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José Luís Ramos Pinheiro

Justiça e confiança

10 set, 2014

Um sistema judicial que não olha a nomes para fazer justiça pode contribuir para recuperar a confiança.

Dizer que a Justiça condiciona fortemente o desenvolvimento do país tornou-se lugar comum. Mas, de facto, um sistema judicial incapaz de combinar a celeridade com as indispensáveis ponderação e segurança jurídicas, gera desconfiança e desmotiva potenciais investidores. A perspectiva de ver decisões empresariais bloqueadas e enredadas numa trama judicial anormalmente longa, condiciona fortemente opções de investimento.

E o mesmo sucede na vida empresarial corrente. O facto de uma qualquer acção judicial, ainda que não especialmente complexa, poder condicionar significativamente, anos a fio, a actividade empresarial constitui um factor negativo para empresários e mesmo para trabalhadores, cujos postos de trabalho possam até ficar – injustificadamente - em risco.

Dito de outro modo, uma Justiça ineficaz, lenta, prisioneira de um labirinto de garantias que garantem, sobretudo, o prolongamento artificial de processos, desencadeia efeitos sociais, económicos e políticos perversos.

Neste momento, em Portugal, há forte contestação ao novo mapa judiciário. Não conheço o assunto em profundidade. Mas, à primeira vista, parece haver um saudável propósito de racionalização dos tribunais. Porém, já quase ninguém discute a reforma, mas o modo – claramente desorganizado e caótico - como acabou por ser aplicada.

Em todo o caso, a Ordem dos Advogados, por exemplo, devia contribuir para outra serenidade na análise. Mais uma vez, o excesso de emoção no debate público obscurece a busca da verdade.

Em todo o caso, há sintomas positivos. Embora seja legítimo pensar que o caso BES devia ter sido atalhado há mais tempo, a verdade é que o regulador e o poder judicial não se atemorizaram com os nomes em presença. Por outro lado, a decisão do chamado processo da sucata em que até um ex-ministro é condenado a pena efectiva de prisão, demonstra que não houve medo de tomar decisões, independentemente do que venha a ser o resultado de eventuais recursos.

Um sistema judicial que não olha a nomes para fazer justiça pode contribuir para recuperar a confiança. Porque sem confiança na Justiça, a sociedade e a economia não avançam.