A fraca subida dos salários
22-06-2018 - 06:18

Quando, como agora, os banqueiros centrais se preocupam com a lentidão na subida dos salários, é sinal de que algo grave está a acontecer.

Reunidos em Sintra, banqueiros centrais da UE, EUA, Austrália e Japão manifestaram preocupação pela lenta subida dos salários. Não me lembro de alguma vez uma preocupação destas ter sido por formulada por governadores de bancos centrais. Habitual, sim, era apelarem à moderação salarial, como ontem observou Sérgio Aníbal no “Público”. Temos de reconhecer que alguma coisa mudou no funcionamento das economias.

O capitalismo industrial tirou muitos milhões de trabalhadores do proletariado, transferindo-os para a classe média. Ainda antes da I Guerra Mundial, Henry Ford lançou o célebre modelo T, produzido em cadeia de montagem e por isso mais barato.

Dizia H. Ford que pretendia que os seus carros fossem acessíveis à compra pelos trabalhadores da sua empresa. A “democratização económica” foi significativa nos EUA, o que explica que ali, ao contrário do que aconteceu na Europa, o comunismo não tenha logrado afirmar-se como partido político.

Mas, a partir do último quartel do século passado, os salários dos trabalhadores dos países desenvolvidos entraram em quase estagnação – ou seja, uma subida, em média, de 1% por ano desde 2000, descontando a inflação.

Os salários mais baixos praticamente não subiram nos EUA entre 1979 e 2016, ao passo que os vencimentos dos gestores disparavam astronomicamente. As desigualdades de rendimentos acentuaram-se, claro, e tornaram-se hoje uma ameaça à coesão social. O governo japonês insiste há cinco anos com as empresas para que estas subam os salários, mas com fraco sucesso.

Portugal não foge a essa tendência perversa. O salário mensal (remuneração base média) dos trabalhadores por conta de outrem mais do que duplicou entre 1985 e 2000. Mas de 2002 a 2016 aumentou apenas 35%.

Recentemente, o desemprego tem diminuído, mas a maioria dos empregos criados pagam valores próximos do salário mínimo nacional. Por isso, aumenta a pobreza entre os empregados.

As causas destas disparidades de rendimentos serão várias. A globalização e os salários baixos pagos na China, por exemplo (mas que estão a subir a ritmo elevado, havendo investimentos a deslocalizar-se da China para o Vietname); as novas tecnologias, que favorecem os mais qualificados, enquanto a automação desemprega os trabalhadores manuais; o enfraquecimento dos sindicatos, num mundo onde a produção de bens e serviços se dispersa por múltiplos unidades (era mais fácil recrutar para o sindicato nas grandes empresas industriais, que funcionavam quase como quarteis), etc.

Seja como for, a verdade é que ainda não se encontrou um antídoto eficaz para o agravamento das desigualdades, o que não prenuncia um mundo mais justo e civilizado.