utilizar as suas redes de contacto para se defender.

Isto de facto demonstra que a União Europeia tem que mudar. Porque a defesa do Estado do Direito na Hungria, na Polónia ou em qualquer outro país não está dependente se um Governo é mais à esquerda ou à direita, se tem mais ou menos amigos.

Comentários
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  • Masial
    14 jan, 2016 Rio de Mouro 12:29
    Rui Tavares ainda é Eurodeputado?

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