11 mar, 2017 - 00:17 • José Alberto Lemos, em Nova Iorque
Mais de 100 empresários luso-americanos participaram esta sexta-feira em Newark, New Jersey, Estados Unidos, num seminário anual para analisar oportunidades de investimento.
O plano de recuperação das infra-estruturas do país prometido por Donald Trump, que poderá ascender a 1 trilião de dólares nos próximos dez anos, alimenta as expectativas do sector, que vêem nele a grande oportunidade de aumentar o seu volume de negócios, apesar dos sinais de proteccionismo dados pela nova administração americana.
Estradas, túneis, aeroportos, caminhos-de-ferro, pontes, barragens estão de um modo geral em mau estado na América, o que levou o novo presidente a prometer durante a campanha eleitoral um gigantesco plano de renovação, que visa ainda dinamizar o mercado de trabalho em todo o país.
Naturalmente que o sector da construção civil acalenta expectativas de expansão graças a este plano, depois de vários anos em clima de alguma estagnação na sequência da recessão de 2008 e da implosão da bolha imobiliária. E os empresários portugueses não são excepção nesta matéria.
A prometida descida de impostos sobre as empresas e a renovação das infra-estruturas constituíram por isso os temas principais do encontro, que visa também criar pontes entre investidores radicados nos EUA e os seus congéneres em Portugal.
Carlos Couto, conselheiro financeiro na Morgan Stanley e membro da comunidade portuguesa de Newark, revelou à Renascença a sua convicção no avanço do plano, apesar das dificuldades que a sua aprovação possa ter no Congresso. Recorde-se que muitos membros do Partido Republicano são contra o aumento da despesa pública e por isso não vêem com bons olhos a proposta de Trump.
Ideologicamente avessos ao investimento público e empenhados sobretudo em diminuir a despesa pública, muitos eleitos republicanos ameaçam votar contra o plano de Trump, que, se avançar, acabará por fazer disparar o défice orçamental. Este foi, aliás, o seu argumento quando o presidente Obama apresentou também um plano de renovação das infra-estruturas. Nessa altura, a maioria republicana no Congresso chumbou o plano e recusou qualquer compromisso com a administração que significasse aumento de despesa.
Cerca de oito anos depois, as infra-estruturas americanas continuaram a degradar-se e em alguns casos estão perto da ruptura. Para Carlos Couto, a generalidade dos americanos têm consciência da situação e são favoráveis à renovação, o que funcionará como uma forma de pressão sobre os congressistas. “O plano vai ser aprovado porque os legisladores não querem perder o lugar no Congresso e se eles não o aprovarem o Trump fará campanha contra eles nos seus círculos eleitorais”, prognostica.
Quem trabalha já sobre essa hipótese é Francisco Simeão, fundador e director da NOPA — National Organization of Portuguese-Americans. Uma espécie de “lobby” para defender os interesses dos luso-americanos em Washington, a NOPA já fez saber à administração Trump do interesse dos investidores portugueses em participarem no plano de infra-estruturas, garante Simeão à Renascença. Mas mostra-se mais cauteloso quanto ao sucesso do plano e lembra que ele tem de ser votado no Congresso, sugerindo as dificuldades por que o processo poderá ainda passar.
Uma dificuldade acrescida para os investidores portugueses poderá resultar da tendência nacionalista e proteccionista de Trump, que quer colocar a América primeiro (America first), simbolizando com isso a vontade de proteger as empresas dos EUA em todos os contratos, discriminando quem não for americano.
Francisco Simeão reconhece que a administração Obama era mais aberta aos contactos internacionais e ao investimento estrangeiro, mas está confiante em que a sensatez acabe por triunfar na administração Trump. “Compete-nos a nós provar que aquilo que queremos fazer aqui é para o bem do povo americano”, afirma, “e isso favorecerá toda a gente”.
Já Carlos Couto não crê que a tendência proteccionista de Trump impeça empresas com boas soluções e sobretudo com melhor preço de ganhar concursos e fazer obras. E espera que algumas empresas luso-americanas consigam fazê-lo. Para Couto, muito do que Trump afirma visa apenas criar "condições de negociação" e não deve ser levado à letra. Um exemplo: o montante previsto para o plano de infra-estruturas de um trilião de dólares em dez anos afigura-se irrealista, mas destina-se apenas a garantir que alguma percentagem desse montante acabará por ser aprovada e o plano avançará na prática.
As opiniões de Couto e Simeão reflectem o clima de optimismo que perpassou pelo encontro de Newark. A generalidade dos intervenientes mostrou-se esperançada num boom económico como consequência dos planos da administração Trump, nomeadamente a renovação das infra-estruturas e a descida dos impostos.
A prometida reforma fiscal, que passará certamente por uma descida considerável do "corporate tax” (equivalente ao IRC português), alimenta muito deste optimismo, baseado na convicção de que o dinheiro que seja poupado em impostos acabe por impulsionar a economia. “Somos um país de gastadores, não de aforradores”, lembrou Carlos Couto.
E nem as eventuais pressões inflacionistas parecem preocupar estes investidores. Um cenário equacionado por muitos analistas, que poderá resultar da conjugação de dois factores em presença: o baixo desemprego actual (4,7%) e a eventual expulsão de milhões de imigrantes indocumentados. Caso esta operação se concretize em grande escala, é provável que comece a escassear a mão-de-obra em alguns sectores e a pressão para aumentos salariais será inevitável. Os imigrantes, sobretudo os indocumentados, aceitam empregos e salários que geralmente os cidadãos nacionais não aceitam e a construção é um dos sectores em que tal fenómeno é mais patente.
Mas, por ora, nada parece refrear o optimismo dos empresários luso-americanos presentes no encontro. Vislumbram tempos de prosperidade e não parecem apreensivos com a hipótese de a inflação, o proteccionismo ou qualquer tipo de discriminação vir a afectá-los.
O próximo encontro, previsto para 2018, avaliará certamente se este optimismo se justificou ou não passou de "wishful thinking".