27 out, 2016 - 12:06 • Olímpia Mairos
Isabel Jorge tem um hectare de pinheiro bravo em Telões, no concelho de Vila Pouca de Aguiar. Com os pinheiros misturam-se silvas, mimosas, fetos e outro tipo de vegetação. O terreno dá ares de abandono.
“Está um bocadinho suja, principalmente com mato, assim um bocado abandonada, porque não há dinheiro para pagar e não há meios”, conta à Renascença.
A consciência de que o seu hectare de floresta em Telões pode servir de rastilho para o fogo existe, mas esta proprietária lança a interrogação: “Se os outros não limpam, porque vou eu limpar?”.
“É claro que, se o fogo vier, leva tudo. Mas vamos estar a limpar para quê, se o do vizinho não está limpo, nem os baldios, nem os terrenos do Estado?", prossegue, para rematar: "Todos deviam ser obrigados a limpar”.
Andamos mais uns quilómetros e chegamos a Monteiros, também no concelho de Vila Pouca de Aguiar. Encontramos João Dias, proprietário de cerca de seis hectares de pinheiro bravo.
“Tenho a preocupação de lhe dar manutenção ao longo do ano, para precaver o risco evidente de incêndios durante o ano”, diz à Renascença.
Para este proprietário, o investimento que é feito na preservação e manutenção da floresta é sempre compensado, porque “vai ter regeneração que, no futuro, vai compensar largamente o investimento que se faz com a manutenção”.
Ainda assim, sublinha que “na região, há muita floresta por limpar e ao abandono”.
“Uma grande maioria dos proprietários não limpa, até porque muita gente, nas nossas aldeias, está emigrada e até há dificuldade em perceber quem são os proprietários. A desertificação é uma realidade e não há dinâmica. Fica tudo ao abandono, como se pode constatar”, enfatiza.
“Existem dezenas de candidaturas para intervenções, mas está tudo congelado”
Manuel Machado, da AguiarFloresta, Associação Florestal e Ambiental de Vila Pouca de Aguiar, que congrega 940 produtores, fala de uma floresta desorganizada e da falta de apoio para a limpeza dos terrenos.
“Esta é uma zona florestal, mas, actualmente, está um bocado desorganizada, abandonada”, afirma, justificando com “a falta de financiamento para os grandes proprietários, baldios e juntas de freguesia”.
“O programa europeu, o PDR 2020 está fechado. Existem dezenas de candidaturas para intervenções, mas está tudo congelado”, sublinha.
A AguiarFloresta tem equipas de sapadores florestais para intervir na floresta. Apesar de praticar preços acessíveis, Manuel reconhece que não estão ao alcance de todos.
“Uma jorna, para os nossos associados, custa 43 euros. Basicamente é para pagar o dia do homem e o combustível. Mas, mesmo assim, para a grande maioria das pessoas, que são idosas e que vivem de pensões, é difícil de suportar”.
Aldeias sem gente e a falta de apoios à limpeza e manutenção estão na base de uma floresta desorganizada onde abunda o mato, verdadeiro combustível à propagação de incêndios.
Quem limpa os terrenos e faz a manutenção da floresta sente que está a fazer o seu “dever”, mas lamenta que “outros não façam o mesmo” e coloquem em causa o bem de todos.
João Silva, proprietário florestal de Monteiros, defende uma floresta limpa e entende que o Estado deveria “patrocinar centros de recolha de biomassa, porque “os proprietários que limpam os terrenos não têm onde colocar os resíduos, a conhecida biomassa”. No seu caso, quando limpa a floresta tenta “triturar a biomassa no local e acaba por funcionar como fertilizante para as espécies existentes no terreno”.