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Álvaro Almeida: “Velho regime económico volta quando se paga a quem investiu 500 mil euros no GES"

08 jan, 2017 - 21:08 • José Bastos

“O ‘não’ de Passos a Salgado é a única razão para continuar a emprestar dinheiro à Banca”, diz Daniel Bessa. Já Aguiar-Conraria alerta para sinais de retrocesso na relação política-finanças.

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À procura do menor efeito possível nas contas públicas os últimos dias foram fartos de informações sobre a Banca. Desde logo, porque na quarta-feira terminava o prazo para as ofertas de compra do Novo Banco e um dos candidatos o fundo Lone Star tinha alertado de que só mantinha a proposta até essa data.

Mas, mais importante, o debate que está aberto no espaço público anda à volta da hipótese de uma nacionalização do Novo Banco. Opiniões de personalidades do centro-direita juntam-se à esquerda (BE e PCP) num invulgar consenso somando argumentos ao debate.

Estará uma nova resolução à vista? Como recapitalizar o Novo Banco? O governo está a pressionar Bruxelas para uma venda sem prazo definido ou prefere uma venda rápida sem impacto no défice? E a solução para os lesados do BES? E o impasse na gestão da CGD? As dúvidas entrecruzaram-se no Conversas Cruzadas deste domingo.

Daniel Bessa, antigo ministro da economia, defendia em 2015 que “o regime mudou” no dia da “nega redonda” do governo a Ricardo Salgado para a CGD salvar o Grupo Espírito Santo. Em 2017 mantém que só essa decisão “permite que continue a depositar dinheiro na Banca portuguesa”.

“A questão da Banca é um tema tão sério quanto o do equilíbrio das contas do estado. O equilíbrio das contas do Estado é um tema muito sério e se há tema com idêntico grau de seriedade é o das contas da banca. E quando estes dois temas se cruzam as coisas tornam-se muito complicadas”, diz Daniel Bessa.

“Gostava de fazer aqui duas referências. Primeiro, a presença de Luís Campos e Cunha na Assembleia da República que foi um momento notabilíssimo. Porque Luís Campos e Cunha foi lá contar o que se passou nos seus tempos de Ministro das Finanças. Foi contar a pressão de que foi alvo para que mudasse a administração da Caixa Geral de Depósitos e por aí adiante”, prossegue o economista.

Daniel Bessa: “Se a coisa vai longe como parece, então estamos mal”

“Uma semana depois de Luís Campos e Cunha se ter demitido mudaram a administração da CGD”, acrescenta Álvaro Santos Almeida, professor da Universidade do Porto.

“Isso ficou claro”, prossegue Daniel Bessa. “A seguir a essa presença de Luís Campos e Cunha no Parlamento, surgiram, no espaço público, conversas no sobre as relações do poder político com o poder financeiro”, faz notar.

“E, justamente, o segundo ponto a referir é um texto que não é notável, é notabilíssimo de Rui Ramos, no Observador, sobre a utilização que se tende a fazer da Banca em Portugal”

(N.D.R.: Rui Ramos defende que “o regime em Portugal consiste num complexo político-financeiro, em que os governos usam os bancos como instrumento de poder. É duvidoso que o governo deixe agora desenvolver-se outro tipo de banca”).

Daniel Bessa acentua as críticas. “Isso é muito sério: eu perguntava quem são os portugueses dispostos a emprestar ao Estado português e, qualquer dia, estou a caminho de perguntar quem são os portugueses a depositar dinheiro na Banca portuguesa. Porque se a coisa vai tão longe como, às vezes, parece que vai então nós estamos muito mal”.

“Para dizer que se Pedro Passos Coelho disse não a Ricardo Salgado em 2014 fez muitíssimo bem. Fez muitíssimo bem. Porque essa é a única razão para eu continuar a emprestar dinheiro à Banca portuguesa e - quem sabe - poder um dia voltar a emprestar dinheiro ao Estado português”, pontua Daniel Bessa.

Luís Aguiar-Conraria: “Estamos a voltar a um entrave ao desenvolvimento”

Já Luís Aguiar-Conraria, professor da Universidade do Minho, alerta para sinais de retrocesso na complexa relação entre política e finanças “um entrave ao desenvolvimento do país”.

“Concordo plenamente com o que Daniel Bessa diz sobre o momento histórico que foi o "não" de Passos Coelho a Ricardo Salgado e vejo as últimas medidas, mesmo esta questão do recuo - nas soluções encontradas para os lesados do BES - e todas estas interferências como mais uma "reversão" levada a cabo por este governo”, afirma Luís Aguiar-Conraria.

“Enquanto houve outras "reversões" que, muitas vezes, eram só uma questão de antecipação e não eram muito graves porque não mexiam em nada de estrutural, neste caso estamos a recuar, a voltar a algo que está lá atrás. O que é mau. É algo de estrutural”, diz Aguiar-Conraria.

“Voltamos à relação de conluio entre os grandes empresários, a Banca e a política portuguesa e acho que isso tem sido um dos grandes entraves ao nosso desenvolvimento desde a década de 90”, conclui o economista.

Álvaro Almeida: “Tira-se a quem poupou a vida toda para pagar a quem investiu no GES”

É de Álvaro Santos Almeida a crítica mais corrosiva às opções políticas tomadas nas últimas semanas e com efeitos na Banca, exemplificando com a opção para os chamados “lesados do BES”.

“De facto, o regime que, aparentemente, teria mudado no dia em que Passos Coelho disse ‘não’ a Ricardo Salgado regressou no dia em que os lesados do BES - pessoas com mais de 500 mil euros - vão ser financiados pelos contribuintes”, nota o antigo quadro superior do FMI em Washington.

“Acrescento um ponto: a despesa desta solução para os contribuintes portugueses deve provavelmente andar na casa dos 150 milhões de euros que é exactamente igual à receita da taxa adicional ao IMI para casas acima de 500 mil euros”, diz Álvaro Santos Almeida.

“Ou seja, vai-se tirar dinheiro às pessoas que pouparam a vida toda para comprar uma casa - só porque vale mais que 500 mil euros - para pagar às pessoas que tinham 500 mil euros investidos no grupo Espírito Santo”, remata o independente que está ser apontado como possível candidato do PSD à Câmara Municipal do Porto.

Daniel Bessa: “Isto é muito sério”

Daniel Bessa remata com um alerta renovado. “A minha nota final é a de que isto é muito sério e, às vezes, muito mais sério do que pensam as pessoas que andam tão contentes e riem”, sustenta o antigo ministro.

“Eu fico muito satisfeito pela unanimidade que se verificou neste espaço de debate: é que se me passa pela cabeça que o dinheiro que deposito nos bancos (não é muito, qualquer um de nós coloca nos bancos o dinheiro que pode, o que tiver, sendo que uns têm mais e outros menos) serve para o mesmo que o dinheiro que empresta ao Estado português então talvez comece a pensar”, observa Daniel Bessa.

“Quem o faz talvez pense que assim como não está disponível para emprestar ao Estado português também não estará muito disponível para pôr o dinheiro - muito ou pouco - que tem na Banca portuguesa. Espero que os portugueses, de uma vez por todas, entendam a gravidade da questão”.

Comentários
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  • Lucilia Domingues
    10 jan, 2017 Porto 15:39
    E dizem eles que são amigos dos pobres. Mas pelos portugueses que trabalham duro e que tentam juntar algum para a sua reforma, já não há a mínima consideração. Devem achar que são ricos e portanto podem ser "esmifrados até ao tutano". Estou de acordo com o que disse o Daniel Bessa e como tal, levantei as minhas economias que tinha em certificados de aforro e coloquei num banco estrangeiro. Não confio já no governo do meu país e muito menos na dívida pública.
  • Jose santos
    09 jan, 2017 Porto 22:00
    Como pode Alvaro Almeida tecer um comentário como este em relação aos Lesados? Pessoas que tinham quinhentos mil euros investidos???!!. Primeiro informe-se e depois comente ! Para alguém que se quer candidatar à câmara do Porto começa muito, muito mal.
  • LesadodosLesadosBES
    09 jan, 2017 Portimão 17:04
    Quando Passos ganhou as eleições (as primeiras), pensei eu que a política em Portugal fosse mudar. Quando o Seguro ganhou as internas do PS, fiquei mesmo convencido que iríamos ter uma política nova e moderna, que pusesse Portugal no caminho certo. Quando o PSD/CDS e PS assinaram um acordo para rever o sistema de Segurança Social, comecei a ver frutos dessa crença. Com a queda do BES e o tratamento indiferenciado que o Salgado recebeu, voltei a ter orgulho no país. Depois, de repente, acordei! Era tudo um sonho. Os que andaram 40 anos a afundar o país, voltaram! Espero que o PSD e o CDS resistam, até ao último fôlego a re-instalação dos barões cleptocráticos e prepotentes da política nojenta portuguesa. E, espero, sinceramente, que um dia o PS também se livre dos "donos da democracia e da liberdade". A novela do GES/NB, da CGD e do BANIF é sintomático de tudo isto que escrevi. Nós contribuintes é que somos os grandes lesados dos lesados do GES! Alguém, no seu perfeito juízo, acredita que havia desconhecimento de risco quando se investia mais de meio milhao de euros a taxas de 8% e 10%???? Mais uma fraude cometida pela esquerda para benefício dos grandes capitalistas - e depois é ácidamente irónico ouvir que os neo liberais é que favorecem a GSachs e companhia! Toda a gente sabe que os socialistas foram sempre os grande aliados de Amorinzadas, Salgadaria, Chapalimaud, Caetana e foi com eles no poder que essa gente expurgou o dinheiro à imensa carneirada passiva e receptiva!
  • GERINGONÇAS !!!!
    09 jan, 2017 Lx 12:11
    Enquanto ganharam mais dinheiro com os juros abusivos que recebiam os lesados não se queixaram...Apenas se queixam quando perderam no casino do trafulhas do Salgado...E nós contribuintes vamos pagar mais com este alegado acordo ainda em segredo por parte da geringonça... A fraude do bandalho do Salgado é agora encoberta e paga pelos contribuintes com o apoio da esquerda que diz estar contra o grande capital..Um embuste esta gente sem coluna vertical...
  • Max Mat
    09 jan, 2017 Povoa 11:12
    Descobriram a maneira de indemnizar os lesados do BES "fazendo de conta" que não serão os cidadãos em geral a "pagar a factura"... Em relação a estas indemnizações, digo que para alguns acho bem (foram em parte enganados...)...mas para muitos outros acho que deveriam "ficar com os prejuizos"...porque enquanto "andaram a receber juros acima do normal"...estava tudo muito bem... A maior parte sabia que estava a "comprar" um produto que não poderia ser considerado "honesto"...mas foram capitalizando... Se então nunca fui chamado a receber qualquer vantagem...porque terei agora de ir pagar por esses negócios mal resolvidos.....? Mas como "têm boa imprensa"...lá vamos "cantando e rindo...levados, levados sim..." (já era assim no tempo da "outra senhora"...) A "geringonça" subiu impostos, mas como "tem boa imprensa"...a maior parte dos cidadãos nem se apercebe que lhes "estão a ir ao bolso..."... Mas "estão felizes..."... Oxalá me engane, mas não me admirava mesmo nada, que daqui a mais uns anitos...tenha de "aparecer outro Passos Coelho...ou semelhante..."... Para nos "obrigar a apertar o cinto"...e a"acertar as contas com a Europa..."... Mas o povo anda feliz...deixa andar...!
  • Vitor Guimaraes
    09 jan, 2017 Felgueiras 11:07
    Este governo está a comprar o silêncio destes investidores milionarios, agora que vêm ai as eleições, com o dinheiro de todos os Portugueses. Se realmente o PR fosse o que dizem, que eu acho que não é, não deixava o governo esbanjar outra vez o dinheiro dos portugueses com investidores de milhões e em que não está provado que não sabiam o que faziam (até pelo contrário). Admito até que meia dúzia deles não soubessem mais isto é um caso de polícia e não um caso em que o governo resolve doar o dinheiro dos portugueses a mais dúzia de investidores, a maioria deles cheios de dinheiro. E já me esquecia, para colocar o ordenado mínimo em 600€ é que o Costa diz q não há dinheiro (já para este esbanjamento injustificado é sempre a andar com o dinheiro dos tugas). Como é q o BE e o PCP vêm esta doação de milhões a grandes capitalistas com o dinheiro de milhões de portugueses em que alguns deles mal têm para comer! Vergonha!
  • Vitor Guimaraes
    09 jan, 2017 Felgueiras 10:29
    Este governo está a comprar o silêncio destes investidores milionarios, agora que vêm ai as eleições, com o dinheiro de todos os Portugueses. Se realmente o PR fosse o que dizem, que eu acho que não é, não deixava o governo esbanjar outra vez o dinheiro dos portugueses com investidores de milhões e em que não está provado que não sabiam o que faziam (até pelo contrário). Admito até que meia dúzia deles não soubessem mais isto é um caso de polícia e não um caso em que o governo resolve doar o dinheiro dos portugueses a mais dúzia de investidores, a maioria deles cheios de dinheiro. E já me esquecia, para colocar o ordenado mínimo em 600€ é que o Costa diz q não há dinheiro (já para este esbanjamento injustificado é sempre a andar com o dinheiro dos tugas). Como é q o BE e o PCP vêm esta doação de milhões a grandes capitalistas com o dinheiro de milhões de portugueses em que alguns deles mal têm para comer! Vergonha!
  • Jose santos
    09 jan, 2017 Porto 09:29
    Como pode Alvaro Almeida tecer um comentário como este em relação aos Lesados? Pessoas que tinham quinhentos mil euros investidos???!!. Primeiro informe-se e depois comente ! Para alguém que se quer candidatar à câmara do Porto começa muito, muito mal.
  • JP
    09 jan, 2017 Cegões 06:40
    O sr Bessa se não põe o seu nos bancos portugueses põe aonde? Numa offshore?. Estes srs julgam que são donos disto tudo e o que dizem é sagrado. A frase pérola é dizer que estavam todos de acordo naquela conversa em família. Pudera são todos da mesma cor. A coisa é mais democrática quando há contraditório.
  • Rato Mickey
    09 jan, 2017 Newark 02:55
    Esta é para quem tem muita "peninha" de "pequenos investidores" que investiram mais de 500 mil euros e foram atrás de taxas de juros de 4 e 6%, então que paguem eles e os seus camaradas lá do Largo da Rataria. Deviam publicar a lista dos "lesados", se calhar estão lá alguns bons amigalhaços da Rataria Rosa

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