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Como se vive o Brexit nos 3 maiores países da UE?

20 dez, 2016 - 23:24

Seis meses depois, a Europa ainda acorda do choque da escolha dos britânicos que resolveram dizer “byebye” à União Europeia. Numa decisão sem precedentes, um país quer deixar a comunidade e três correspondentes da Renascença tomam o pulso à forma como é sentido o brexit na Alemanha, em França e no próprio Reino Unido.

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Grande Reportagem Euranet - como se vive o Brexit no Reino Unido, Alemanha e França (20/12/2016)

Seis meses depois, o Brexit ainda é “estranheza” em Londres

Quando em Fevereiro, David Cameron, então Primeiro-ministro britânico, anunciou um referendo para a saída da União Europeia, ninguém o levou a sério. Nem a população, nem os ministros europeus, nem o Parlamento. Provavelmente nem a Rainha. Mas no dia 23 de Junho o resultado foi claro: o Reino Unido queria mesmo sair da União Europeia. O “basta” ganhou. Seis meses depois, se para os ingleses está quase tudo na mesma, para os estrangeiros muito mudou. Londres é a cidade europeia com mais imigrantes. São três milhões, um terço da população. Vêm sobretudo da Índia, da Polónia e do Paquistão e a correspondente da Renascença Inês Alberti, falou com vários deles.

Para os britânicos, o problema é a falta de plano e sobretudo, liderança da parte do Governo. Apesar de quase nada ter acontecido, tudo mudou. O Reino Unido é agora um reino desunido. Ao contrário do resto do país, Londres votou para ficar na União Europeia. Mas uma cidade não é uma nação, provou o referendo de 23 de Junho.

Mais de metade da população quis mudança: maior controlo nas decisões democráticas, económicas e de imigração. Mas ainda não há benefícios do Brexit. Consequências também são poucas, mas uma foi clara desde o resultado do referendo: a libra caiu para o valor mais baixo em décadas, atingindo um euro e dez cêntimos. Há um ano batia a marca do euro e meio.

A directora da City Index, uma empresa de serviços financeiros, diz que os mercados preferem o chamado “soft Brexit”, uma saída suave. Querem que o Reino Unido fique no mercado único. Kathleen Brooks diz que o futuro do Reino Unido passa provavelmente por acordos com os Estados Unidos, “porque vai crescer muito nos próximos quatro anos”, China, Ásia e Commonwealth. No entanto, “o Reino Unido tem que continuar a negociar com a União Europeia, que é o nosso principal parceiro económico”

França: Construir uma nova Europa para não sair da União

Seis meses depois do referendo que ditou a saída do Reino Unido da União Europeia, o debate sobre a Europa cresce em França. As eleições presidenciais do próximo ano podem ser decisivas para o futuro, como relata o correspondente da Renascença em Paris, Tiago Almeida.

Depois do referendo britânico, os ventos de uma eventual saída da União Europeia (UE) começam também a soprar em França. Há quem saúde o Brexit, mas também quem lembre como a União Europeia foi importante para a existência de várias décadas de paz num território.

O populismo antieuropeu parece não parar de crescer – no Reino Unido, em França e noutras paragens. O economista Pascal de Lima diz, no entanto, que, “em termos económicos, o populismo não existe”. O que existe, são partidos que estão a explorar o medo para promover a saída da UE. O economista acredita que há uma alternativa: “É não meter medo e imaginar uma nova Europa muito mais promissora em termos económicos.”

E esse é “um combate que tem que ser levado a cabo” porque há razões que estão a pôr em causa o projecto europeu: um défice democrático da própria União Europeia, o baixo crescimento na zona europeia, a forte taxa de desemprego na maioria dos países e a falta de vislumbre de um projecto a longo prazo. Pelo que, acredita, “não se trata de dizer ‘não’ à Europa, mas de dizer ‘não’ à Europa actual”.

Alemanha: “Ninguém vai lançar crocodilos no Canal da Mancha”

Guilherme Correia da Silva, correspondente da Renascença em Bona, falou com uma série de alemães que vêem mais consequências negativas do que positivas no Brexit. Passaram seis meses desde que os eleitores do Reino Unido pediram para sair da União Europeia. O dono de uma loja inglesa, Alexander McWhinney, ainda está em choque: “A política parece tornar-se num jogo onde quem grita mais alto e de forma mais escandalosa é ouvido. Estou dividido, como escocês, como britânico e como europeu. A única coisa que posso dizer, com toda a certeza, é que vou ficar”, afirma McWhinney, que estudou Engenharia e veio para a Alemanha há quase 30 anos. Trabalhou na indústria automóvel, mas entretanto abriu a loja inglesa porque tinha saudades dos produtos da terra.

McWhinney teve sucesso na Alemanha: já há “English Shops” em quatro cidades e o empresário prepara-se para abrir mais. Nem ele, nem ninguém, sabe ao certo o que acontecerá quando o Reino Unido sair da União Europeia. Mas o escocês duvida que, no futuro, passe a ter de pagar taxas alfandegárias pelos produtos que importa. Diz que isso já passou de moda: “Cada vez se fala mais em acordos comerciais para acabar com os impostos de exportação entre países. Erguer barreiras comerciais seria uma forma de punir a Grã-Bretanha, mas isso não interessa à Europa.”

Já o economista alemão Markus Demary defende que, quanto a isso, não poria as mãos no fogo antes de Bruxelas e Londres se sentarem à mesa :“Provavelmente [os britânicos] vão querer ter os benefícios económicos sem as obrigações em relação à União. Mas aí, provavelmente, a União dirá que não, e voltará a haver barreiras, porque ambas as partes terão de chegar a um compromisso”, prevê o economista.

Isso pode significar más notícias para a Alemanha. O Reino Unido é um dos maiores parceiros comerciais dos alemães - é o terceiro país para onde a Alemanha mais exporta, depois dos Estados Unidos da América e da França. Em cada sete carros fabricados na Alemanha, um vai para o Reino Unido. A Vauxhall (afiliada da alemã Opel), a Volkswagen e a BMW são das marcas de carros mais vendidas em território britânico. Além disso, a BMW, por exemplo, também tem fábricas no Reino Unido, onde trabalham oito mil pessoas. Os Mini são produzidos em Oxford.

“Primeiro, as empresas vão esperar, antes de tomarem grandes decisões - antes de começarem a mudar as fábricas de sítio ou a fechar escritórios”, diz Demary, para quem outro grande ponto de interrogação é o que acontecerá ao sector financeiro. Será que os bancos de Londres se vão mudar de malas e bagagens para outros sítios? “Se perderem este passaporte europeu, os bancos que quiserem continuar a ter acesso à União terão de abrir aqui uma filial. Isso sairá caro. Mas possivelmente também sairão de Londres - para Frankfurt, por exemplo, ou para Paris, Dublin ou até Amesterdão”, responde o economista.

Para o politólogo Tilman Mayer, no final, os membros da União Europeia e o Reino Unido terão de se encontrar a meio caminho. “A Alemanha não está interessada que a Grã-Bretanha se distancie muito do continente. A liberdade para se escolher o país onde se quer trabalhar é uma condição ‘sine qua non’ na União, e isso é algo que a Grã-Bretanha prefere não ter. Mas, para que continue a haver uma relação próxima, será preciso chegar a um compromisso quanto a este ponto”, diz. Tilman Mayer acredita que, sem o Reino Unido, a Alemanha ficará mais isolada na União Europeia. Reino Unido e Alemanha são adeptos de “apertar o cinto” para controlar os défices dos Estados. Nesse ponto, andavam sempre de mãos dadas.

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  • FG
    17 jan, 2017 Lisboa 14:50
    Depreende o interesse em considerar que neste braço de ferro as forças são equivalentes, mas a UE tem que fazer prevalecer os interesses dos seus países face ao RU, cujos dirigentes, egoisticamente, vão querer o deus para eles e o diabo para os outros.

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