Sanções à Rússia têm os dias contados
29-07-2016 - 23:44

Os comentadores do Fora da Caixa avaliam o peso da agricultura na União Europeia, atingida pelo embargo russo e fazem o ponto da situação das negociações do Tratado Transatlântico de Comércio.

O embargo russo a vários produtos alimentares custou 2,2 mil milhões de euros à Europa em apenas 12 meses. Poucas semanas após mais uma tranche extraordinária de apoio financeiro ao sector do leite europeu afectado pela decisão de Moscovo, os comentadores do programa "Fora da Caixa" admitem que o embargo russo é apenas um dos factores que pressionam a um entendimento que ponha fim às sanções decretadas pela União Europeia à Rússia no âmbito do conflito com a Ucrânia.

"As sanções à Rússia são uma decisão política. Têm a ver com a posição da União Europeia no mundo e a leitura que se faz da relação entre a União Europeia e a Rússia. Se há custos económicos dessa decisão política, é justo que o orçamento comunitário responda por esses custos instrumentais de uma decisão política que foi tomada. É natural que havendo retaliação - e toda a gente sabia que ia haver retaliações - que agora o orçamento comunitário responda perante aqueles que vão ser mais directamente prejudicados por essa retaliação", comenta o antigo comissário europeu António Vitorino.

Já Pedro Santana Lopes salienta que a pressão não é apenas económica mas também política. "A necessidade de um entendimento é cada vez maior. A Síria, a Turquia, o avanço do fundamentalismo islâmico, tudo força a um entendimento a curto prazo com a Rússia", observa o antigo primeiro-ministro.

TTIP sem acordo à vista

Os comentadores do programa "Fora da Caixa" analisaram ainda o peso da agricultura na União Europeia e no seu orçamento. António Vitorino reconhece que os produtos mediterrâneos não são tão beneficiados na Política Agrícola Comum como as produções do Norte da Europa.

"Esse é um desequilíbrio interno na PAC, no que diz respeito às Organizações Comuns de Mercado. Por isso, Portugal tem que aproveitar as oportunidades do Desenvolvimento Rural e jogar menos nas OCM. Apesar de tudo, na última reforma da PAC, o azeite, que é hoje uma história de sucesso na nossa agricultura, foi bastante beneficiado. E os incentivos à produção do azeite são uma consequência da reforma da PAC. Não existiam antes. Se me falar dos cereais, provavelmente o português não será exactamente o de melhor qualidade. E nós não podemos pedir que a PAC responda às deficiências da nossa própria agricultura", analisa Vitorino.

A compatibilização da agricultura europeia com a concorrência americana, via tratado transatlântico de comércio, não é ainda um problema, argumenta António Vitorino.

"O problema fundamental é o âmbito do acordo. Se tem ou não os serviços financeiros, é um ponto muito importante. Há a questão dos padrões técnicos serem mutuamente reconhecidos, por exemplo, na indústria automóvel, nos químicos, ou nos organismos geneticamente modificados. Aí estão os problemas mais difíceis", diagnostica o antigo comissário europeu, que agora "tem mesmo a certeza" que não há tempo para fechar o acordo durante a Presidência Obama.

As dificuldades aumentaram no plano político com a fractura exposta na coligação alemã sobre o tratado. O SPD - partido social-democrata alemão - é agora contra o tratado.

"Os acontecimentos mais recentes aumentaram a dificuldade no sucesso nas negociações. Não há condições para fechar o acordo a curto prazo. Nem sei se na próxima administração americana…. Do ponto de vista da ligação entre o ambiente político e as negociações técnicas, obviamente que as coisas pioraram nos últimos meses", concorda Santana Lopes.

António Vitorino defende CPLP com mais segurança e defesa

A cumprir o vigésimo aniversário, os desafios da Comunidade de Países de Língua Portuguesa são analisados por Pedro Santana Lopes e António Vitorino, que abordam a relação entre a União Europeia e o continente africano.

O antigo ministro da Defesa António Vitorino sai em defesa de um reforço da capacidade militar da Comunidade de Países de Língua Portuguesa, que está a cumprir vinte anos de existência. O antigo comissário europeu defendeu que a CPLP tem espaço para desenvolver uma componente de segurança e de defesa muito mais eficaz do que tem feito até aqui.

"Nos últimos 20 anos não aconteceu isso porque há sempre um parceiro relutante. O Brasil tem sempre uma visão muito particular destas matérias. Em segundo lugar há um grande desequilíbrio na capacidade militar dos vários países da CPLP", analisa Vitorino, para quem a identidade de um grupo de países passa não só pela cultura e pela economia como pelo papel que podem ter nas instâncias internacionais, incluindo as de segurança.

Um afastamento sem sentido

A relação entre a Europa e África tem sido oscilante no período pós-colonial. António Vitorino reconhece que o continente africano é hoje menos importante para a Europa do que há 10 ou 15 anos. "E contudo, a evidência vai no sentido contrário. As migrações vêm sobretudo de África. O Norte de África está em convulsão com uma ditadura militar no Egipto e a Líbia desfeita e toda a zona é uma preocupação para a União Europeia. E contudo, África não está no topo das prioridades políticas europeias", complementa o antigo comissário europeu.

Há muito tempo que se diz que África é o continente do futuro. "Sim, mas está cada vez mais próximo", diz Santana Lopes para quem essa realidade está à vista em termos económicos com oportunidades para investidores e empresários. "Haverá cada vez mais condições apesar das dificuldades que todos os continentes têm", acrescenta o antigo primeiro-ministro para quem falta de atenção da Europa face a África "é um erro crasso de visão".