Nós não somos Donald Trump
20-06-2017 - 06:48

Sabemos o que é o aquecimento global e queremos que tragédias como a de Pedrógão Grande não volte a acontecer. Como?

Uma primeira palavra de solidariedade, consternação e pêsame para com as vítimas da tragédia que assola o centro do país. Não há alegria com o défice ou o rating que resista ao poder destruidor do fogo. Mais uma vez o Presidente na linha da frente, sempre bem, sempre oportuno, entre o professor e o jornalista, o político e o crente, o jurista e o avô. O Governo, acudindo rapidamente, evitando o efeito May.

Mas temos muitas perguntas: como é que isto foi possível? Como é que uma coluna de veículos cheios de famílias foi deixada à sua sorte numa «zona de combate»?

Porque é que a bonomia dos políticos se aspergiu mais do que a acção dos efectivos destacados para ocorrer especializamente a este tipo de emergências?

Queremos saber: nós não somos Donald Trump, sabemos o que é o aquecimento global e as alterações climáticas, e há anos que vemos a floresta arder, o opiniómetro inundar o meio-dia das televisões e como as medidas efectivamente apontadas pelos especialistas de facto nunca foram postas em prática.

Agora, tarde demais, queremos saber, queremos ter a possível certeza humana de que nunca mais vai voltar a acontecer. Também queremos que os políticos ponham em “stand by” a culpabilização mútua sobre o acontecido e que mostrem a todos os portugueses que o voto vale alguma coisa, isto é, que exerçam o seu mandato como todos os anónimos que estão a contribuir para minorar as mágoas e as dores insuportáveis de quem vive a tragédia em primeira mão: com humildade, com paciência, com dedicação, com eficácia, com lucidez.

Queremos saber, com detalhe detectivesco, como opera a Protecção Civil, que orçamento gere, como o gasta e como orienta os seus profissionais e como põe em prática os planos de intervenção em catástrofes. Vamos lá, pois, ao que interessa.

E em matéria do que interessa também interessa questionar a civilidade da cobertura jornalística que mostra os corpos humanos calcinados com o maior dos despudores. E que venha o Sindicato dos Jornalistas pedir que haja sobriedade na cobertura jornalística evidencia que há decência entre os profissionais mas também mostra que as direcções dos meios de comunicação social não deveriam enviar amadores para cobrir notícias desta envergadura.

Queremos saber tudo. Uma vez que não podemos devolver a vida a quem a perdeu nem a paz a quem foi roubado dos seus, queremos que se ajude com celeridade e convicção a recompor vidas e que se faça justiça. Queremos que se apurem responsabilidades e se penalize quem se apurar merecer penalização. Queremos poder viver a nossa vida convencidos de que as instituições que devem cuidar de nós, efectivamente, cuidam e se antecipam à desgraça e à fatalidade, para oferecer à natureza a civilização e à estupidez humana a racionalidade e a educação.

A política é um serviço, os serviços de segurança devem poder servi-la com a plenitude de meios e de lideranças próprias de uma sociedade democrática, uma sociedade democrática deve centrar-se na protecção e no bem-estar dos mais fracos. Precisamos disso para nos recompor, para seguir em frente, para oferecer ao mundo um Portugal que é história, tradição, beleza, cultura, povo, inovação.