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Chumbar na escola faz bem? Especialista diz que nem por isso…

26 out, 2016 - 13:19 • Sérgio Costa

Ana Balcão Reis, docente da Nova School of Business and Economics, respondeu às perguntas dos ouvintes da Renascença sobre a retenção de alunos nas escolas portuguesas.

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“Será a repetição de ano benéfica para os alunos?”. É o título de um estudo apoiado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, que será apresentado esta quarta-feira, em Lisboa, e que procura encontrar respostas para algumas questões recorrentes de pais, professores e alunos.

Que função desempenha a retenção? Pode ou não contribuir para a melhoria de resultados escolares? Que estratégias alternativas existem? Ana Balcão Reis, docente da Nova School of Business and Economics e uma das autoras do estudo, respondeu às perguntas da Renascença e também dos nossos ouvintes.

Este estudo comparou alunos do 4.º ano de escolaridade com aproveitamento semelhante; no caso, mau desempenho. Uns transitaram e outros ficaram retidos. Que diferença há entre uns e outros quanto ao aproveitamento nos anos seguintes? É substancial?

Não é fácil dar uma resposta porque é preciso comparar o que é comparável. Estes grupos têm características muito diferentes.

Comparando alunos parecidos, ou seja, com baixo desempenho na prova de aferição do 4.º ano, vimos que uns passaram, outros ficaram retidos. Em média, passado dois ou três anos, os alunos retidos têm resultados ligeiramente melhores no exame do 6.º ano. Concluímos é que provavelmente há outras formas mais efectivas de beneficiar estes alunos.

Ou seja, os efeitos positivos são muito diminutos e não vale a pena reter o aluno?

Exactamente. Em três ou quatro anos, até onde chegaram? Apesar de os alunos retidos andarem mais depressa depois da reprovação, não andam o suficiente para compensar a perda de ano inicial. Não conseguem compensar e andam atrás dos outros alunos.

Há alguma característica comum entre os alunos que mostram maus desempenho?

O que verificamos. quando comparamos os alunos que passaram com os que ficaram retidos, vemos que há mais repetições entre os rapazes e em famílias com menores rendimentos. Há características comuns e isso é um resultado em todos os estudos de economia da educação. Todos conhecemos excepções, mas, em média, crianças que vem de famílias com baixo nível socioeconómico tendem a ter piores resultados na escola.

Mas há uma diferença entre rapazes e raparigas? Alguma razão especial que tenham encontrado para esta diferença?

Não estudámos as razões, mas há vários estudos que mostram que as raparigas tendem a ter melhores resultados. Isso vai se verificando cada vez mais ao longo da progressão do ensino básico. Este resultado não é uma especificidade portuguesa, o benefício das raparigas. Não é só em Portugal que isto acontece.

Também há zonas do país que são mais favoráveis às retenções à reprovação?

Não era uma coisa que tínhamos previsto inicialmente, mas fomos olhar para estes alunos com mau desempenho nos vários municípios do país e encontramos muita variabilidade. Pode ser sinal de uma cultura diferente face à retenção. Estamos a estudar mais. [Não é possível dizer se ocorre mais no Norte ou no Sul, aqui ou ali], está muito espalhado, é muito variável.

Neste estudo concluem que que será mais vantajoso aplicar recurso financeiros em políticas educativas de apoio aos alunos em vez de reter os alunos.

Não vamos de repente acabar com a retenção, não é isso. Os nossos resultados parecem indicar parece que os alunos que ficaram retidos não ganharam muito com isso. E isso tem um custo, porque ficam mais um ano na escola. É preciso apoiá-los antes disso.

É possível determinar quanto custa ao estado uma reprovação?

Existe um estudo preliminar do Tribunal de Contas que diz quanto custa um aluno na escola (em média, 4.415 euros anuais ao Estado). E um aluno retido é mais um ano na escola, mais um ano de custos.

Portugal, a par de Espanha e Bélgica é um dos países onde entre 2003 e 2012 o número de retenções aumentou ao contrário de muitos outros estados. Existe alguma explicação?

Não temos uma explicação e tendo em conta que a cultura de retenção é tão diferente ao longo do país, o mesmo pode acontecer entre vários estados.

Os ouvintes também enviaram questões sobre esta questão. Pedro Santos, do Porto, pergunta se há alguma causa comum para as retenções e quais as soluções.

A causa comum é o baixo aproveitamento, teríamos que olhar para as causas, que não é o facto de a mãe ser de baixo nível socioeconómico, mas que é uma característica que não ajuda. Algumas experiências que estão a ser feitas, políticas de escola como a “Turma Mais”; ter um professor que de apoio a alunos para trabalhar uma matéria específica. Combater a situação quando os alunos não estão a acompanhar a matéria.

Luísa Azevedo questiona de que forma um aluno com más notas durante um ano, que transita, terá capacidade de garantir aproveitamento no ano seguinte?

Quando um professor decide reter um aluno é porque acha que isso vai ajudar o aluno, ou então deixa passar. Percebo que essa é a dúvida de qualquer professor. Em média, um aluno que ficou retido não beneficiou o suficiente com isso. Não quer dizer que o aluno que passou conseguiu acompanhar os alunos, mas que aquele que ficou retido não beneficiou.

Há um estigma com os alunos retidos?

Não olhámos directamente para isso. Sabemos que há efeitos positivos na retenção do aluno, por poder repetir o que aprendeu e estar com alunos ao seu nível, mas também há prejuízos como a estigmatização. Não vimos que o efeito negativo seja mais forte que o positivo. Eles equilibram-se um ao outro. Não obtemos no estudo que os alunos retidos tenham prejuízo nos anos seguintes face aos que passaram, mas sim que não tiveram benefício.

Susana Pinto refere ter uma minha filha que frequenta o 8.º ano sem nunca ter tido uma negativa. Sublinha no entanto que há um quadro de desmotivação e que se não fosse o esforço dela própria, a filha certamente reprovaria. Questiona se deve continuar a ter este esforço de acompanhamento ou se deve desistir?

Com base no estudo é difícil, mas o que posso dizer é que há vários estudos que mostram que a motivação que os pais transmitem aos filhos, a valorização que os pais fazem da escola e dos resultados contribuem para os resultados positivos dos alunos.

Anabela Cardoso, de Aveiro, pergunta se o facto de, à partida, se saber que ninguém reprova, não poder ser um incentivo ao desleixo nos estudos?

Claro que sim. Mas a retenção por si não está a recuperar os alunos. Como sistema, provavelmente estamos a reprovar demais.

Rute Almeida questiona se é possível fazer comparação com o que é praticado no exterior, se há países onde por norma os alunos não sejam retidos e quais os resultados?

Nos países onde há taxas muito menores que as nossas não há um resultado claro que diga que os países que não retêm têm melhores resultados. Podemos olhar para outros países e ver políticas específicas de apoio. Ver que tipo de apoios, que boas práticas podemos ir buscar a outros países.

Comentários
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  • FR
    26 out, 2016 Portugal 18:56
    As crianças com futuro pouco brilhante, têm quase sempre uma mãe burra e um pai burro, e pobres.
  • Zéquinha
    26 out, 2016 Condeixa 18:09
    Claro que faz bem reprovar e reprovar o mais possível de anos , até chegarem à idade da reforma e depois passarem a receber o Rendimento Mínimo, ir viver para debaixo de uma ponte, e comerem umas azeitonas com o naco de broa com bolor. Nada mais é preciso, para alem de não fazer casta, porque porcaria anda cá muita.
  • Adélia
    26 out, 2016 Aveiro 16:41
    Bem se não há retenções há que aproveitar a vida! Perder tempo a "marrar"que injustiça. Isso (estudar aplicar se na sua profissão de estudantes) que o faça a Escola e os desgraçados dos professores... Mas então que raio deHOMENS queremos nós??? Sem responsabilidades? É isso? Atinge as competências do seu ano de escolaridade: Transita. Não atingiu: Retem( ponto final). Apoios,claro que sim( ensinar a pescar), a pesca tem de ser do próprio (tenham. Paciência ). Tanta psicologia que até deprime! Sendo em exagero e acreditem que sei do que estou a falar. Mãe e mestre em psicologia da Educação.
  • CAMINHANTE
    26 out, 2016 LISBOA 15:44
    As novas "pedagogias" e as novas abordagens socio-psicológicas... uma coisa seria pensar alternativas para os que não se mostram aptos em conhecimentos, outra pretender que não se deve "reter" ( reprovar) ninguém . Por esta forma pseudo inovadora de encarar o problema, um aluno pode chegar ao 12º ano, mesmo que não saiba o exigível para tal e quiçá ingressar numa Faculdade... por excesso, mas uma possibilidade. Com esta forma de pensar andaram por aí a distribuir certificados pelas "novas oportunidades" , que em 6 meses faziam o que outros só obtinham com 3 anos ou mais de frequência do ensino. Maravilha... e ai de quem os contradiga... ditadura da decadência em nome de padrões normativos obrigatórios.
  • José Coives
    26 out, 2016 Lisondres 15:22
    LOL
  • António Costa
    26 out, 2016 Cacém 14:54
    O problema é que os alunos normalmente, só reprovam numa situação de caos total, só quando tudo já esta perdido. E aí o aluno que devia ter reprovado à 3 anos atrás foi passando sucessivamente. ( Reprovar um aluno dá bastante trabalho e normalmente as notas são "votadas" e o aluno transita ).

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