22 jul, 2017 - 10:03 • Lin Taylor, Fundação Thomson Reuters
Quando Abu Haron chegou a Inglaterra, em 2010, depois de fazer o percurso desde Calais, no norte de França, agarrado ao chassi de um autocarro, deu por si numa esquadra da polícia rodeado de pessoas que falavam uma língua estranha.
Com 16 anos, sozinho e sem saber falar inglês, o jovem do Sudão estava aterrorizado com a hipótese de as autoridades britânicas o enviarem de volta para casa, na região de Darfur, de onde fugiu por causa da guerra.
“Senti-me com medo, sozinho e perdido, porque estava ali sentado à espera de uma entrevista. Não sabia nada de inglês. As pessoas passavam por mim e eu não sabia o que estava a acontecer, o que estavam a dizer”, conta Abu, agora com 23 anos, à Fundação Thomson Reuters.
Embora tenha passado o ano seguinte a estudar inglês e a jogar futebol, Abu não tinha em quem confiar quando chegou a Londres, uma cidade enorme, quando comparada com a sua pequena aldeia, agora destruída pelas milícias.
Um dia, Abu recebeu uma carta de uma mulher britânica chamada Anneke Elwes a convidá-lo para um passeio pelo parque londrino Hampstead Heath.
Os dois foram apresentados por uma instituição de solidariedade, a Freedom from Torture (Liberdade da Tortura), que faz a ligação entre pessoas para promover relações de amizade.
Mãe de dois filhos com a mesma idade do que Abu, Anneke, de 55 anos, disse que o jovem rapaz rapidamente se tornou parte da família, tendo chegado a celebrar o Natal com eles.
“Toda a família me recebeu como se eu fosse um filho e estou muito feliz por ter uma mãe em Inglaterra. Muitos dos migrantes não têm esta oportunidade”, diz Abu, sentado ao lado da sua “mãe” inglesa, na casa desta, no norte de Londres.
“Quando temos alguém na vida, mesmo que seja só para falar connosco ao telefone, isso dá-nos confiança. Não estamos sozinhos. Faz uma grande diferença”, explica Abu.
Conhecer Abu inspirou Anneke a criar o HostNation, um “site” que faz a ligação entre refugiados adultos e voluntários amigos.
Há muitas famílias em Londres que gostariam de ajudar a garantir que aqueles que chegam “conseguem encontrar um lado positivo na vida britânica”, diz Anneke.
“Para muitos refugiados e requerentes de asilo, as únicas pessoas que conhecem que falam inglês são os funcionários dos serviços”, afirma.
O isolamento numa grande cidade
O sentimento de solidão e isolamento é comum entre os requerentes de asilo e os refugiados devido à barreira da língua, à pobreza e à falta de apoio social, dizem as instituições de caridade.
“Sabemos que os refugiados e os requerentes de asilo passam por situações de isolamento; é um problema enorme”, diz Mariam Kemple Hardy, a gestora de campanhas na Refugee Action, uma instituição de apoio a refugiados, em Inglaterra.
“Ser incapaz de falar com o vizinho, ou mesmo de fazer amigos para além dos contextos de vizinhança, pode fazer com que estas pessoas se sintam extremamente isoladas”.
Viajar também é difícil, uma vez que muitos refugiados não conseguem pagar os transportes públicos e frequentemente fazem percursos a pé durante horas para chegar aos serviços ou para se encontrarem com amigos e familiares.
Em 2016, a Cruz Vermelha Britânica ajudou mais de 14 mil requerentes de asilo em situação de carência ou sem-abrigo, que receberam um subsídio de cerca de 36 libras por semana (cerca de 40 euros).
Projecto cresce
Depois do lançamento do HostNation em Março, Anneke está agora a fazer a ligação entre refugiados e voluntários por toda a cidade de Londres. Este é um processo longo que requer a sinalização de pessoas por parte das agências de refugiados, uma triagem rigorosa e a confirmação das referências.
“Queremos que outras pessoas beneficiem de relações gratificantes como a que nós tivemos”, diz Anneke, enquanto Abu e ela olham sorridentes para as primeiras cartas que trocaram há seis anos.
“Coisas como ser convidado para ir a casa de alguém ou conhecer a família de alguém pode ser realmente especial. Pode ser muito transformador”.
Refugiados no Reino Unido em números:
Fontes: Alto Comissariado para os Refugiados das Nações Unidas; Gabinete Nacional de Estatística do Reino Unido; Observatório das Migrações da Universidade de Oxford