O escândalo da Pensilvânia
20-08-2018 - 06:18

Mais de 300 padres abusaram de menores ao longo de 70 anos na Pensilvânia. Não menos chocante, esses crimes foram encobertos pela Igreja Católica ao longo de décadas.

“Já houve outros relatórios sobre abusos sexuais dentro da Igreja Católica. Mas nunca nesta escala.” Estas palavras constam de um relatório elaborado por um grupo de jurados (o chamado “grande júri”), por solicitação da procuradoria-geral da Pensilvânia, nos EUA.

Os jurados investigaram durante dois anos seis das oito dioceses do estado da Pensilvânia, concluindo que mais de 300 padres abusaram de menores ao longo de 70 anos. Não menos chocante, esses crimes foram encobertos pela Igreja Católica ao longo de décadas; em alguns casos o silêncio das vítimas foi comprado.

O relatório saúda a boa colaboração prestada por um bispo local à investigação e reconhece que a atitude da Igreja mudou muito nos últimos 15 anos; agora, os crimes de pedofilia alvo de suspeitas de haverem sido cometidos por eclesiásticos são muito mais rapidamente reportados pela Igreja à polícia, escreve o “grande júri”.

Este caso, de dimensões preocupantes, bem como a retirada da condição de cardeal a um antigo arcebispo de Washington, McCarrick, hoje com 88 anos (não se via uma decisão igual desde há quase cem anos), abalam a credibilidade da Igreja e a própria fé. O presidente da conferência episcopal dos EUA classificou de “catástrofe moral” o que estas notícias vieram revelar.

Veja-se o caso da Irlanda, onde o número de católicos, que era esmagador há décadas, baixou muito desde então, para o que contribuiu a revelação de numerosos casos de pedofilia cometidos por padres e encobertos pelos seus superiores, bem como de sistemáticas violações de direitos humanos de que foram vítimas centenas de raparigas em instituições dirigidas por freiras católicas.

O Papa Francisco visita a Irlanda nos próximos dias 25 e 26. O Arcebispo primaz da Irlanda, Eamon Martin, declarou que espera do Papa não apenas um pedido de desculpas, do tipo “lamento muito”, e que o Papa deveria encontrar-se em Dublin com vítimas de abusos sexuais cometidos por membros do clero.

Para já, a reação do Vaticano ao relatório da Pensilvânia foi inequívoca: a Igreja sente vergonha e dor ao tomar conhecimento dos casos de pederastia praticados por sacerdotes, que considera criminosos. E fez saber que o Papa está do lado das vítimas.

Mas não me surpreenderia que o escândalo da Pensilvânia sirva de arma para atacar o Papa Francisco por aqueles que, dentro da própria Igreja, o combatem. E que entre esses críticos de Francisco por ainda não ter acabado com a pedofilia eclesiástica se encontrem alguns que, no passado, apoiaram o encobrimento dos crimes, para não prejudicar a imagem da Igreja.

O Papa enganou-se quanto a um prelado do Chile, que defendeu por deficiente informação. Mas depressa reconheceu o erro e agiu decididamente em relação ao problema chileno, como é sabido. Que o Papa Francisco continue a procurar que este cancro seja eliminado da Igreja, por muito que as revelações dos crimes e do seu encobrimento suscitem escândalo. Só a verdade liberta.