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Crónicas da América
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Nova Iorque não se intimidou com maior atentado após o 11 de Setembro

01 nov, 2017 - 08:55 • José Alberto Lemos, em Nova Iorque

Desde 2001 que Manhattan não via nada assim. Ataque terrorista “à europeia” matou oito pessoas e feriu onze. Mas na Noite das Bruxas, o tradicional Halloween, os nova-iorquinos vieram na mesma para a rua, desafiando a chantagem "jihadista".

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Cinco horas após o primeiro ataque terrorista a fazer vítimas desde o 11 de Setembro, Nova Iorque era uma cidade em festa.

Quem tivesse chegado à cidade e desconhecesse o ataque ocorrido durante a tarde, não suspeitaria de nada de anormal. O que testemunharia era um desfile de Halloween (Noite das Bruxas) idêntico ao dos outros anos, talvez com a diferença de um aparato policial ainda maior do que o habitual.

Indiferença pelos oito mortos no atentado da tarde? Talvez sim ou talvez não. O Halloween é uma tradição com raízes muito fortes na América, uma quadra em que cada um dá largas à imaginação com disfarces bem criativos que desafiam o fantasma da morte. E a noite de Halloween, de 31 de Outubro para 1 de Novembro é a véspera do Dia dos Mortos. Daí que a parada da Noite das Bruxas seja dominada por uma iconografia ligada à morte.

Ora, ver muitos milhares de pessoas na rua a desafiar o fantasma da morte justamente no dia em que a morte saiu à rua sob a forma de terrorismo acaba por ser uma afirmação de força e de coragem porventura mais poderosa do que ficar em casa a chorar os mortos.

E foi isso que se viu esta terça-feira à noite em Manhattan. Um desfile ruidoso, alegre, imaginativo, cheio de energia, que saiu de West Village, não muito longe do local do atentado terrorista, e percorreu um troço da Sexta Avenida e depois da Quinta com carros alegóricos em estilo carnavalesco, transportando cada um deles a sua tribo musical e reflectindo uma estética própria.

Houve quem defendesse o cancelamento da parada de Halloween e a observação do luto. Mas acabou por prevalecer o argumento de que isso seria fazer a vontade ao terrorismo, alterar os hábitos de vida, deixar-se intimidar. E se há algo de que os nova-iorquinos não gostam é de abdicar do seu estilo de vida frenético, ruidoso, extrovertido, social, na rua, sempre na rua.

Logo nas primeiras declarações públicas feitas cerca de 90 minutos após o ataque, quer o presidente da Câmara da cidade, Bill de Blasio, quer o governador do estado, Andrew Cuomo, sublinharam a resistência de Nova Iorque ao terrorismo após o 11 de Setembro de 2001. E proclamaram a sua certeza de que os cidadãos continuarão a demonstrar a sua coragem e o seu apego à democracia e à liberdade mantendo o seu estilo de vida de sempre.

Por isso, Cuomo e Blasio decidiram participar também no desfile do Halloween, disfarçados de si mesmos: governador e mayor de Nova Iorque, respectivamente.

Uzbeque fiel ao ISIS

Quem não tentou disfarçar os seus intentos foi o próprio terrorista. Sayfullo Saipov, 29 anos, proveniente do Uzbequistão, veio para os Estados Unidos em 2010, possuía autorização de residência permanente e casou no Ohio em 2013.

Alugou uma carrinha de caixa aberta (“pickup truck”) em Nova Jérsia algumas horas antes de rumar a Manhattan e entrar numa ciclovia junto ao rio Hudson, na baixa da cidade.

Atropelou indiscriminadamente peões e ciclistas, deixando oito vítimas mortais pelo caminho. Do local onde cometeu o crime, vê-se com nitidez, ali bem perto, a Torre da Liberdade, erguida no local onde estavam as Torres Gémeas derrubadas no 11 de Setembro.

Entre a tragédia desse longínquo ano de 2001, com os seus três mil mortos, e o atentado desta terça-feira, com os seus oito mortos, vai uma distância temporal e de escala que espelha bem o progresso que entretanto as democracias fizeram no combate ao terrorismo “jihadista”.

As medidas de segurança adoptadas tornaram hoje virtualmente impossível o uso de aviões comerciais ou outros meios de grande efeito letal para cometer actos terroristas.

Daí que o ISIS (Estado Islâmico) tenha incitado recentemente os seus simpatizantes a recorrer a quaisquer meios acessíveis para matar cidadãos inocentes: automóveis, camiões, facas, enfim qualquer meio que não suscite suspeita das autoridades policiais. Foi este o conselho seguido por Saipov, que inaugurou assim na América o tipo de atentado terrorista que tem sido mais frequente na Europa nos últimos tempos.

Num país onde toda a gente possui armas, Saipov nem uma pistola a sério arranjou e isso trouxe-lhe um problema adicional – ter sobrevivido ao atentado. Quando a carrinha que conduzia embateu num autocarro escolar e ele a abandonou, fê-lo com duas falsas armas na mão e começou a correr no meio da faixa de rodagem, expondo-se por completo. O objectivo era ser abatido pela polícia e cumprir até ao fim o padrão das missões suicidas jihadistas.

Mas o polícia que disparou sobre ele deixou-o apenas ferido e não morto. Pode ter sido uma casualidade, mas é uma casualidade bastante útil porque um terrorista morto não faz revelações, enquanto um vivo pode ser precioso para os investigadores. Ainda ele estava a ser operado ao ferimento no abdómen causado pela bala e já a polícia desvendava as suas duas moradas mais recentes — Flórida e Nova Jérsia. Um ponto de partida fundamental para apurar ligações familiares, de amizade ou de vizinhança, que permitirão reconstituir o seu percurso nos Estados Unidos e eventuais saídas ao estrangeiro.

Terrorismo em Nova Iorque. Carrinha faz pelo menos oito mortos e vários feridos
Terrorismo em Nova Iorque. Carrinha faz pelo menos oito mortos e vários feridos

Lobo solitário?

As primeiras informações e análises de especialistas apontavam para mais um “lobo solitário” que terá agido por conta própria e se terá radicalizado sozinho. Mas ainda é cedo para tirar tais conclusões. Do que já não restam dúvidas é da sua simpatia pela causa “jihadista”. Quando saiu da carrinha gritou mais do que uma vez “Alla Akbhar” (Deus é grande), o slogan “jihadista” por excelência. E junto do veículo deixou algumas notas manuscritas em que declarava a sua fidelidade ao ISIS.

Mero simpatizante ou militante treinado e com contactos com o grupo terrorista? Eis a dúvida maior que os investigadores agora terão de esclarecer. Para já, há indícios de que possa estar ligado a um grupo uzbeque que foi alvo de uma investigação conjunta do FBI, da polícia nova-iorquina e de um procurador de Brooklyn por ter fornecido suporte material ao ISIS.

A investigação decorreu nos últimos dois anos e acabou com acusações a cinco uzbeques e a um outro homem proveniente do Cazaquistão. Mas um porta-voz do FBI recusou-se a revelar se Saipov já era conhecido da agência ou se estava no radar das unidades policiais anti-terroristas.

Na galáxia “jihadista” internacional, militantes uzbeques, bem como outros oriundos de antigas repúblicas soviéticas, têm desempenhado um papel crescente, segundo os especialistas anti-terrorismo. Além de alguns terem engrossado as fileiras do ISIS na Síria e no Iraque, um grupo uzbeque teve em tempos em preparação um ataque à base militar americana de Ramstein, na Alemanha.

Recorde-se que o islamismo é a religião dominante em várias das antigas repúblicas soviéticas, pelo que os jihadistas as vêem como campo de recrutamento favorável.

Demagogia trumpista

Nos Estados Unidos, o atentado desta terça-feira deu a Donald Trump mais um pretexto para relacionar imigração e terrorismo, uma constante no seu discurso político desde o início da campanha à presidência.

Num “tweet” algumas horas depois do crime, Trump escreveu que tinha dado instruções ao Ministério de Segurança Interna para reforçar o processo de escrutínio dos candidatos a imigrar para a América.

Antes disso, tinha comentado que este tipo de ataques não podem acontecer no país, na linha da promessa eleitoral de “acabar com o terrorismo” se fosse eleito Presidente.

Apesar dessa promessa de combate implacável ao terrorismo e ao crime em geral, nos dez meses que leva na Casa Branca Trump já tem no seu registo o maior massacre com armas de fogo da história da América moderna – em Las Vegas no passado dia 1 de Outubro, onde morreram 59 pessoas – e o maior atentado terrorista na sua cidade natal depois do 11 de Setembro – o desta terça-feira, onde morreram oito pessoas.

Acontecimentos funestos que vêm provar que a demagogia populista não garante a segurança dos cidadãos.

Comentários
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  • João Sem Paciência
    01 nov, 2017 lx 16:43
    Este atentado comparado com o terrorista que os EUA tem como presidente é uma brincadeira de crianças. E mesmo comparando com dimensão das brincadeiras criminosas com armas de fogo dos próprios grunhos americanos toda esta encenação não passa de uma teatro de hipocrisia onde os americanos são uns verdadeiros experts. Palhaços.
  • AA
    01 nov, 2017 LX 13:37
    MORRERAM 8. NOS INCÊNDIOS EM PORTUGAL MORRERAM MAIS DE 100 POR CORRUPÇÃO E INCOMPETÊNCIA GENERALIZADA. PORTUGAL NEM PRECISA DE TERRORISTAS, COM OS CRIMINOSOS QUE DOMINAM A POLÍTICA E ALTOS CARGOS EM PORTUGAL TEMOS UM NÚMERO DE VÍTIMAS INCOMPARÁVEL.
  • Joaquim Santos
    01 nov, 2017 Taquáras 13:14
    Os exorcistas são concordes em demonstrar o obscurantismo da chamada ”festa das bruxas”. A respeito dessa comemoração dizia o grande exorcista Padre Gabriele Amorth: ”O Halloween é uma armadilha do demônio…trata-se de uma coisa pagã, anti-cristã e anti-católica.” A comemoração do ”dia das bruxas” nunca foi uma festa cristã, embora por um período a Igreja tenha tentado cristianizar os costumes dos povos que celebravam a passagem do tempo de vida e luz (verão e primavera) para o tempo de escuridão e morte (outono e inverno), especialmente os povos herdeiros das tradições Celtas (desde 1300 a.C.), que acreditavam que no dia 31 de outubro os maus espíritos de mortos poderiam invadir suas casas e também seus corpos, razão pela qual colocavam figuras horripilantes e caricaturas diante de suas portas ou perto de suas casas para espantar tais espíritos. Com o tempo os ocultistas, bruxos e satanistas foram ”aperfeiçoando” a festa pagã e acrescentando-lhe outros elementos ritualísticos, ao pontos de em alguns casos praticarem os mais macabros rituais de sacrifícios de animais, mutilações, violação sexual de crianças e mesmo sacrifícios humanos. Não é mero ocaso o fato de que nessa época nos EUA e em outros países, se registre um número maior de desaparecimento de crianças que jamais serão encontradas. É muito triste e preocupante que pais, escolas e outras entidades (algumas até ditas cristãs), promovam a ”festas das bruxas” sem se preocuparem com o seu significado e suas origens.
  • ceifadores
    01 nov, 2017 taquaras 13:06
    A aparente inocência e as quase insuspeitas travessuras da conhecida ”Festa das Bruxas”, escondem uma realidade por demais preocupante. Para os bruxos, satanistas e ocultistas em geral, se trata de uma festa ”sagrada”, de grande importância, onde se realizam vários rituais, que vão deste orações de louvor e invocações aos mortos, deuses e demônios até o oferecimentos de sacrifícios de coisas, animais e pessoas. O diabo sempre busca fazer uma paródia das coisas santas e sagradas, sendo assim, seus cultuadores ou aqueles por ele inspirados, fazem do dia 31 de outubro uma data especial, pelo fato de a mesma preceder a Festa de Todos os Santos (01 de novembro) e dos Fiéis Defuntos (02 de novembro). Enquanto os cristãos comemoram a festa do Céu, celebrando todos os santos e depois rezando pelos fiéis defuntos, os ocultistas comemoram no dia 31 de outubro a festa do inferno. Todos os ex-bruxos e ex-satanistas convertidos a fé cristã, são unânimes em afirmar que a festa do halloween é diabólica, e que a celebravam como uma grande solenidade em meio a rituais satânicos.
  • Selma Lizia
    01 nov, 2017 Aveiros 11:56
    Pois deram até sorte por não ter acontecido um massacre ainda maior; também puderas, comemorar coisas amaldiçoadas .Quem cultua Bruxas atrai o mal e até o próprio Satanas para si.

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