Emissão Renascença | Ouvir Online
A+ / A-

​Bernardo Pires de Lima. " Desde que nasci que ouço o mar como estratégia para a economia"

25 jul, 2017 - 16:58 • José Pedro Frazão

O especialista em relações internacionais, filho de um oficial de Marinha, quer ver mais acção na execução de uma política portuguesa para o "oceano", mais do que para o "mar". Bernardo Pires de Lima defende que Portugal pode ser menos dependente de terceiros neste domínio.

A+ / A-

Bernardo Pires de Lima quer que Portugal seja mais autónomo na definição de um rumo ou de uma estratégia para o "oceano", expressão que prefere à designação simples do "mar". No programa "Da Capa à Contracapa" da Renascença, em parceria com a Fundação Francisco Manuel dos Santos, o investigador do Instituto Português de Relações Internacionais da Universidade Nova de Lisboa sugere mais proactividade estratégica por parte de Portugal.

"O meu ponto prévio a toda esta argumentação do ensaio ou destes debates sobre o mar, o oceano ou a posição de Portugal, é que nós precisamos de ter uma estratégia que não fique dependente constantemente de terceiros. Temos condições para não ficarmos tão dependentes", afirma Pires de Lima, autor do ensaio "Portugal e o Atlântico" editado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos em 2016. Como exemplos, assinala que as relações bilaterais de Portugal com os principais actores do Atlântico Sul estão em suspenso em muitos aspectos " porque não se percebe por onde é que vai a administração brasileira, o que vai ser o ‘day-after’ da presidência angolana, onde as relações são sempre piores ou melhores consoante as épocas ou o preço do barril de petróleo".

Os portugueses como adversários de Portugal

Pires de Lima é duro na avaliação dos obstáculos a uma aposta consequente de Portugal neste domínio.

"O principal adversário de Portugal é Portugal, como sempre. São os portugueses, é a cegueira política e o umbiguismo. É o virar para dentro e não perceber as tendências que estão á nossa porta. Os vários agentes que fazem o debate - sejam políticos, empresas ou investidores - todos eles têm que participar numa lógica em que o mar, o oceano, a geografia, os nossos recursos e o nosso modo de pensar está na primeira linha do debate", denuncia o investigador do IPRI que pede mais protagonismo aos agentes políticos "para lá das questões que dizem respeito por exemplo à iniciativa privada".

Bernardo Pires de Lima diagnostica uma "grande mistura de papéis" entre estas duas realidades. "Há agentes privados que querem ir a reboque do poder politico e há poder político que quer brilhar porque a iniciativa privada também brilhou", sintetiza o autor.

O entendimento das megatendências mundiais que conduzem a economia, a política e as sociedades deve ser a bússola das acções políticas sobre o mar. "Desde que nasci que ouço o mar como estratégia para a economia, para isto ou para aquilo. Mas depois é preciso ser consequente. É preciso perceber tendências", insiste Bernardo Pires de Lima no debate com Tiago Pitta e Cunha no "Da Capa À Contracapa". O antigo consultor de Cavaco Silva e actual presidente da Fundação Oceano Azul pede uma aposta na biotecnologia marinha em vez da mineração dos oceanos e assegura que a extensão da plataforma continental portuguesa não vai mudar o país neste século.

E os meios para explorar o novo mar português ?

A poucas semanas do debate na ONU da proposta de extensão da plataforma continental portuguesa, Bernardo Pires de Lima pede mais debate sobre as reais implicações de uma ratificação desse novo território sob soberania portuguesa.

"Há a questão dos meios para salvaguardar o interesse português em toda a zona de exploração. Aí Portugal evidentemente sozinho não é capaz, nem tem meios para defender os seus interesses em função do que lhe pode ser proporcionado em termos territoriais e de recursos marinhos. Esse debate não está minimamente a ser feito. Não há nenhum apetrechamento na dimensão naval portuguesa e na defesa enquanto mecanismo de soberania. Extensão de soberania implica meios ou parcerias confiáveis. E isso é um trabalho politico", comenta o investigador do IPRI.

Olhando para o desempenho diplomático português neste processo, Pires de Lima fala numa "gestão com pinças" devido a "alguma sobreposição" que sugere a necessidade de diálogo entre diversos estados, dificultado com alguns obstáculos pouco habituais.

"No caso da administração americana, não há muitas pontes, não há grandes interlocutores conhecidos de primeiro nível. Há um congressista luso-descendente que tem sido bastante cortejado por Lisboa nomeadamente por causa das Lajes", exemplifica o autor de "Portugal e o Atlântico".

Nem tudo é mau na vertente portuguesa virada ao mar. Pires de Lima elogia o percurso do surf português e em particular de Frederico Morais.

"É um sector do mercado ligado ao turismo, a uma reconfiguração muito interessante de varias vilas e comunidades que se viraram para esse sector. Era impensável há 20 anos que o surf fosse uma das actividades desporto escolar ou que houvesse tantas colónias de férias ligadas ao surf", remata Bernardo Pires de Lima.

Saiba Mais
      Comentários
      Tem 1500 caracteres disponíveis
      Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

      Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

      Destaques V+