​​Quatro vencedores e três vencidos das eleições autárquicas
02-10-2017 - 03:42
 • Eunice Lourenço , Dina Soares

A noite teve triunfos absolutos, triunfos relativos, derrotas e hecatombes.

VENCEDORES

António Costa

Foi, finalmente, a vitória eleitoral de António Costa. O secretário-geral socialista, que chegou à liderança do partido por achar “poucochinha” uma vitória de António José Seguro nas europeias de 2014 e que não conseguiu ganhar as legislativas de 2015, conseguiu uma grande vitória eleitoral.

Costa ultrapassou aquele que tinha sido o maior resultado autárquico do PS e parecia difícil de igualar, quanto mais de ultrapassar.

O PS, como frisou Costa, teve mais votos, mais câmaras, mais mandatos. E até terminou a noite, já madrugada dentro, a tirar Almada ao PCP.

No seu discurso de vitória, o primeiro-ministro fez questão de fazer uma leitura nacional destes resultados, considerando que a vitória do PS reforça a mudança que tem sido levada a cabo no país no quadro da maioria parlamentar que apoia o Governo. Ou seja, este resultado legitima o seu Governo.

Contudo, este resultado é, acima de tudo, uma vitória do PS que – pelo que tem de derrota do PCP e do Bloco – tem de ser gerida com pinças se Costa quiser levar mesmo a legislatura até ao fim. Na noite eleitoral da Renascença, o secretário de Estado da Internacionalização, Eurico Brilhante Dias, avisou que será um “erro grave e trágico” o PS querer usar já este resultado nas negociações do Orçamento do Estado.

Assunção Cristas

Quem viesse de Marte e aterrasse na noite eleitoral portuguesa poderia julgar que Assunção Cristas tinha ganhado as eleições, tal era o seu contentamento. Ainda a noite estava no início (quando o Sporting-Porto acabou), já a líder do CDS tinha feito dois discursos e os outros líderes partidários nenhum.

O CDS ganhou apenas mais uma câmara do que já tinha, poderá mesmo ter descido em termos de resultado nacional (as comparações com 2013 não são muito fiáveis devido ao número de coligações com PSD), mas o resultado de Assunção Cristas em Lisboa dá-lhe não uma, mas duas vitórias: ultrapassou o PSD, quase duplicando a votação dos seus antigos parceiros de coligação, e emancipou-se definitivamente de Paulo Portas, quase triplicando a votação do antigo líder em 2001.

Cristas apostou em Lisboa e foi uma aposta ganha. E quer, claramente, potenciar o seu resultado em Lisboa para mudar o equilíbrio de forças com o PSD. Tentará aproveitar o actual momento social-democrata para crescer, como reconheceu Diogo Feio, o presidente do seu gabinete de estudos, na noite eleitoral da Renascença.

Isaltino Morais

Voltou e venceu com maioria absoluta. Isaltino Morais cumpriu a pena a que foi condenado, voltou ao sítio onde foi amado e reconquistou o lugar onde foi feliz e com maioria absoluta. Foi o único caso de sucesso entre aqueles ex-autarcas que, envolvidos também em casos polémicos, tentaram a mesma sorte, como Narciso Mirada e Valentim Loureiro.

O resultado de Oeiras – um dos concelhos mais desenvolvidos e com maiores níveis de escolaridade – é também uma derrota para o PS, que escolheu Joaquim Raposo, ex-presidente da Câmara de Amadora, que conseguiu apenas 13%. Em segundo lugar ficou Paulo Vistas, o actual presidente eleito há quatro anos em nome do movimento de Isaltino Morais e que foi, então, festejar a vitória para o portão da prisão da Carregueira onde o agora presidente cumpria pena.

Passados quatro anos tornaram-se adversários, trocaram acusações sobre o juiz que decidiu a admissibilidade das candidaturas e Vistas acabou por ser um caso raro de um presidente da câmara que perde o lugar.

Rui Moreira

Rui Moreira não se limitou a ganhar. Reforçou a vitória de 2013, conquistou a maioria absoluta e libertou-se da tutela dos partidos. Depois de ter posto termo, sem aviso prévio, ao acordo com o PS, deixou muito claro, logo no discurso de vitória, que agradecia o apoio “sem condições” que o CDS lhe deu nestas eleições.

A vitória não chegou, no entanto, para lhe adoçar o discurso. Criticou Manuel Pizarro pela “inusitada” presença de membros do governo na campanha. Apontou a dedo Rui Rio e Paulo Rangel por terem tentado usar o Porto como palco das “primárias secretas” do PSD. Não esqueceu sequer António Tavares, o provedor da Misericórdia do Porto.

A noite foi de festa, mas o discurso teve pouco de festivo.


OS VENCIDOS

Pedro Passos Coelho

A noite adivinhava-se má – os resultados de Lisboa e Porto prometiam ser desastrosos –, mas nem Passos Coelho esperava que fosse tão má. O PSD teve quase metade dos votos que o CDS teve em Lisboa. Mas o mesmo aconteceu na Covilhã. Foi tão mau que dois ex-líderes, Manuela Ferreira Leite e Marques Mendes, pediram a saída de Passos ainda a noite era uma criança. Ambos sabem bem do que falam porque outros já lhes fizeram o mesmo…

Passos Coelho tinha dito que não se demitiria em resultados de umas eleições locais. E manteve. Não se demite, mas admite não se recandidatar à liderança do PSD que, independentemente do resultado eleitoral, já tinha um processo de escolha interna na calha por razões estatutárias.

Como é habitual, só o próprio saberá o que vai fazer. Pedro Passos Coelho não partilha estados de alma. E não serão vagas de fundo a apelar para que fique que vão moldar a sua decisão. Talvez ainda lhe dê alento a lembrança da sua vitória eleitoral em 2015. Porque, como fez questão de recordar no discurso de derrota destas eleições, a liderança do PS – leia-se António Costa – ganhou com este resultado um alento maior, mas esta vitória não substitui a derrota que teve em 2015.

Jerónimo de Sousa

A noite parecia começar bem para a CDU. A perspectiva de igualar ou até ficar à frente do PSD em Lisboa parecia anunciar uma grande noite. Mas, depois, foram caindo câmara atrás de câmara e a noite terminou com a perda da mítica Almada. Das 34 câmaras que tinha, o PCP perdeu dez.

Jerónimo de Sousa tinha apostado nas autárquicas para ter mais peso nas negociações do orçamento do Estado e tinha todo um caderno de encargos que, na noite eleitoral, repetiu. Rita Rato disse, na Renascença, que este resultado eleitoral não retira nada do que o PCP quer para o Orçamento. Mas retira força ao PCP e pode acrescentar-lhe divisões internas que sacudam a maioria parlamentar de esquerda.

Catarina Martins

O Bloco de Esquerda não conseguiu quebrar maiorias absolutas. Não recuperou a autarquia de Salvaterra de Magos, não conquistou a de Torres Novas. Em Lisboa, elegeu apenas um vereador e não dois, como pretendia. Em termos nacionais, cresceu menos de 1% nos votos e ganhou apenas mais três mandatos do que há quatro anos.

A Catarina Martins resta a consolação de ter assistido à queda da direita e de ter resistido melhor do que a CDU aos estragos do sucesso socialista.