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PGR quer poder de pronúncia no acesso de agentes das secretas a metadados

05 jun, 2017 - 22:29

A Procuradoria admite que o diploma do Governo se possa enquadrar nas normas constitucionais em matérias de exigência de “fiscalização e controlo”.

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A Procuradoria-geral da República (PGR) defende que deve ter direito de pronúncia nos processos especiais em que o Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP) solicita o acesso a dados de comunicação electrónica, os chamados meta-dados.

Esta é uma das mais relevantes alterações que é sugerida num parecer da PGR ao diploma do Governo sobre o acesso das secretas a dados de comunicação electrónica – uma proposta de lei que já foi aprovada na generalidade na Assembleia da República pelo PSD, PS e CDP-PP, com a oposição do Bloco de Esquerda, PCP e “Os Verdes”.

No parecer enviado ao Parlamento, ao qual a agência Lusa teve acesso, a PGR admite que o diploma do Governo se possa enquadrar nas normas constitucionais em matérias de exigência de “fiscalização e controlo”.

Mas, em simultâneo, a Procuradoria também avança com uma série de sugestões de alteração em relação a mais de uma dezena de artigos da proposta do Executivo.

De acordo com a PGR, a proposta do Governo “é totalmente omissa quanto ao que efectivamente poderá o(a) procurador(a) Geral da República fazer na posse das comunicações de formulação do pedido, da autorização dada e das decisões de cancelamento e destruição de dados que a proposta prevê que lhe sejam feitas no âmbito do procedimento especial de autorização e controlo do acesso aos dados pelo SIRP”.

“O mero conhecimento do procedimento e do pedido, sem que se densifique uma concreta competência de intervenção, não se afigura suficiente para que se possa entender estar em causa um efectivo controlo por parte do(a) procurador(a), enfraquecendo, deste modo, o controlo das entidades judiciárias e o correspondente juízo sobre a constitucionalidade do sistema proposto”, critica-se no parecer da Procuradoria.

Para a PGR, pelo contrário, “a especial sensibilidade da matéria imporá, pois, que o(a) procurador(a) Geral da República possa intervir no procedimento especial, não se compreendendo, assim, que apenas se prevejam meras comunicações ou procedimentos que não poderão deixar de se consubstanciar em mero controlo formal”.

“Cremos que se exigirá a atribuição de concretas competências ao (à) Procurador(a) Geral da República no âmbito do procedimento especial, desde o seu início, e não apenas o conhecimento da sua existência e da decisão mesmo proferida. Para que ocorra uma efectiva fiscalização/controlo do acesso, e mantendo-se, como é evidente, a iniciativa do SIRP, considera-se que o pedido de acesso deverá ser remetido ao(à) Procurador(a) Geral da República, que emitirá pronúncia sobre o mesmo em matéria de legalidade”, conclui-se no parecer da PGR.

A PGR deixa mais um aviso ao parlamento para que altere a proposta do Governo em matéria de controlo da legalidade sobre processos especiais de acesso a meta-dados pelas “secretas”.

À PGR deverá igualmente “ser atribuída competência de pronúncia relativamente ao cancelamento de procedimentos e à destruição dos dados”, salienta-se no documento.

Em relação ao conteúdo da proposta do Governo, o parecer emitido pela PGR, em termos globais, admite que se possa enquadrar nas normas constitucionais, partindo, para o efeito, de várias declarações de voto de juízes do Tribunal Constitucional que na anterior legislatura se pronunciaram [maioritariamente pela inconstitucionalidade] de um diploma do executivo PSD/CDS sobre a mesma matéria de acesso das “secretas” a meta-dados.

A PGR advoga uma leitura “teleológica” no que se refere a normas relativas à intercepção de comunicações, assim como defende um “equilíbrio” entre normas constitucionais referentes à liberdade e à segurança dos cidadãos.

“Afigura-se que o sistema de controlo ora proposto, quer quanto à exigência de autorização judicial, quer quanto à manutenção dessa intervenção em momentos posteriores do processamento de dados, poderá conformar-se às exigências constitucionais”, sustenta-se no parecer.

A PGR defende, por exemplo, que não se pode “desconsiderar” na proposta do executivo “as demais instâncias de controlo nela previstas, as quais reforçarão as garantias de que a actividade desenvolvida pelos serviços de informações no âmbito do acesso aos dados de comunicação será desenvolvida e se manterá nos estritos limites das finalidades para as quais a autorização de acesso foi concedida”.

No parecer, a PGR cita ainda o caso de Espanha, onde o Centro Nacional de Inteligência, “genericamente coincidente com as finalidades do SIRP”, pode, depois de um pedido ao “magistrado do Tribunal Supremo competente”, ter autorização à “adopção de medidas que afectem a inviolabilidade de domicílio e o segredo de comunicações”.

Dos pareceres sobre o diploma governamental, recebidos até hoje pela comissão de Assuntos Constitucionais, um deles, da Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) considera a proposta inconstitucional, e dois outros são favoráveis – do secretário-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP), Júlio Pereira, e da Comissão de Fiscalização de Dados do Sistema de Informações da República Portuguesa (CFDSIRP).

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