26 out, 2016 - 00:31 • José Pedro Frazão
O Ministério das Finanças está errado na posição que toma sobre a necessidade dos administradores da Caixa Geral de Depósitos (CGD) entregarem a declaração de rendimentos no Tribunal Constitucional, afirma o socialista Vera Jardim no programa “Falar Claro” da Renascença.
O Ministério das Finanças disse esta terça-feira que "não foi lapso" a decisão de os administradores do banco público deixarem de estar sujeitos ao Estatuto do Gestor Público e não terem de apresentar a declaração de rendimentos.
"Para mim, houve um lapso, efectivamente. O Ministério das Finanças vem dizer que por serem administradores bancários têm uma série de obrigações junto do Banco de Portugal. Pois têm, mas não são estas, porque o Banco de Portugal não vai conhecer os rendimentos e as propriedades dos gestores bancários. Vai reconhecer a idoneidade", afirma Vera Jardim em reacção ao comunicado assinado pelo gabinete de Mário Centeno.
O antigo ministro da Justiça considera que o Governo devia ter optado por outra posição. "Bastava acrescentar uma coisa: se queriam excepcionar do regime das empresas públicas dizia-se, 'salvo no que diz respeito às obrigações tais, tais e tais'. Faltou esta frase, pura e simplesmente", assinala o histórico socialista no programa "Falar Claro" que a partir desta semana passa a ser emitido em directo nos finais de tarde das terças-feiras da Renascença.
Para Nuno Morais Sarmento, outro comentador residente do programa, a responsabilidade de condução deste processo é apenas do Governo e, em particular, do Ministério das Finanças.
O social-democrata considera que o processo "está torto desde o início porque a posição do Ministério das Finanças deveria ter sido - para defesa desta administração - a inversa da que foi. O Governo devia ter chamado a si aquela que é a sua responsabilidade. Se foi o Governo que decidiu isentar esta administração de algumas responsabilidades, devia tê-lo dito de forma clara".
O antigo ministro do PSD classifica a intervenção do Governo como "atabalhoada e com a má consciência suficiente para ter procurado até ao limite não ter a iniciativa de nos informar completamente das condições".
Sarmento defende que os gestores da CGD devem ser tão escrutinados como outro qualquer administrador de uma empresa pública.
"Não passa pela cabeça de nenhum de nós que [em face da] responsabilidade de alguém que assume a presidência do banco público, possamos em relação a essa pessoa sermos menos exigentes em relação a outros a quem confiamos menos do nosso colectivo, como seja o da CP ou de qualquer outra empresa [pública]", afirma o social-democrata na Renascença.
Salários elevados para gestores competentes
Os altos salários dos administradores da Caixa Geral de Depósitos não são problemáticos para Vera Jardim e Nuno Morais Sarmento.
"[Estes nomes] não nos dão garantias de que a Caixa Geral de Depósitos será bem gerida. Mas, à partida, dão-nos garantias de que sabem do negócio bancário, porque nem toda a gente sabe gerir um banco", assinala Vera Jardim.
Já Nuno Morais Sarmento não sente incómodo com os ordenados elevados no topo do banco público. "Deve ser um valor compatível com aquele que é praticado no sector, sob pena de não irmos buscar bons profissionais".
Questionado sobre se a disparidade salarial não deveria começar por ser combatida no seio da empresa pública, Morais Sarmento responde que só Catarina Martins concordaria com tal posição, "ainda que isso nos custasse a todos a gestão da Caixa Geral de Depósitos. Ficava muito contente com a socialização pela miséria, ainda que isso destruísse a Caixa".
O antigo ministro do PSD alinha ainda com as críticas do líder do seu partido a alegadas informações privilegiadas do novo homem-forte da CGD de forma a apresentar um plano de recapitalização do banco que agrade a Bruxelas.
"Ou António Domingues é irresponsável e fez uma estratégia a médio-longo prazo com base na informação pública ou António Domingues não nos está a dizer tudo e teve, como é bom que tenha tido, acesso à informação que lhe permite apresentar uma proposta [de recapitalização da Caixa]", denuncia Morais Sarmento.
Em resposta, Vera Jardim assinala que a informação pública sobre a Caixa "é enorme". O antigo ministro socialista considera que, por exemplo, a lista das 20 maiores empresas devedoras à Caixa Geral de Depósitos é já conhecida, sustentando que os elementos do conhecimento público são suficientes para fazer um plano estratégico.