Multas para quem não der prioridade a grávidas e idosos resolvem casos em que falta "bom senso"
27-12-2016 - 15:30
 • Sérgio Costa

Grávidas, idosos, deficientes e pessoas com crianças de colo vão ter prioridade e há multas para quem não cumprir. À Renascença, a secretária de Estado para a Inclusão defende o carácter "clarificador" da legislação e a igualdade entre sector público e privado.

Está em vigor, a partir desta terça-feira, a nova lei do atendimento prioritário. As multas podem ir até mil euros.

A nova legislação prevê a obrigatoriedade de concessão de prioridade a grávidas, idosos, pessoas portadoras de deficiência e com crianças de colo para todas as entidades que prestem atendimento presencial. As regras passam a ser válidas também para entidades privadas.

Em entrevista à Renascença, a secretária de Estado para a Inclusão, Ana Sofia Antunes, defende a legislação sublinhando o seu carácter "clarificador" e o facto de as obrigações a que o sector público estava submetido passarem a valer para o privado.

Em que casos se aplica esta legislação?

Aplica-se, genericamente, a todos os serviços, encontrando-se apenas excepcionadas as situações elencadas na lei, situações em que a prioridade é definida de acordo com outro tipo de regras, como é o caso das urgências hospitalares, por exemplo, em que a regra que define o atendimento prioritário é uma regra médica, de emergência de atendimento. Também não se aplicará nas situações em que existe marcação prévia ou em situações pontuais que se podem verificar junto dos registos e notariados em que a procedência pode implicar a aquisição de direitos.

Olhemos para casos específicos, por exemplo, o caso das grávidas. No caso de uma grávida de três meses, numa fase em que não é visível ainda a barriga, como se prova que a pessoa está grávida?

Com um comprovativo médico. As situações são visíveis quando são visíveis e, aí, tornam-se inquestionáveis. Quando não são visíveis, têm que ser comprovadas. É como, por exemplo, a deficiência, que pode ser absolutamente visível e inquestionável, mas também pode não o ser. Por exemplo, pessoas com muito baixa visão, mas que não são completamente cegas ou pessoas que tenham diminuição intelectual e não tenham nenhum tipo de afectação física. Nesses casos, as pessoas devem comprovar a sua situação com o atestado de incapacidade.

Imaginemos uma fila para aquisição de bilhetes para um espectáculo muito concorrido e com os ingressos prestes a esgotar. Um idoso ou um portador de deficiência passa à frente de quem chegou primeiro?

Obviamente. A lei é aplicável ao sector público e a todo o sector privado. As excepções são as que se encontram expressamente elencadas na lei. Para além dessas situações, todas as demais obrigam a atendimento prioritário. Obviamente que isto passa também pelo bom senso de cada um. A pessoa pode não exercer o direito à prioridade, mas que tem direito tem.

Todas as pessoas com mais de 65 anos têm direito a atendimento prioritário?

Não. O que a lei define - e de forma clara - é que não basta que a pessoa comprove que tem 65 ou mais anos. Nesse caso, tem que ter uma incapacidade física ou mental visível, portanto, inquestionável ao comum dos cidadãos. Não estamos a conferir prioridade a qualquer pessoa que tenha mais de 65 anos, porque, desse modo, estaríamos a estabelecer uma prioridade para uma grande parte da população, mas apenas para as situações em que as pessoas sentem desconforto e são prejudicadas pelo facto de ficarem em pé longos períodos de tempo.

Porque é que o Governo entendeu legislar sobre esta matéria? Haverá uma generalizada falta de bom senso entre os portugueses? Porquê legislar e ter força de lei aquilo que por muitos é visto como bom senso?

A razão é exactamente essa. Esta é uma situação que é vista como bom senso e o bom senso como se costuma dizer é algo como o oxigénio ou o ar que respiramos: só sentimos a falta dele quando de facto não está lá.

Obviamente que, nestas situações, pelo incumpridor paga o cumpridor, e temos muitas pessoas que têm, efectivamente, esse bom senso. Mas também temos muitas situações em que isto não se verifica. Convém que haja uma clarificação legal destes regimes.

Além do mais, tínhamos uma situação dúbia, que era o facto de estas prioridades estarem legisladas e reconhecidas para atendimentos no sector público, mas não para o sector privado. Aquelas situações de filas prioritárias que encontrámos, por exemplo, em muitos hipermercados existem porque as superfícies entendiam por bem criá-las para melhor gerir as situações de atendimento, não que fossem obrigadas a tanto. A partir deste momento, a situação é clara e não passaremos pelo constrangimento de ver pessoas a evocar direitos de prioridade que, em muitas situações, legalmente não tinham.

Quem não cumprir a lei está sujeito a uma multa. Quem paga a multa? Quem não cede lugar ou a entidade que não permite que, de facto, a prioridade seja concedida?

A multa será sempre aplicável à entidade que não conceder essa mesma prioridade, porque, mesmo que haja alguém na fila que não queira ou que não esteja disposta a conceder essa mesma prioridade, compete sempre à entidade que está a fazer o atendimento fazer impor esse atendimento prioritário, ainda que possa haver pessoas na fila que não concordem com o mesmo.

Se alguém se sentir lesado, poderá fazer queixa junto da própria entidade ou há outros mecanismos para fazer essa reclamação?

Deverá, prioritariamente, fazer essa reclamação às autoridades e resolver a situação no local, mas deverá sempre apresentar a sua reclamação superiormente, não apenas junto do Instituto Nacional para a Reabilitação, que é a entidade que transversalmente tem competência para encaminhar este tipo de processos de contra-ordenação por não cumprimento do atendimento prioritário, mas também poderá sempre fazer seguir a reclamação para a entidade fiscalizadora, a entidade reguladora do sector de actividade em concreto. Por exemplo, num restaurante, seria a ASAE.