Emissão Renascença | Ouvir Online

Francisco Sarsfield Cabral

A democracia paradoxal

13 jul, 2015

Tsipras acrescentou algo paradoxal à história da democracia: propôs aos credores uma austeridade tão ou mais dura do aquela que ele próprio havia incitado o povo grego a rejeitar.

Ao longo de meses os simpatizantes portugueses do Syriza aplaudiram a coragem do governo grego na sua firme recusa de mais austeridade. E o referendo do passado dia 5 levou-os à euforia: seguindo os apelos de Tsipras, mais de 61% dos gregos votou contra as propostas dos credores. Uma lição de democracia, diziam, lembrando alguns que esta nascera na cidade-Estado de Atenas há 2 500 anos.

Depois Tsipras acrescentou algo paradoxal à história da democracia: propôs aos credores uma austeridade tão ou mais dura do aquela que ele próprio havia incitado o povo grego a rejeitar. Milhões de gregos ficaram perplexos e frustrados com a pirueta do seu primeiro-ministro. Os credores naturalmente desconfiaram: que credibilidade tem Tsipras para se acreditar que não renegará os seus compromissos?

O resultado é austeridade mais violenta ainda, porque a economia da Grécia começava a recuperar há meio ano e hoje está em recessão, graças ao governo de Tsipras. E sobretudo porque o governo grego se empenhou em insultar os credores, destruindo a necessária confiança. Hoje 85% dos alemães quer a Grécia fora do euro, quando há meio ano a maioria deles a queria dentro. As opiniões públicas contam em democracia.

Talvez se tenha evitado o pior, mas o futuro político da Grécia é incerto. E o euro mostrou as suas debilidades, difíceis de corrigir em tempos de eurocepticismo.