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Raquel Abecasis

O que fica nas entrelinhas

26 set, 2014

Colocando em primeiro lugar a demagogia fácil e perigosa, Seguro exigiu ao chefe de Governo que levante o sigilo bancário para esclarecer denúncias anónimas.

O país viveu agitado toda a semana com um caso que se chegou a especular poderia levar à demissão do primeiro-ministro.

Ao longo dos últimos dias, fomos invadidos por fac-simile de requerimentos assinados por Passos Coelho, notícias do desaparecimento de declarações de IRS e de denúncias anónimas a dizer que o actual primeiro-ministro teria recebido uma “pipa de massa” entre os anos de 95 e 99, tudo sem pagar impostos. Para cúmulo, no final do mandato no Parlamento, o agora chefe do Governo ainda teria pedido irregularmente um avultado subsídio de reintegração.

Por que é que Passos Coelho levou uma semana para esclarecer cabalmente as dúvidas e rejeitar as suspeitas que recaíram sobre si é um mistério que está ainda por esclarecer. Mas houve duas passagens da sua intervenção que podem explicar a demora: a dada altura o primeiro-ministro refere-se à possibilidade de surgirem ou terem surgido documentos falsos a sustentar as acusações; mais à frente, Passos Coelho diz que é o facto de ser “remediado” que lhe deu sempre a liberdade de não decidir em função de interesses.

O que é que quis dizer com isto? Será que estava a falar de alguém em particular? Ficou nas entrelinhas.

Mas o mais grave do debate de hoje foi a forma como o líder da oposição, num assunto tão grave como este - que afecta ou pode vir a afectar toda a classe política – não hesitou em colocar repetidamente em causa a veracidade do que o primeiro-ministro afirmou, como quem repreende o ladrão apanhado em flagrante.

Colocando em primeiro lugar a demagogia fácil e perigosa, exigiu ao chefe de Governo que levante o sigilo bancário para esclarecer denúncias anónimas que tinham acabado de ser esclarecidas.

António José Seguro afirma-se na política como um homem de palavra. Será que o líder da oposição acha que a demonstração desta manhã é digna de um homem de palavra? Será que Seguro tem consciência de que aquilo que pediu esta manha, nas circunstâncias em que o pediu, para além de ser mais uma machadada na credibilidade da nossa política, é uma violação das regras básicas de um Estado de direito, trate-se ou não do primeiro-ministro?

Ficou nas entrelinhas.