​Santana e Vitorino acreditam. Merkel está pressionada mas vai a jogo nas eleições
11-09-2016 - 12:54
 • José Pedro Frazão

Os comentadores do programa “Fora da Caixa” da Renascença comentam a derrota da chanceler alemã no seu circulo eleitoral. Analisam ainda a crise dos migrantes com novos resgates no Mediterrâneo, agora na faixa mais ocidental.

É uma das questões do momento na Alemanha. A possível recandidatura de Angela Merkel a uma quarto mandato em jogo nas eleições de 2017 alimenta o debate agora ainda mais quente depois da derrota da CDU - partido democrata-cristão alemão - nas eleições regionais no estado de Mecklenburg-Western Pommerania.

“Merkel vai recandidatar-se mas precisa de tempo para provar que tinha razão em relação aos refugiados”, afirma António Vitorino na Renascença. Santana Lopes acredita igualmente que a chanceler vai tentar mais um mandato em Berlim mas não tem certezas sobre o desfecho eleitoral. “ Ganhar? Não sei, não vai ser fácil. A Alemanha terá que continuar a ser governada por uma coligação seguramente, depois das próximas eleições. Estou para ver o que é o SPD vai fazer até lá”, declara o antigo primeiro-ministro.

Santana assinala que “os tempos não estão fáceis para quem governa". "São tempos de erosão para quem tem responsabilidades e nomeadamente na europa. Se virmos Merkel, Hollande, Renzi, qual deles é que atravessa bons tempos? É de admitir que a senhora Merkel possa não recuperar eleitoralmente até ao ano que vem”, diz.

Outro cenário ventilado nos últimos dias na Alemanha é uma possível candidatura de uma personalidade da congénere bávara CSU, mais conservadora que a CDU de Merkel. António Vitorino admite que há pelo menos um cenário em que essa hipótese pode ser beneficiada.

“Se Merkel achar que está cansada e amanhã decidir fazer outra coisa não se recandidatando, não há um candidato evidente. Não será uma escolha fácil dentro da CDU. Aí os bávaros podem ver de facto uma janela de oportunidade”, argumenta o antigo comissário europeu.

O medo ganha eleições

A CDU foi terceira nas regionais de Mecklenburg, atrás do vencedor SPD e sobretudo abaixo do partido de extrema-direita AFD - Alternativa para a Alemanha - num estado onde Merkel concorre para o parlamento nacional. Os analistas e até os próprios líderes políticos acreditam que a razão da derrota do partido de Merkel está na política de imigração da chanceler alemã.

António Vitorino assinala que hoje em dia, na Alemanha como noutros pontos da Europa, as eleições são ganhas por partidos anti-imigração sobretudo com fortes votações em zonas onde não há imigrantes.

“É mais o medo da imigração que o choque da imigração na realidade. No Mecklenburg é entre todos os estados alemães o que tem menos refugiados, menos imigrantes. Contudo o argumento do medo dos imigrantes foi decisivo nesta mudança de votos”, sublinha Vitorino, admitindo ainda assim que há “mais qualquer coisa” que explica estes resultados para além da questão da imigração. “Há problemas sociais muito sérios. Pessoas que se sentem marginalizadas pelo progresso, que sentem que o estado social já não lhes garante a protector que costumavam ter”, complementa Vitorino.

Noutro plano, o antigo comissário europeu observa que o partido AFD sobe à custa dos dois grandes partidos de poder na Alemanha, CDU e SPD, num movimento semelhante ao verificado noutros lugares do continente europeu.

“Em todos os países, os populistas não sobem apenas no seu campo clássico, esquerda-direita. Sobem à custa de todos. Isso revela que há uma tendência profunda nos eleitores europeus que são favoráveis a posições mais radicais sobretudo anti-imigração”, remata Vitorino.

Trágicos e explosivos

O fluxo migratório para a Europa pode estar a viver uma nova viragem, com a incerteza em relação ao acordo com a Turquia e um aumento das travessias no Mediterrâneo Ocidental, colocando pressão sobre a Itália.

“Essa subida não tem o nível do ano passado. Estamos falar de previsões de 300 mil chegadas para este ano, menos que um milhão do ano passado. Mas estes cálculos são altamente falíveis. Ninguém sabe porque estes movimentos são ingeríveis e imprevisíveis”, reconhece Vitorino, especialista em questões de imigração.

O militante do PS assinala ainda que a pressão extra sobre a Itália surge num quadro politico de tensão. “Há um referendo constitucional em Outubro cujo resultado pode levar à queda do Governo e a uma crise política em Itália”.

Quanto à Turquia , o processo é “quase explosivo”, diz Santana Lopes . “Erdogan não está com cara nada bem disposta e tem razões para isso. O senhor Putin é que está sempre sorridente…”

Outubro é o (novo) mês decisivo na relação entre Bruxelas e Ancara. “Se os nossos ouvintes nos continuarem a dar o privilégio de nos acompanharem, no mês que vem saberemos como é que isto vai evoluir em relação à Turquia. O prazo limite que existe para a facilitação da concessão de vistos para a Turquia é Outubro. É a contrapartida que os europeus têm que dar. Neste momento não há acordo na União Europeia e o Parlamento Europeu não está disposto a votar a liberalização dos vistos e portanto isso pode pôr em causa o acordo da Turquia e voltar a aumentar a pressão sobre o Mediterrâneo Oriental”, conclui Vitorino que remata o programa desta semana com humor em resposta a um novelo de problemas à vista na crise migratória.

“ Sejamos optimistas. Fiquei com a ideia, pela última visita do Presidente da República, de que nas Selvagens as coisas estão calmas”.