​O novo ciclo político
06-07-2017 - 06:39

O Governo cumpriu as metas de Bruxelas cortando no investimento e na despesa corrente. Em vez de reformar, debilitou o Estado.

Consta que terá acabado o “estado de graça” do primeiro-ministro. Talvez, mas as dificuldades que A. Costa passou a defrontar, incluindo o trágico incêndio florestal e o roubo de armas e munições em Tancos, têm boa parte das suas raízes na forma como o Governo conseguiu cumprir as metas de Bruxelas. Decerto que nem tudo se resume ao dinheiro, ou à falta dele. Mas algumas reduções na despesa pública estão a ter consequências indesejáveis.

O Governo eliminou cortes em salários da função pública e nas pensões. E foi reposto o horário das 35 horas semanais no Estado. As pessoas gostaram, claro. Mas era preciso compensar esses gastos. Daí os cortes drásticos na despesa do Estado, no investimento e na despesa corrente de muitos serviços públicas, com as célebres “cativações”.

“A maior responsabilidade em Tancos é do poder político, que tem desinvestido nas Forças Armadas”, disse à Renascença o major-general Raul Cunha, que já chefiou aquela base. Recentemente citei aqui o bastonário da Ordem dos Médicos, que apontou enormes faltas de pessoal médico, de enfermagem e de outros profissionais no Serviço Nacional de Saúde. E se insurgiu contra a imposição pelo Governo de um brutal corte no recurso a apoios externos por parte dos hospitais do Estado.

E há pouco mais de um mês reproduzi afirmações do Prof. Paulo Trigo Pereira, um independente integrado na bancada parlamentar do PS. São nomeadamente deste apoiante do Governo as seguintes palavras: “Houve nos últimos anos uma deterioração na qualidade dos serviços públicos. Os cortes na cultura foram significativos e os respectivos orçamentos são irrisórios. A função reguladora do Estado está diminuída, pelas carências de recursos humanos nas inspecções gerais. A investigação criminal está assoberbada e carenciada por falta de inspectores na Polícia Judiciária. Na saúde, para além das dívidas dos hospitais, há carência de anestesistas, sem os quais as listas de espera das cirurgias aumentam. Apesar de algum aumento nos médicos e pessoal de enfermagem em 2016, as carências são ainda manifestas”. Poderia acrescentar-se que existem auto-estradas com portagem (Aveiro-Vilar Formoso, por exemplo) cujo piso está degradado e perigosíssimo.

Mas então não é preciso reduzir a despesa pública? Claro que é, mas de maneira racional, introduzindo reformas no funcionamento de serviços públicos, poupando dinheiro dos contribuintes. O governo PSD/CDS não avançou na reforma do Estado. O actual executivo foge das reformas, que os seus apoiantes de extrema-esquerda detestam. O resultado está à vista.