Doze anos depois, o Pavilhão Carlos Lopes e os lisboetas fazem as pazes
17-02-2017 - 10:00
 • Dina Soares , Joana Bourgard (fotos)

Recuperação da sala histórica da música, do desporto e da política em Portugal envolveu um "resgate" de azulejos na Feira da Ladra. A Renascença esteve no pavilhão antes da reabertura, marcada para sábado.

O barulho das obras antecede a visão da fachada, já totalmente renovada, do Pavilhão Carlos Lopes. Em cima da reabertura, dezenas de trabalhadores afadigam-se nos últimos detalhes de uma obra de recuperação começada há mais de um ano. O grande dia é sábado, dia em que o campeão olímpico da maratona que deu nome à sala celebra 70 anos de vida.

O objectivo é apagar todos os sinais de degradação e vandalismo acumulados desde 2003, quando o pavilhão mítico da história dos espectáculos em Lisboa foi encerrado por falta de condições de segurança.

Nascido em Portugal, o edifício projectado pelos arquitectos Guilherme e Carlos Rebello de Andrade e Alfredo Assunção Santos “emigrou” para o Rio de Janeiro em 1923 para albergar o Pavilhão de Portugal na Exposição Internacional do Rio de Janeiro.

“O esqueleto em ferro e os demais elementos susceptíveis de larga duração permitem que sem avarias os pavilhões, finda a exposição, se possam desarmar e utilizar em qualquer outro local”, revelava a imprensa da época. E assim aconteceu.

Em 1929, o edifício é desmontado, embarcado e atravessa o Oceano Atlântico, de regresso a Lisboa. Passa, então, a Pavilhão das Indústrias, primeiro, e a Pavilhão dos Desportos nos anos 1940, a seguir à II Guerra Mundial. Em 1984, seria de novo rebaptizado com o nome de Carlos Lopes.

O director-geral do Turismo de Lisboa, Vítor Costa, diz que toda a estrutura estava danificada, mas era a destruição dos elementos decorativos que mais chocava quem por ali passava.

Muitos azulejos foram salvos “in extremis” pela Polícia Judiciária que os encontrou à venda na Feira da Ladra. Os estuques tiveram que ser reconstruídos à mão.

“Há muito poucas pessoas a fazer este trabalho [nos estuques]. Teve que vir uma equipa de Viana do Castelo, que já está a trabalhar aqui há algum tempo. Aquele elemento decorativo, por exemplo, devia ter pétalas dos dois lados, mas só tinha de um. Eles tiveram que reproduzir e completar. É um trabalho muito minucioso”, afirma.

Entre a tradição e a modernidade

As zonas nobres do pavilhão, tal como o exterior, foram devolvidas ao requinte original. Já a grande sala de eventos, com 2 mil metros quadrados, perdeu as bancadas de madeira e foi totalmente modernizada.

O director-geral do Turismo de Lisboa reconhece que, sem as verbas do Casino, teria sido difícil levar a cabo esta obra. O investimento total foi de oito milhões de euros.

"Cerca de metade do custo foi financiado pelas contrapartidas iniciais do Casino de Lisboa e o resto são fundos da Associação de Turismo de Lisboa. Também comprámos à câmara o direito de superfície”, explica Vítor Costa.

A tradicional e íngreme subida pelo Parque Eduardo VII até à entrada do pavilhão é que vai desaparecer. Com as obras, o Carlos Lopes ganha novos acessos: uma escadaria directa para o centro do parque e uma escada rolante na fachada que dá para a Avenida Sidónio Pais.

A partir deste fim-de-semana, o pavilhão vai acolher uma exposição temporária sobre o turismo em Lisboa nos últimos 20 anos e, no torreão norte, uma exposição permanente sobre Carlos Lopes com mais de 300 peças, entre troféus e equipamentos.

O resto do espaço fica disponível para tudo: espectáculos, iniciativas desportivas, comícios partidários, jantares.

É o regresso à tradição de um pavilhão já acolheu, ao longo dos seus quase 100 anos de vida, eventos que fizeram história. Alguns exemplos: no campo desportivo, o campeonato do mundo de hóquei em patins de 1947, em que Portugal se consagrou campeão; na música, os concertos memoráveis de Pete Seeger e Van Morrison; e na política, o primeiro congresso do PPD, o primeiro comício do Bloco de Esquerda e a primeira grande reunião do movimento pró-divórcio, logo a seguir ao 25 de Abril.