31 ago, 2017 - 20:45
A Associação de Jogos Tradicionais da Guarda (AJTG) esclarece, após a polémica que envolve o partido PAN e uma aldeia de Seia, que o jogo da "morte do galo" utiliza um ovo em vez de um animal.
"De há anos a esta parte, a AJTG opta por utilizar um ovo em substituição de um galináceo, ainda que o prémio para quem ganhar continue a ser o galo", disse esta quinta-feira à agência Lusa Norberto Gonçalves, presidente da colectividade que desde 1979 vem estudando a cultura lúdica tradicional.
O dirigente recorda que "nos anos 80 do século passado o jogo do galo era presença habitual nas festas de qualquer aldeia do distrito".
"Aliás, a iniciativa da Câmara Municipal da Guarda que hoje se conhece por julgamento do galo, deveria, em boa verdade, manter a designação inicial de 'Julgamento e Morte do Galo', dado que foi beber à iniciativa filmada e estudada pela AJTG numa aldeia do concelho: Pousade", adianta.
Segundo Norberto Gonçalves, nesta localidade da Guarda, o galo, "era enterrado e, de olhos vendados e munido de um maço, o participante tentava acertar-lhe".
"Noutros locais, por exemplo em terras raianas, o galo era pendurado numa corda e o participante, igualmente de olhos vendados, mas a cavalo, tentava atingi-lo", acrescenta.
O presidente da AJTG esclarece que com "o correr dos tempos, a crescente consciencialização de que os maus-tratos animais não eram mais do que barbárie, levaram à evolução do jogo para outros patamares civilizacionais", sendo utilizado o ovo em substituição do animal.
"Pese embora toda a legitimidade que se reconhece aos defensores dos direitos dos animais (com ou sem rebuscadas intenções políticas) é fundamental que se conheça (e reconheça) o que o jogo encerra para além do que é visível e aparentemente claro numa primeira aproximação", adianta.
Considera que "quem quiser estudar o fenómeno verá que se trata de um momento de catarse colectiva de uma 'sociedade' e de uma crítica social 'pura e dura', a que não será alheio o tempo em que, inicialmente, era realizado: o domingo anterior ao 'Entrudo', designação bem mais arreigada e genuína que o agora Carnaval, e também conhecido por Domingo Gordo".
Sobre a polémica que surgiu na aldeia de Várzea de Meruge, no concelho de Seia, o presidente da AJTG diz que, "se outra consequência positiva não tivesse", teve seguramente uma: "A de trazer para a ribalta que, afinal, os jogos tradicionais podem contribuir para a animação inter e intracomunitária ao mesmo tempo que propiciam o melhor conhecimento do 'eu', do 'nós' e das raízes que nos prendem ao que é nosso e, verdadeiramente nos identificam".
O PAN anunciou, na terça-feira, que pretende impedir a prática da "morte do galo", anunciada para as festas do Santíssimo Sacramento, em Várzea de Meruge, no concelho de Seia, de 8 a 11 de Setembro.
Em comunicado, refere que a prática, em que o galo "é agredido sucessivamente com um pau até morrer", foi denunciada junto do Ministério Público, da Direcção Geral de Alimentação e Veterinária e da Câmara Municipal de Seia, no distrito da Guarda.
A autarquia já esclareceu que "a prática denunciada pelo PAN trata-se, na realidade, de uma tradição que consiste em partir um ovo com um pau, de olhos vendados, sendo o galo (vivo) o prémio para quem conseguir tal proeza".