Tempo
|

Graça Franco

Porquê?

27 mar, 2015 • Graça Franco

O homem do século XXI continua a precisar de um sentido para a vida. E, perante o choque da notícia sobre o jovem piloto que terá procurado a morte arrastando consigo mais de uma centena de pessoas, a questão coloca-se ainda com maior actualidade em torno da pergunta sem resposta: porquê?

Na próxima semana, para muitos cristãos espalhados pelo mundo (do Paquistão ao Afeganistão, passando pelo Egipto, Irão, Iraque, Líbia, Nigéria, Arábia Saudita, Somália, Sudão, Síria, Iémen, Eritreia, Coreia do Norte, Azerbaijão e o Usbequistão e muitos mais), a simples presença nas cerimónias da Semana Santa acarretará o risco de martírio.

Esta sexta-feira, a Comissão Nacional Justiça e Paz (CNJP), no seu texto de alerta de preparação para a Páscoa, parafraseando os conhecidos versos de Sophia, "vemos ouvimos e lemos", recorda que não temos o direito de continuar a ignorar os irmãos perseguidos nem de deixar esquecer o grito do sangue destes novos mártires.

Paul Bathi, o médico paquistanês e activista da liberdade religiosa (irmão do ex-ministro das minorias religiosas, assassinado por ser cristão), traz, esta sexta-feira, esse grito a Lisboa, num testemunho corajoso feito na primeira pessoa. Vale a pena passar pelas 19h30 na grande tenda montada em Belém, Lisboa, só para o ouvir. Trata-se da iniciativa anual do Meeting Lisboa, lançada há alguns anos por um grupo de jovens cristãos apostados em trazer o debate sobre as questões da fé para o espaço público e que, este ano, deixará o habitual espaço no Campo Pequeno para o novo espaço do Centro Cultural de Belém.

Como refere o Papa Francisco, e bem recorda a CNJP, "o sangue dos nossos irmãos cristãos é um testemunho que grita". Cabe-nos não o deixar abafar. "Pouco importa que sejam católicos, ortodoxos, luteranos, coptas: são cristãos e o sangue é o mesmo, o sangue confessa Cristo".

Nada disto significa que nos desinteressemos das perseguições que sofrem outras religiões ou até pessoas sem religião. São sempre um atentado à dignidade humana. Mas é um facto que, hoje, os cristãos voltaram a ser o maior alvo da intolerância religiosa. Estranho recorde este, que parece evidenciar um retrocesso de séculos no direito à liberdade religiosa e se traduz na larga ultrapassagem do número de mártires cristãos alvo das violentas perseguições romanas pelos que já foram chacinados em virtude do seu testemunho de fé só nos últimos 15 anos.

É a esta situação que não podemos conformar-nos. Daí, a importância do apelo da CNJP a todas as pessoas de boa vontade e a todos os cristãos para que não ignorem os irmãos perseguidos e às autoridades políticas nacionais e internacionais para que "façam tudo o que está ao seu alcance, em ordem a pôr termo a esta situação". À comunicação social reserva-se um último apelo para que não remetamos à categoria de "não notícia" o registo dos repetidos massacres. Nada mais embrutecedor das consciências do que a indiferença que leva à banalização do mal.

O homem do século XXI continua a precisar de um sentido para a vida. E a religião constitui-se num importante reduto para a busca e encontro desse mesmo sentido. Algo que só pode acontecer num espaço de liberdade sem constrangimentos pessoais ou sociais. Nestes dias em que ainda nos perdemos no choque da notícia sobre um jovem piloto que terá aparentemente procurado a própria morte (arrastando consigo mais de uma centena de pessoas a bordo do avião que comandava), esta questão coloca-se ainda com maior actualidade em torno da pergunta sem resposta: porquê?

Também por isso vale a pena passar pelo Meeting: "Se a felicidade não existe, para que serve a vida?" É este o tema que estará em debate até domingo na tenda de Belém. E já sábado, pelas 21h30, na conferência sobre "A vida não é um prémio", três grandes premiados – Henrique Leitão (Prémio Pessoa 2015), Afonso Reias Cabral (Prémio Leya) e Elvira Fortunato (uma das cientistas mais laureadas em termos europeus) – darão certamente um triplo testemunho. Rigorosamente a não perder.