06 abr, 2017 - 09:05 • João Carlos Malta
A Piscina da Penha de França, em Lisboa, devia ter aberto em Outubro do ano passado. Até se fizeram visitas guiadas a jornalistas. Tudo parecia correr bem para que a piscina, que esteve fechada cinco anos, voltasse a abrir. Passados quase seis meses, não foi isso que aconteceu. Já com muitos inscritos, as portas continuam fechadas.
Esta história começa a escrever-se em 2013 quando a Câmara de Lisboa, a Junta de Freguesia da Penha de França e a Associação Centro Cultural e Desportivo Estrelas S. João de Brito assinaram um contrato-programa de Desenvolvimento Desportivo relativo à Piscina Municipal da Penha de França.
A autarquia patrocina o projecto com 775 mil euros e entrega ao Estrelas S. João de Brito, um dos mais prestigiados clubes de natação em Lisboa e no país, a “requalificação da Piscina Municipal da Penha de França”. Ou seja, o clube torna-se o dono de obra.
No período em que as obras decorreram, o clube teria de pagar os custos de electricidade, do gás e da água. No futuro, o clube ficaria com a gestão e exploração do espaço. Nessa altura, qualquer reparação ou obra passaria a ser responsabilidade do clube, que apenas terá necessidade de pagar 20% dos lucros à junta caso o exercício anual tivesse proveitos. Compromete-se ainda a ceder a piscina à câmara em qualquer altura que esta deseje sem nada cobrar.
Mas a ajuda do Estado não ficaria por aqui. Além de isenção de várias taxas, após a requalificação das piscinas, a junta local ainda fica responsável pelo pagamento da electricidade, do gás e da água da piscina.
Começam os problemas
Mas isso seria num futuro que ainda não chegou. Em Janeiro, começam os relatos dos primeiros problemas. Segundo um comunicado publicado no “site” da junta, esta “toma conhecimento da existência de vários defeitos na obra que impedem a sua inauguração, entre eles infiltrações na cuba da piscina”.
Para a Junta da Penha de França, “tornou-se evidente que o clube não assegurou uma adequada fiscalização da obra, tarefa que o contrato-programa lhe atribuiu”. Nesse mesmo contrato, está escrito que a autarquia assume a responsabilidade de fiscalizar o cumprimento autárquico. Há também uma comissão permanente de acompanhamento que deve seguir o desenrolar da obra e que tem elementos da Junta da Penha de França.
O problema adensa-se quando, no mesmo mês, o empreiteiro (a construtora Tanagra) informa a junta de que não fará a correcção dos defeitos porque “o clube se recusa a pagar parte dos trabalhos já executados na piscina”.
No mesmo comunicado, a junta diz ser “alheia a quaisquer litígios entre o clube e o empreiteiro” e avisa que vai deixar de pagar as contas do gás, da electricidade e água entretanto assumidas.
A junta diz que não existe “ainda qualquer previsão minimamente segura para o fim das obras”.
Silêncio total
A Renascença tentou falar com todos envolvidos no processo, mas esbarrou com um manto de silêncio quase total. O presidente do Estrelas S. João de Brito, Nuno Lopes, não respondeu ao pedido de entrevista e da secretaria do clube apenas chegou a resposta de que estão “a fazer todos os esforços para resolver o caso”.
Da junta de freguesia também nenhuma resposta. Fonte do gabinete do vereador do Desporto da Câmara de Lisboa, Jorge Máximo, informou que a câmara não vai falar sobre o caso.
Já o administrador da Tanagra Nuno Martins garantiu haver um grupo de trabalho para resolver o diferendo. Mas rejeitou responder a qualquer outra questão, afirmando que há já muita informação sobre o caso nas páginas das redes sociais das entidades envolvidas no caso.
“Milhares de prejuízo”
Se às perguntas da Renascença as respostas foram nulas ou sintéticas, no Facebook a discussão está ao rubro.
A Junta de Freguesia da Penha de França publicou no final de Março um esclarecimento a todos os fregueses na página do Facebook. O “post” gerou fortes reacções de muitos utentes. Ficou também patente o mal-estar entre a Junta e o Estrelas S. João de Brito.
Em resposta à publicação, uma utente escreveu em resposta: “À conta da incompetência sabe-se lá de quem eu e várias pessoas ficam a arder com o dinheiro da inscrição!”
E prossegue: “Sinto-me burlada e enganada! É uma falta de respeito pelos munícipes que depositam total confiança na junta e no fim é o que se vê! Culpam uns e outros mas nós munícipes é que pagamos! Agradeço que me digam agora que me reembolsa o valor da inscrição!”
É aqui que começa a perceber-se o conflito entre junta e o clube. O presidente do S. João de Brito, Nuno Lopes, responde à internauta, dizendo que foi enviado um e-mail a todos os utentes inscritos a explicar a situação do encerramento. A mesma explicação, garante, está afixada na porta da piscina.
“O ESJB [Escola S. João de Brito] em conjunto com a CML [Câmara Municipal de Lisboa] está a fazer todos os esforços para repor os trabalhos. Temos que ultrapassar pormenores burocráticos da passagem de nome da energia que estava na responsabilidade da JFPF [Junta de Freguesia da Penha de França]. Pedimos mais alguma paciência a todos”, escreve Nuno Lopes.
“Dizer que estamos a ter milhares de euros de prejuízo, sabemos que não resolve o vosso problema!”, assume. O presidente do clube escreve que o clube investiu 350 mil euros no projecto e que dificilmente vai recuperar o investimento.
Garante ainda que, neste momento, o foco é resolver o problema e que assim que a energia estiver reposta retomará os trabalhos.
“Depois de a piscina estar pronta iremos tomar as devidas providências com quem de direito e fazer com que os responsáveis por esta situação sejam penalizados pelas vias legais”, termina, pedindo desculpa por todos os incómodos causados.
Relações muito tensas
Segue-se um comentário da junta que terá sido depois retirado. Nuno Lopes mostra-se indignado e diz estar cada vez mais pasmado com a vereação. Esperava “poder tratar dos assuntos em sede própria”.
O responsável do clube acrescenta ainda que a “Junta de Freguesia teve sempre dois técnicos presentes em todas as reuniões de obra”. “Dizer agora que não sabe de nada ou tentar se desresponsabilizar é algo caricato”, critica.
Depois de mais algumas trocas de mensagens entre as duas entidades, a discussão termina com Nuno Lopes a escrever: “sem mais comentários”.
O contrato celebrado entre a câmara lisboeta, a Junta de Freguesia da Penha de França e o Estrelas S. João de Brito, com validade de quatro anos e renovação imediata por mais três anos, permite a cessação do mesmo por qualquer uma das partes caso haja incumprimentos.