Ser ou não ser português? Partidos vão discutir lei da nacionalidade
03-02-2017 - 12:54

PSD já fez propostas para os netos dos emigrantes que nascem no estrangeiro e não são portugueses. BE defende que filhos de imigrantes nascidos em Portugal deveriam ter automaticamente nacionalidade portuguesa.

As propostas do PSD e do Bloco de Esquerda para alterar a Lei da Nacionalidade, debatidas na Assembleia da República, vão ser discutidas em sede de especialidade, baixando à comissão sem votação, disseram fontes parlamentares à Lusa.

A baixa das propostas à comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (primeira comissão) foi pedida pelas duas bancadas proponentes, durante o debate no parlamento, na quinta-feira.

Em causa está um projecto de lei do PSD que defende a atribuição da nacionalidade portuguesa aos netos de emigrantes nascidos no estrangeiro sem ser necessário comprovar a "efectiva ligação à comunidade" e uma iniciativa do Bloco de Esquerda que propõe que os filhos de estrangeiros nascidos em Portugal tenham automaticamente nacionalidade portuguesa.

Ambas as propostas mereceram críticas dos grupos parlamentares do PS, PCP e CDS-PP, apesar de, em alguns aspectos, haver abertura dos partidos para aprofundar o debate, que será agora feito na primeira comissão.

Fonte oficial do Ministério da Justiça adiantou à Lusa que "o Governo já concluiu a proposta de regulamentação" da lei, aprovada em 2015, e esta será agora sujeita a "audições das entidades envolvidas".

Quanto à proposta do PSD sobre os netos, o deputado Carlos Páscoa, eleito pelo círculo de fora da Europa, afirmou que os netos dos emigrantes é que "defendem Portugal e são verdadeiros embaixadores".

"A ministra da Justiça está há um ano com o projecto na gaveta e não o resolve. Isto é simplesmente para corrigir essa falha", disse, referindo-se à regulamentação, por fazer, da lei, aprovada em Maio de 2015 no parlamento.

Netos de emigrantes devem ser portugueses?

O antigo secretário de Estado das Comunidades Portuguesas José Cesário (PSD) alegou que a proposta social-democrata procura simplificar um processo que é "absolutamente dramático e desesperante, moroso e com extrema burocracia", além de ter custos elevados, no caso dos cônjuges de portugueses, e que, para os netos, a nacionalidade não deve ser "condicionada por obstáculos burocráticos incompreensíveis e dificilmente demonstráveis com objectividade, como a ligação ao território nacional".

Sobre a proposta relativa aos netos, o deputado do PCP António Filipe salientou estarem em causa "cidadãos que são portugueses, emigraram, tiveram filhos e não lhes atribuíram nacionalidade portuguesa, porque os pais preferiram atribuir-lhes outra nacionalidade e, agora que têm netos e que Portugal é um país da União Europeia, vem todo o patriotismo ao de cima".

Uma posição partilhada pelo CDS, com o deputado Telmo Correia a recordar que, quando a lei foi alterada em 2015, o Parlamento – sob proposta do PS – concordou na necessidade de que essa atribuição dependesse da demonstração da ligação a Portugal.

"O que poderíamos fazer era regulamentar a demonstração dessa efectiva ligação, pelo domínio da língua ou a visita ao território nacional", sustentou o deputado centrista.

Também o PS, pela voz de Pedro Delgado Alves, considerou que a lei da nacionalidade "não pode depender apenas da vontade pontual" e defendeu que a solução actualmente consagrada na lei é equilibrada.

Já quanto à dispensa de oposição do Ministério Público no caso de cônjuges de portugueses que queiram adquirir a nacionalidade – outra proposta do PSD –, os socialistas admitem aprofundar o debate, mas admitem dúvidas "quanto ao modelo" em que tal poderia ocorrer.

O CDS também aceita debater este ponto, apesar de considerar que não se trata de uma mudança importante.

Dar nacionalidade portuguesa a todos dos que aqui nasçam faz sentido?

O deputado do BE José Manuel Pureza afirmou que, "do outro lado do Atlântico, chegam sinais grotescos de um tempo em que a nacionalidade está a ser usada para privar cidadãos de direitos básicos e para produzir políticas de terror xenófobo" e a proposta bloquista quer que a nacionalidade portuguesa "exprima uma estima efectiva pela riqueza das sociedades plurais".

António Filipe admitiu que o princípio é "generoso", mas sustentou que "qualquer cidadão que nasça em Portugal, mesmo que por acidente, ter nacionalidade portuguesa originária, é ir longe de mais".

Pedro Delgado Alves avisou que a proposta pode "acarretar riscos significativos", originando "migrações impulsionadas pela vontade de nascer num determinado território".

Já o CDS recordou palavras do antigo ministro e deputado socialista Pedro Silva Pereira, que defendeu, no passado, que tal iniciativa seria "um convite à imigração ilegal e clandestina".

Quanto à proposta do Bloco para equiparar os custos dos processos aos dos pedidos de emissão do cartão do cidadão, o PS mostrou-se disponível para ponderar esta matéria.